ASSINE
search button

Delcídio: "Pano de fundo do impeachment é Lava Jato. Temer deve ter cuidado para que não se repita"

Senador cassado afirmou que Lula e Dilma sabiam de tudo, e chamou Renan de "cangaceiro"

Compartilhar

O ex-senador Delcídio do Amaral (sem partido), em entrevista ao programa Roda Vida, da TV Cultura, nesta segunda-feira (16), fez afirmações contundentes a respeito do ex-presidente Lula e da presidente afastada Dilma Rousseff, atacou o senador Renan Calheiros - chamando-o de "cangaceiro" -, e afirmou que muitas provas ainda estão por vir, inclusive por parte dele mesmo. "Tenho tudo muito bem documentado."

Delcídio garantiu que Dilma e Lula sabiam de todo o esquema de corrupção da Petrobras, que alertou várias vezes à Dilma que as investigações chegariam no Executivo, mas que ela ignorou. "Vai aparecer muita coisa ainda. E o PMDB tem uma posição proeminente na Lava Jato. Vão aparecer coisas com relação a Renan (Calheiros), Romero (Jucá), (Edison) Lobão e outros mais."

Mesmo se esquivando de várias perguntas e sem ir direto a algumas questões, Delcídio deixou claro que ainda sabe de muita coisa, e que "na hora certa" tudo virá à tona.

O senador cassado começou a entrevista fazendo questão de dizer que é ficha limpa, que não roubou e nem tem conta no exterior. "Cometi deslizes num momento que não avaliei bem. Fui denunciado por obstrução de Justiça, uma falha grave, e me desculpei. Mas não fui denunciado por roubo, por conta no exterior."

Sobre indicações do presidente interino, Michel Temer, na Petrobras, Delcídio afirmou que ele indicou o ex-diretor Jorge Zelada, envolvido em esquema de corrupção na estatal, e falou sobre denúncias de que Temer teria recebido 5 milhões de dólares fruto do propinoduto. Delcídio destacou que acredita que Temer tenha endossado Zelada em nome da bancada. "Agora a Lava Jato vai prosseguir. Vejo com muitas preocupações o que vem por aí. Não posso botar a mão no fogo até porque não conheço bem as relações de Temer. Minha preocupação não é só com relação ao Zelada, mas com relação ao (lobista) João Augusto Henriques e com relação ao (operador preso em Lisboa) Raul Schmidt."

Delcídio frisou que conhece profundamente a Petrobras.  Ele negou que tenha se beneficiado financeiramente no esquema de corrupção. "Denuncias que vieram contra mim caíram  por terra porque em outras delações, elas não fechavam. Não fui eu que fiz operações em contas na Suíça. Não fiz acordo com procuradores suíços por causa da questão das turbinas. Não tinha nada a ver com isso. O fato de ser citado na Lava Jato não quer dizer nada. Paulo Roberto Costa disse que supostamente eu teria levado vantagem, mas não lembrava de quem e nem tinha provas." 

Corrupção na Petrobras

O senador cassado afirmou ainda que a corrupção na Petrobras não começou com o PT. "Na época do Itamar (Franco) e de outros presidentes, havia claramente casos de corrupção na Petrobras e em outras companhia. Em Furnas foi acachapante. Mas com o governo atual começou a haver atuação sistêmica e partidária, uma operação mais ampla com lideranças partidárias da base do governo de Lula e Dilma. Isso é inegável. Eu conhecia como funcionava a Petrobras e conheço todos os empresários. Não só Petrobras. Fui da Eletrobras e da Vale. A virada aconteceu quando começou governo Lula, Silvio Pereira..."

Questionado por que não revelou antes os casos de corrupção, já que tinha conhecimento, Delcídio desconversou, e afirmou que no mensalão a crise política era intensa, mas o país não estava "contaminado". "O país continuou a andar. Mas hoje a população vê que a Lava Jato está passando a limpo o Brasil, mas está faltando o núcleo político. É isso que a opinião pública está reclamando." Ele prosseguiu: "Para fechar o relatório da CPI dos Correios (que originou o mensalão), tivemos que fazer uma composição com partidos do governo e de oposição."

