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Acusação aponta contradições e diz que só Mizael queria matar Mércia  

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Durante duas horas, o promotor Rodrigo Merli Antunes e o advogado Alexandre de Sá Domingues, responsáveis pela acusação, exploraram as supostas contradições nos depoimentos do policial militar reformado e advogado Mizael Bispo de Souza, 43 anos, e as provas técnicas do processo, para tentar comprovar que, apenas ele, tinha motivos para matar a advogada Mércia Nakashima, morta aos 28 anos em 23 de maio de 2010. Ex-namorado da vítima, Mizael é acusado de ter sido o autor do crime e é julgado desde a última segunda-feira no Fórum de Guarulhos (Grande São Paulo). Nesta quinta-feira, acusação e defesa terão até seis horas, ao todo, para apresentar suas teses aos sete jurados - cinco mulheres e dois homens -, que decidirão, ao final do julgamento, se o réu é culpado ou inocente.

"Nada foi levado da doutora Mércia, nenhum pedido de resgate foi feito, ela não sofreu violência sexual. A intenção do assassino era só matar. Quem teria interesse de eliminar a vida da Mércia Nakashima? Mércia nunca teve inimigos", disse o promotor Rodrigo Merli, que deu início ao debate entre as partes. "Estão querendo enganar todos nós. (...) O réu Mizael Bispo de Souza matou sim a Mércia Nakashima, porque sentia rejeitado e trocado! Se sentia o lixo dos lixos!", disse. 

O promotor usou cerca de 20 minutos para apontar "mentiras" - em suas palavras - e as contradições de Mizael, que sempre negou a acusação e, em interrogatório ontem, disse ter sido vítima da Polícia Civil, que o escolheu como "culpado" para se promover às suas custas.

"O mundo conspirou contra o senhor Mizael no dia 23 de maio! (...) A prostituta (que ele aponta como álibi) precisa existir, o rastreador do carro (que o coloca na cena do crime) precisava estar com problema, o Evandro (vigia apontado como cúmplice) mentiu. Tudo isso precisa acontecer pra ele ser inocente. Isso não existe. Não há nenhuma coincidência", afirmou o promotor, que na sequência passou a explorar as provas técnicas. 

O promotor usou os demais 40 minutos para explicar as provas que, segundo a acusação, incriminam Mizael: as ligações telefônicas captadas pelas antenas que o colocam na cena do crime e mostram que ele estava rondando a casa dos avós de Mércia no dia; o sapato do réu, que continua uma alga da represa de Nazaré Paulista, onde o corpo da vítima foi achado, além de marcas de sangue e vestígios de ossos; e o depoimento do vigilante Evandro Bezerra da Silva, acusado de ser cúmplice de Mizael, que disse à polícia que o buscou na represa na noite em que Mércia foi morta. 

"A defesa vai dizer que plantaram a alga no sapato. Ninguém plantou, desculpem o termo, porcaria nenhuma! Até porque que interesse ele teria em incriminar um inocente?", questionou o promotor. "O sapato do suspeito tem quatro elementos da cena do crime. (...) Não é coincidência", completou. 

Mizael sempre negou a acusação e permaneceu de cabeça baixa, com olhos fechados e mãos unidas próximas ao rosto durante quase toda a fala da acusação. Na plateia, os dois irmãos e o pai do réu acompanhavam, com expressão apreensiva, a fala do promotor. Já a família de Mércia - os pais e os dois irmãos - também estavam na plateia e, embora emocionados em vários momentos, permaneceram em silêncio. 

Motivo do crime

O assistente de acusação e advogado da família de Mércia, Alexandre de Sá Domingues, teve mais uma hora para explorar o motivo do crime: a mágoa que Mizael tinha devido ao término do namoro. O advogado leu em voz alta trechos de e-mails enviados pelo réu, em que ele demonstra decepção com o comportamento da ex-namorada, que não atendia suas ligações e não queria reatar o relacionamento. "Me dei conta que você não merece o meu amor", escreveu Mizael, conforme trecho de um e-mail enviado por ele em 17 de abril de 2010, lido em plenário.  

Mércia e Mizael namoraram por cerca de quatro anos e haviam terminado o relacionamento no segundo semestre de 2009 - embora ainda se encontrassem, ocasionalmente. Em um dos e-mails, Mizael lista 11 atitudes de Mércia que o teriam magoado, entre eles o término do namoro em ocasiões anteriores. 

Por fim, a acusação destacou o fato de ele ter uma "mente doentia" e distorcer a verdade. "Notem a mente doentia que ele tem. Ele distorce a verdade para tentar se encaixar na mente doentia que ele criou", afirmou Domingues. "Na cabeça dele, ele nunca vai admitir", completou. 

Nos minutos finais, a acusação mostrou fotos de Mércia e da família dela diante da tragédia, como "pano de fundo" para concluir sua tese: de que só Mizael tinha motivos para matá-la - e que todas as provas apontam para o réu. 

À tarde, a defesa terá duas horas para tentar provar a inocência de Mizael. Após a fase inicial de debates, defesa e acusação poderão ter direito a mais uma hora, cada, caso a Promotoria opte por usar o direito da réplica. Apenas após os debates é que os jurados decidirão o futuro de Mizael. Se condenado, ele pode pegar até 30 anos de prisão.  

O caso

A advogada Mércia Nakashima, 28 anos, desapareceu no dia 23 de maio de 2010, após deixar a casa dos avós em Guarulhos (Grande São Paulo), e foi encontrada morta no dia 11 de junho, em uma represa em Nazaré Paulista, no interior de São Paulo. A perícia apontou que ela levou um tiro no rosto, um tiro no braço esquerdo e outro na mão direita,  mas morreu por afogamento quando seu carro foi empurrado para a água.

O ex-namorado de Mércia, o policial militar reformado e advogado Mizael Bispo de Souza, 43 anos, foi apontado como principal suspeito pelo crime e denunciado por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emprego de meio cruel e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima. De acordo com a investigação, Mércia namorou durante cerca de quatro anos com Mizael, que não se conformava com o fim do relacionamento amoroso. A Promotoria também denunciou o vigia Evandro Bezerra Silva, que teria o ajudado a fugir do local, mas seu julgamento ocorrerá separadamente, em julho deste ano.

Preso em Sergipe dias depois da morte de Mércia, Evandro afirmou ter ajudado Mizael a fugir, mas alegou posteriormente que foi obrigado a confessar a participação no crime, sob tortura. Entretanto, rastreamento de chamadas telefônicas feito pela polícia com autorização da Justiça colocaram os dois na cena do crime, de acordo com as investigações. Outra prova que será usada pela promotoria é um laudo pericial de um sapato de Mizael, no qual foram encontrados vestígio de sangue, partículas ósseas, vestígios do projétil da arma de fogo e uma alga típica de áreas de represa.

Mizael teve sua prisão decretada pela Justiça em dezembro de 2010, mas se escondeu após considerar a prisão "arbitrária e injusta", ficando foragido por mais de um ano. Em fevereiro de 2012, porém, ele se entregou à Justiça de Guarulhos e, desde então, aguardava ao julgamento no Presídio Militar de Romão Gomes - enquanto o vigia permanece preso na Penitenciária de Tremembé. Mizael nega ter assassinado Mércia e disse, na ocasião, que a tratava como "uma rainha". Já o vigia afirmou, em depoimento, que não sabia das intenções do advogado e que apenas lhe deu uma carona. Se condenados, eles podem ficar presos por até 30 anos.