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“NYT”: Caso Eike Batista vai testar o criticado sistema judiciário brasileiro

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O jornal americano The New York Times publicou nesta segunda-feira (17/11) uma matéria sobre o julgamento de Eike Batista, marcado para a terça, dia 18. O artigo de Dan Horch lembra a trajetória do empresário e fala sobre as particularidades da justiça brasileira. "Quando se trata de informações privilegiadas nos Estados Unidos, autoridades do governo construíram carreiras através de processos bem sucedidos. Fundos de retorno absoluto (as chamadas “hedge funds”) foram fechados, e reguladores ludibriaram até empregados mais abaixo na hierarquia que vendiam dicas confidenciais. Mas no Brasil, jamais alguém foi preso por causa de informações privilegiadas.

O artigo prossegue: "Porém, na terça-feira, Eike Batista, que um dia foi um dos homens mais ricos e famosos do Brasil, tem hora marcada para se defender no tribunal contra acusações de uso de informações privilegiadas e manipulação no mercado financeiro.

Muitos brasileiros vão seguir o caso de perto, não só para saber qual será o destino de Eike, mas também para  ver se o sistema justiça consegue se livrar de sua fama marcada pelos infindáveis atrasos e por sua leniência em relação aos que são acusados de crime do colarinho branco.

Promotores acusam Eike de vender ações da OGX, sua empresa petrolífera, depois de ter conhecimento prévio  sobre a falta de viabilidade econômica de alguns campos de petróleo importantes.

No esforço para condená-lo, os promotores também podem estar se esforçando para restabelecer a confiança nas instituições do país. A economia se encontra estagnada, a inflação está alta, e a seguidas investigações  da corrupção na gigante do petróleo Petrobras estão  chegando a instâncias mais elevadas do governo e grandes empresas.

A ira contra o sistema judicial está espalhada, com protestos nas ruas de todo o país no ano passado citando a “impunidade” dos ricos e poderosos".

O caso de Eike pode ser um teste decisivo de quão rígidos os tribunais podem ser. A acusação alega que os atos de Eike causaram prejuízos de 1,5 bilhões reais (cerca de US$ 580 milhões) em prejuízos, que ele teria que reembolsar.Por anos, Eike Batista foi o símbolo do poder da crescente economia brasileira. Ele fundou e colocou seis empresas na Bolsa de São Paulo, e durante um tempo foi o homem mais rico do país, com uma fortuna de cerca de US$ 30 bilhões.

Investidores institucionais, incluindo as gigantes dos fundos de investimento Pimco e BlackRock, investiram em suas empresas. Os governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a atual presidente Dilma Rousseff também deram apoio às companhias de Eike com cerca de 6 bilhões de reais (US$2.3 bilhões) em empréstimos subsidiados do banco estatal, o BNDES.

Os atuais problemas de Eike na justiça começaram em outubro de 2012, quando ele prometeu injetar um bilhão de dólares na empresa de petróleo que ele fundou, a OGX, se fosse necessário para seu gerenciamento.

Sua promessa fez com que as ações da empresa subissem por alguns meses, mas no mês de maio seguinte, ele começou a vender milhões de ações.

Em julho a empresa reconheceu que os campos mais importantes de petróleo eram economicamente inviáveis. Em seguida, em setembro de 2013, logo depois de vender milhões de ações a mais, a direção pediu US$1 bilhão, mas Eike alegou que uma mudança no plano de negócios da empresa o dispensou de cumprir seu compromisso.

No mês seguinte, a OGX deu um calote de US$ 5,8 bilhões em dívidas e registrou o que se tornaria a maior falência da história da América Latina. Desde então a empresa se reorganizou, e é possível que os credores afinal   recebam de volta uma parte do dinheiro que perderam, mas os acionistas sumiram.

O principal advogado de Eike, Sérgio Bermudes, não respondeu a emails e telefonemas pedindo algum comentário sobre o caso. Mas em documentos arquivados no tribunal, a defesa alegou que Eike não tinha informações privilegiadas sobre a inviabilidade dos campos de petróleo, e que vendeu apenas as únicas ações que podia vender legalmente, já que haviam sido comprometidas como efeito colateral de um empréstimo que foi feito.

Seus advogados também afirmam que ele manteve mais de 50% das ações da empresa até o final e perdeu mais do que qualquer um com a falência da empresa.

No meio da turbulência, Eike transferiu residências de milhões de dólares no Rio de Janeiro e em balneários vizinhos a sua esposa e seus filhos no que ele disse ser apenas um planejamento de espólio.

Se for condenado, Eike Batista poderá  pegar 13 anos de cadeia. Mas o histórico de julgamentos no país faz com que esse desfecho seja improvável.

“No Brasil, você pode pagar por bons advogados, você recorrer eternamente, frequentemente em tecnicalidades que só servem para adiar decisões,” disse Claudio Weber Abramo, diretor-executivo da Transparência Brasil, um grupo anti-corrupção.

O grupo de defesa de Eike Batista, que se reuniu na quinta-feira, apresentou um recurso alegando que a corte federal do Rio de Janeiro não deveria ter jurisdição e pedindo para que a audiência seja adiada. Um tribunal de segunda instância ainda não respondeu, logo, o julgamento de Eike Batista ainda está marcado para começar na terça-feira.

Mesmo depois que um tribunal emite um julgamento, a lei brasileira suspende a sentença enquanto está sendo apelada, e muitos casos podem ser levados à  Suprema Corte, com seus longos atrasos. Como resultado, até mesmo defensores que são condenados podem muitas vezes evitar de cumprir suas penas até que o estatuto de limitações os liberem do  julgamento.

Mas o caso de Eike Batista vem num ambiente mais adverso. O envolvimento de várias procuradorias, assim como grupos de advocacia representando credores e pequenos investidores, são novidades na investigação de crimes financeiros no Brasil.

Mesmo ser Eike for condenado, o caso pode não indicar uma mudança mais ampla no sistema judiciário.

“Se não fosse uma pessoa com a exposição que Eike  Batista tem na mídia, é possível que não teria existido uma ação penal, apenas uma ação civil,” disse Gilberto Braga, um professor de finanças na Ibmec-Rio. “Em crimes de colarinho branco,” ele acrescenta, “a pena de prisão é dificilmente mais do que poucos anos, e pode ser convertida em serviço comunitário.”, conclui o artigo do New York Times.