Delcídio afirmou ainda que Lula e Dilma sabiam de tudo o que acontecia na Petrobras. "Todo mundo sabe: da Petrobras, quem cuida é o presidente da República. O presidente da Petrobras é tão forte que tem relação direta com o presidente da República. Dizer que eles não sabiam de nada... Tenha paciência!".

Confrontado com denúncias contra o presidente interino Michel Temer, como o pagamento de R$ 1 milhão em propina, Delcídio preferiu não fazer afirmações. "Não sou juiz. Mas sei que a tendência agora é a investigação ir para o campo político. Tem alguns ministros que vão descer para Curitiba. Tomei conhecimento desse trecho de delação, mas não conheço fatos. Mas sei de fatos investigados em Curitiba que são fundamentais até para o atual governo. Já vi essa história, Eu avisava sistematicamente à presidente Dilma sobre a Lava Jato, mas achavam que iam pegar apenas congressistas. Você acha que o impeachment é pedalada? Esse é um dos motivos. O pano de fundo é a Lava Jato, junto com uma dificuldade de gestão incrível, uma falta de coordenação política e com uma economia que vai bater em três anos menos 8% do PIB. Então é um somatório. Pedalada é uma das questões. É um processo muito mais amplo.  Por isso, o presidente Michel Temer tem que acompanhar muito de perto isso para que não se repita. Só falta a gente tropeçar mais uma vez na mesma pedra." Delcídio reforçou que Dilma foi mal assessorada, que usou uma estratégia equivocada e que achava que ia sair de tudo mais forte.

Sobre o caso Pasadena, o senador cassado reforçou que, na Petrobras, não há como se levar um processo incompleto para o conselho de administração. "Dilma não assumiu uma responsabilidade que era dela. E não adianta dizer que a responsabilidade era da diretoria. A SEC (Securities and Exchange Commission - correspondente à Comissão de Valores Mobiliários nos EUA) está investigando. Alguém vai dizer que o conselho da Petrobras não tinha responsabilidade nenhuma? Para o mundo que eu quero descer."

Delação e provas

"Minha colaboração amarrou as pontas e se complementa com outras. Tá a Andrade Gutierrez aí. Daqui a pouco virão outras. Eu tenho uma estrutura muito organizada. Todos os meu passos eu sei, está tudo escrito." 

Ele acrescentou. "Gravei a CPI dos Correios inteira. Se a documentação está enterrada na minha fazenda ou não eu não posso falar, mas  que vou trazer a público tudo o que aconteceu naquele período, sem dúvida vou trazer, com detalhes extremamente relevantes." Delcídio afirmou que grava todas as suas conversas, inclusive as que teve com o ministro Marcio Thomaz Bastos. "Estou guardando tudo para depois. Não vai demorar. Tenho muitos documentos."

Bumlai e Lula

"José Carlos Bumlai era uma pessoa arrumada na vida, de carreira bela. Mas ele se encantou pela serpente, pela jararaca. Ficou empolgado com o poder. Eu mesmo caí nessa esparrela. Agora estamos vendo as investigações. Havia uma interação muito forte. Não adianta negar." Delcídio confirmou que seu suplente, professor Pedro Chaves, era contraparente de Bumlai

Furnas e Aécio

Questionado, Delcídio não deixou clara a relação do senador tucano Aécio Neves com suposto esquema de corrupção em Furnas. "Furnas é a joia da coroa, está com o file mignon, cuida do Sudeste. Lula ficou assutado com a influência que Dimas (Toledo) tinha em Furnas. Ele disse: 'Esse cara deve estar roubando muito.'  Furnas vem arrastando a barriga desde a CPI dos Correios.  Esse tema já faz parte de outras colaborações, inclusive envolvendo empresas que o Dimas comanda."

