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Minha Casa Minha Vida: em AL, operários em condições análogas a escravos 

Construíam 75 casas do condomínio batizado com nome de Marisa Letícia Lula da Silva 

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Onze operários que estavam submetidos à condição análoga de trabalho escravo na construção de 75 casas do programa Minha Casa, Minha Vida, na cidade de Penedo (AL), foram libertados neste final de semana pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) de Arapiraca (AL) e pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Alagoas. As casas fazem parte de um condomínio batizado com o nome da ex-primeira dama do país: Marisa Letícia Lula da Silva.

Os operários, contratados pela Federação das Entidades Comunitárias e União de Lideranças do Brasil – FEULB, entidade presidida pelo advogado João Luiz Leite (OAB–SP nº 141403), trabalhavam desde agosto sem registro na carteira, Como são da cidade de Arapiraca, moravam nas próprias casas que ainda constroem, em condições degradantes de trabalho e moradia, o que caracterizou a condição análoga ao trabalho escravo.

Os operários dormiam em colchões rasgados ou em papelões no chão e não recebiam roupa de cama (alguns providenciaram por conta própria). A água era a da obra, sem processo de filtração e era armazenada na futura caixa de gordura. Eles não tinham lugar para cozinhar. O vaso sanitário não funcionava e todos usavam o mato para defecar. A iluminação vinha de um gato da rede elétrica, um roubo junto à companhia de energia. Na obra, ninguém tinha o chamado Equipamento de Proteção Individual.

Além dos 11 operários que foram “resgatados” neste final de semana, outros 39 trabalhadores, que prestaram serviço para a FEULB, continuam aguardando o pagamento de contas atrasadas que João Leite se comprometeu a pagar, ao celebrar com o MPT um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Pelo documento, assinado em setembro, o prazo final para o acerto de contas venceu semana passada.

Apesar de a obra ter sido embargada pela fiscalização do Ministério do Trabalho, João Leite deu continuidade aos trabalhos como se nada tivesse acontecido com os 11 operários sem contrato.

Pelo TAC assinado, além de indenizar os 11 trabalhadores que continuavam na obra sem contrato de trabalho, o advogado assumiu o compromisso de pagar todas as verbas rescisórias e salários atrasados de outros 39 operários, a maior parte deles dispensada em julho. Entre estes, nove também não tiveram registro em carteira.

O advogado, segundo o Jornal do Brasil apurou, até fez com que os 11 operários de Arapiraca assinassem um termo de rescisão contratual, mas foi apenas para constar, uma vez que nada pagou aos mesmos. A dívida com estes trabalhadores até que não é das maiores, totaliza cerca de R$ 12 mil. Mas o débito da FEULB é bem superior e muito variado.

Entre os 39 operários que têm dinheiro a receber está o pedreiro Lenício Santos, demitido em junho passado, depois de um ano de serviços prestados na construção destas 75 casas da segunda parte do Condomínio Marisa Letícia Lula da Silva.

Segundo alegou ao Jornal do Brasil, tem a receber cerca de R$ 3 mil de diárias e um total de R$ 10 mil somando as verbas indenizatórias que não lhes foram pagas. Outro colega seu, que não permitiu o JB o identificar, fala em, pelo menos, R$ 2.800 de diárias. “A indenização eu não sei quanto é, mas o homem do Ministério do Trabalho está calculando. Ele disse que vai levar o caso ao juiz”, explicou na entrevista por telefone.

Além das dívidas com quase 50 operários que contratou para a construção desta segunda parte do condomínio – a primeira etapa compreendeu 200 residências, entregues com atraso e que estaria gerando diversas reclamações dos novos proprietários – a Federação das Entidades Comunitárias e União de Lideranças do Brasil acumula um débito com o FGTS de R$ 108.266,22.

Com sede no bairro de Guaianases, em São Paulo, a Federação congrega seis filiais em todo o país. Ela é presidida nacionalmente pelo advogado João Leite, que é registrado na subseção de Guarulhos da OAB. Ele também preside a entidade em Alagoas.

Pelo telefone, ele e negou ao JB as acusações de irregularidade na contratação dos empregados e assim como garantiu não estar devendo nada aos operários: “Não é verdade isto, jamais. Com certeza estão inventando. Não existe isto não”, justificou-se.

Ao ser confrontado com as queixas dos operários, procurou esquivar-se: “Se assim fosse, eles teriam que entrar com reclamações trabalhistas. Às vezes algumas pessoas podem querer receber o que não têm direito. Então é uma questão a ser discutida na esfera judicial. Se está acontecendo de alguém ter falado isto, só pode ser isto (querer receber o que não tem direito). Esta situação não existe e nunca existiu”.

Ao ser confrontado com a ação da fiscalização do Ministério Público do Trabalho (MPT) de Arapiraca (AL) e pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Alagoas que chegaram a embargar a obra, o advogado simplesmente encerrou o telefonema.

Contrariando o que disseram os operários e a tudo o que o JB conseguiu apurar, o advogado garantiu antes que faltam apenas 2% das obras para a entrega das residências. Na verdade, as próprias fotos que o jornal conseguiu mostram que não é bem assim. As casas deveriam estar prontas há alguns meses e estão atrasadas, assim como atrasou também a entrega da primeira etapa do Condomínio Marisa Letícia Lula da Silva. Os operários demitidos confirmam este atraso na segunda etapa do condomínio.

Pela construção destas 75 casas, a FEULB recebeu um financiamento de R$ R$ 2.695.209. Mas os 35 mutuários, todos moradores de Penedo, também contribuíram durante dez meses com R$ 200, totalizando R$ 2 mil, o que fez com que o preço de cada imóvel ficasse em torno de 38 mil. Teoricamente, ao fim do pagamento da contrapartida, eles deveriam ter recebido os imóveis, o que não aconteceu. Os dois operários ouvidos pelo JB foram contratados em 1 de junho de 2011. Dez meses se completariam em março passado.

O financiamento é feito pelo Programa Habitacional Popular Minha Casa Minha Vida Entidades – PMCMV-E, gerido pela CEF com recursos do FGTS. O programa destina-se a financiar diretamente os beneficiários que se reúnem através de associações, ONGs, cooperativas ou sindicatos. Toda a verba já foi repassada à FEULB.