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STF aceita denúncia contra Eduardo Cunha (PMDB-RJ)

Deputado passa a réu por uso de documentos falsos

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O Supremo Tribunal Federal acolheu nesta quinta-feira, por 6 votos a 3, denúncia do procurador-geral da República contra o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), atual líder do seu partido na Câmara. Ele passa agora à condição de réu em ação penal, por uso de documentos falsos. O crime tipificado no artigo 304 do Código Penal pode ser punido com pena de reclusão de dois a seis anos, mais multa.

O relator do inquérito, ministro Gilmar Mendes, considerou que – para fins de recebimento de denúncia – a peça acusatória do MPF era “clara e bem delineada”, embora tenha sublinhado que só depois de concluída a ação penal é que se deve discutir a culpabilidade do réu. Mendes foi acompanhado pelos ministros Teori Zavascki, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Joaquim Barbosa. Os ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli entenderam que não havia elementos suficientes para transformar o parlamentar em réu.

A denúncia foi feita pelo chefe do Ministério Público com base em inquérito (Inq 2.984), aberto no foro privilegiado do STF em junho de 2010. Conforme a acusação, o parlamentar teria postulado a juntada de cópias de cinco documentos oficiais, quatro dos quais falsificados materialmente, no intuito de obter o arquivamento de processo de Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (Processo 106.777-0, de 2000).

O denunciado alegava, em sua defesa preliminar, não haver no inquérito em julgamento “qualquer indício” de sua participação na falsificação dos quatro documentos oficiais mencionados, e que a denúncia não descreve ou aponta qualquer indício de sua ciência sobre a falsidade dos documentos, nem “sua participação especial no suposto conluio”.

Veja íntegra da nota divulgada por Cunha:

"Embora respeitando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), venho a público, novamente, para esclarecer o que já foi fartamente veiculado pela imprensa: fui vítima do malfeito de um estelionatário já condenado, em função do meu testemunho de acusação. O condenado em questão, um ex-procurador do Ministério Público (MP-RJ), mencionado no inquérito, foi julgado e, graças ao meu testemunho à Justiça, condenado por ter falsificado vários documentos.

"Sugiro que, a partir de hoje, qualquer cidadão que se dirigir ao Ministério Público para requerer uma certidão, após recebê-la das mãos de uma autoridade do MP, dentro das instalações do próprio Ministério, faça, antes de usá-la, um exame de autenticidade para verificar se o documento é mesmo verdadeiro.

"O que se julgou nesta tarde de quinta, 21, no STF, por cinco votos pelo acolhimento da denúncia contra três pelo arquivamento da acusação, não configura em condenação. Muito pelo contrário. Não houve unanimidade, e o decano, o ministro Celso de Mello, não esteve presente. Votaram pelo arquivamento da denúncia os ministros Ricardo Lewandowski, Luiz Fux e José Antonio Dias Toffoli. Os três reconheceram, peremptoriamente, o auxilio que prestei à Justiça para que o estelionatário fosse devidamente condenado, apresentando provas contundentes para a conclusão das investigações e o veredicto da Justiça.

"Ademais, fui testemunha no processo disciplinar para que o MP demitisse o ex-procurador fraudador. Outros também receberam do estelionatário documentos sem saber que eram falsificações. Como poderia imaginar ser falso um documento oficial do MP fornecido por um procurador? Se não fosse o documento original por mim entregue ao MP e à Justiça, não se teria provado a sua falsificação.

"Como bem destacou a minha defesa diante dos ministros do STF, a acusação foi feita a partir de ações que transformaram alguém que, durante dois anos, foi tratado como testemunha de acusação, sem que houvesse inquérito ao STF e nenhuma prova nova, em denunciado.

"Confio na decisão final da Justiça, que concluirá pelo despropósito da acusação."

O caso

A denúncia remonta ao período em que Eduardo Cunha integrouo governo de Anthony Garotinho no Rio de Janeiro. Na época (1999-2000), ele presidiu a Companhia de Habitação do estado, e deixou o cargo depois de denúncias de irregularidades em licitações. Uma delas envolvia uma empresa representada por um ex-procurador do empresário Paulo César Farias (já falecido naquela epoca), que venceu concorrência para construir casas usando atestado falso de capital social.

Em 2002, o atual deputado federal obteve do procurador do Ministério Público Elio Fischberg cinco documentos que certificavam o arquivamento das investigações naquele órgão sobre a Cehab. Eram arquivamentos supostamente feitos por promotores e procuradores do MP sobre a companhia de habitação. Os papéis foram entregues ao deputado e ao seu advogado, Jaime Samuel Cukier. No entanto, os documentos foram forjados, conforme perícias feitas, em 2008, pelo Instituto de Criminalística Carlos Éboli, da Polícia do Rio de Janeiro.

Com os documentos fraudados em mãos, Cunha protocolou um pedido de manifestação no TCE em 24 de abril de 2002. O relator do caso no TCE era o conselheiro Jonas Lopes de Carvalho, chefe da Casa Civil do governo Garotinho e ex-colega de Cunha naquela administração. Ele votou pelo arquivamento do processo, ao contrário do que queriam os inspetores e os procuradores do TCE. Com base nesse voto, o plenário do TCE arquivou o processo. Cunha, entretanto, alega que foi vítima, e que recebeu os documentos do então 2º subprocurador-geral de Justiça do Rio, Elio Gitelman Fischberg. Em agosto do ano passado, o Tribunal de Justiça fluminense condenou Fischberg por falsificação. 

A sentença foi de pena de três anos, dez meses e 11 dias de prisão, em regime aberto, e perda da função pública. A pena, porém, foi substituída por outras duas, restritivas de direito: prestação de serviços à comunidade e pagamento de R$ 300 mil ao Instituto Nacional do Câncer (Inca). Assim como ressaltou o seu advogado, Alexandre de Moraes nesta quinta-feira, no plenário do STF, o deputado Eduardo Cunha se diz vítima no caso, até por que o procurador acusado de fraude foi condenado, enquanto que ele foi testemunha de acusação no processo contra Fischberg.