Delcídio acrescentou: "A gênese do mensalão surgiu em Minas Gerais.  Ao longo da CPI dos Correios nós fizemos várias quebra de sigilos. E houve um pedido de que era preciso mais tempo porque havia uma imensidão de informações. Tive várias conversas com Marcos Valério e ele me dizia tudo o que aconteceu no governo federal e nos governos estaduais. Não era só Aécio, era Eduardo Azeredo... Hoje vemos gente dizendo: 'Não tenho nada com isso.' É tranquilo: vamos ver o Banco Central, que tem acesso a essas informações. Estão buscando as informações da CPI dos Correios. Estou recuperando tudo isso.", disse.

Cassação

Sobre a atuação do senador Aloysio Nunes (PSDB), que tentou adiar a votação de sua cassação no Senado, Delcídio afirmou: "Ele tem muita racionalidade. Ele viu como meu processo de cassação foi feito. Não houve nenhuma negociação. O presidente do Senado (Renan Calheiros) ainda teve a cara de pau de dizer que ou eu era cassado ou não faziam o afastamento da Dilma. É surreal." 

Com relação a Renan, o senador cassado também falou. "Meu assessor de comunicação foi demitido por ele, aquele cangaceiro do Renan Calheiros, que comanda o Senado. Isso é temor, é medo, numa Casa em que pelos menos 20 senadores estão na Lava Jato, e mais de 50 têm processo na Justiça. Eu entrei nisso agora, em função de uma tropeçada que eu dei."

Ele completou: "Minha cassação, do ponto de vista pessoal, familiar, foi um estrago. Sei que sou culpado disso. Vou responder na Justiça por isso, mas não sou igual a muitos que estão lá. Tem senador que foi condenado e não saiu do Senado ainda. Me explica isso? E essa figura ilustre que preside o Senado com 12 processos nas costas, e com relações absolutamente condenáveis do ponto de vista político e pessoal?"

Delcídio comentou o texto que sua filha, Maria Eduarda, publicou nas redes sociais sobre os efeitos da sua prisão para a família. Emocionado e com a voz embargada, ele disse que se sente responsável por tudo. "Essa carta é o retrato do que nós vivemos. Não abdico, a responsabilidade é minha."

Obstrução

Delcídio confirmou a atuação de Dilma na tentativa de obstrução na Justiça atuando com o ministro Marcelo Navarro, hoje do Superior Tribunal de Justiça (STJ). "Como o tempo é o juiz das coisas. Marcelo Odebrecht agora, nos depoimentos em Curitiba, confirmou essa história toda."

Futuro

"Lula sai muito desgastado de tudo isso. Acho difícil uma candidatura competitiva, apesar de sempre dizerem que ele é o principal candidato. Não é mais, até porque ocorrerão outros desdobramentos com relação a Lula, fruto das investigações. O cerco se fechou. A situação dele é crítica."

"Dilma não volta mais. Não há mais condições, até políticas, de governar o Brasil. Ela vai para a aposentadoria."

"O PT é um partido forte, orgânico, mas perdeu muito do seu brilho. Precisa fazer uma revisão de seus conceitos Outros partidos de esquerda no mundo passaram por esta revisão.  Tem que mudar a direção. Rui Falcão, presidente do PT, é bizarro. Não tem dimensão para comandar um partido como o PT. Acredito que as pessoas mais lúcidas vão prevalecer e o PT vai fazer uma nova lição."

"O presidente Temer tem um grande desafio pela frente. A vinda do (Henrique) Meirelles é relevante. Acho o (José) Serra também uma escolha importante. Mas acho um ministério com politica demais, e alguns ministérios são fraquinhos, como por exemplo o Ministério de Minas e Energia, que é muito importante. Temos que torcer para que o governo de Temer dê certo, mas os primeiros passos preocupam muito. Temer não tem base nenhuma social. Não é fácil comandar um país complexo como o Brasil desta forma. Ele vai ter que ter muita coragem para tomar medidas duríssimas. Vai ter que ter autoridade e segurar o rojão."

PMDB e Lava Jato

"O PMDB tem posição proeminente na Lava Jato. E agora com a colaboração da Andrade Gutierrez isso vai ficar nítido. Não adianta falar que desconhece fatos  e que as doações foram todas legais. Estou falando de Renan (Calheiros), Romero (Jucá), (Edison) Lobão, e outros que vão aparecer."