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Mensalão: Barbosa condena primeiros réus do núcleo político 

Parlamentares do PP são enquadrados em corrupção, lavagem e quadrilha 

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No 24º dia do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, da ação penal do mensalão, nesta segunda-feira, o ministro-relator Joaquim Barbosa votou pela condenação, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, dos três primeiros réus do chamado núcleo político, integrantes do Partido Progressista (PP): o atual deputado federal Pedro Henry (MT); o ex-deputado e ex-presidente do PP Pedro Corrêa (PE); e João Claúdio Genú, que foi assessor do falecido deputado federal José Janene (PR).

O relator também condenou, por lavagem de dinheiro e quadrilha, os réus Enivaldo Quadrado e Breno Fischberg, da corretora Bônus Banval, que atuaram como intermediários, a partir de janeiro de 2004, para “ocultar” R$ 1, 2 milhão, dos R$ 4,1 milhões recebidos pelo PP do esquema criminoso.

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Quadrilha

Esta foi a primeira vez, no julgamento da Ação Penal 470, que o relator enquadrou réus no crime de “quadrilha ou bando”, previsto no artigo 288 do Código Penal: “Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes (Pena: reclusão de um a três anos)”. Para o ministro, os três acusados do PP, mais o falecido José Janene, e mais tarde os dois corretores associaram-se de modo “estável e permanente” para a prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, atuando de fevereiro de 2003 até o final de 2004.

Joaquim Barbosa leu durante mais de quatro horas, apenas, a primeira parte do seu voto, que abrange — nesta etapa (item 6 da denúncia) — outros 20 réus, entre os quais os seguintes: José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Marcos Valério e seus sócios, por corrupção ativa; e — ainda por corrupção passiva e lavagem de dinheiro — os parlamentares dos outros partidos da então base aliada do Governo Lula, como o atual deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP) e os ex-parlamentares Roberto Jefferson (PTB-RJ), Romeu Queiroz (PTB-MG), Bispo Rodrigues (PL-RJ) e José Borba (PMDB-PR).

Na sessão da próxima quarta-feira, o ministro Joaquim Barbosa vai continuar o seu voto relativo aos demais integrantes do chamado núcleo político da ação penal do mensalão.

Os parlamentares 

Para demonstrar não haver “qualquer dúvida” da existência de um “esquema de compra de votos a esta altura do julgamento”, o ministro Joaquim Barbosa deu destaque a pagamentos, “devidamente comprovados”, feitos aos atuais e ex-parlamentares dos partidos que integravam, com o PT, na época dos fatos, a base de apoio do governo Lula.

O relator leu o conteúdo de duas listas com a identificação dos que receberam pagamentos “em datas muito próximas” à aprovação, pela Câmara dos Deputados, de matérias de grande interesse do governo federal. Tais pagamentos foram providenciados pelo então tesoureiro do PT e pela empresa SPM&B, de Marcos Valério — ainda conforme o voto do relator — em troca da aprovação das emendas constitucionais das reformas previdenciária e tributária.

Na primeira lista — segundo Barbosa confirmada em documentos e depoimentos constantes dos autos — o réu Valdemar Costa Neto, então presidente do PL, recebeu no período dessas votações os seguintes “pagamentos”: R$ 200 mil (7/10/2003), R$ 100 mil (15/10/2003), R$ 100 mil (21/10) e R$ 200 mil (28/10). Ao PP, presidido pelo réu Pedro Corrêa, foi destinado um total de R$ 1 milhão (entre 17/9/2003 e 15/10/2003).

Da segunda lista — relativa à época em que era votada a reforma tributária — constam os seguintes nomes de partidos e de parlamentares: PP (Pedro Corrêa e Pedro Henry)— R$ 300 mil (17/9/2003), R$ 300 mil (24/9/2003), R$ 100 mil (8/10/2003); PL (Valdemar Costa Neto)— R$ 100 mil(16/9/2003), R$ 100 mil (23/9/2003); PL (Bispo Rodrigues)— R$ 200 mil (30/9/2003), R$ 200 mil (7/10/2003); PTB (Roberto Jefferson)— R$ 200 mil (18/9/2003), R$ 100 mil (24/9/2003), R$ 300 mil (29/9/2003); PMDB (José Borba)— R$ 250 mil (16/9), R$ 250 mil (25/9).

PP

Para Barbosa, não havia “qualquer motivo” que justificasse o interesse do PT em promover e providenciar “grandes repasses” de dinheiro ao PP, a não ser o recebimento, pelos réus em questão, de “vantagens indevidas” a fim de votar, no plenário da Câmara, a favor de matérias de interesse do Governo Lula. Ele lembrou que, na época, o PP não era aliado político automático do PT, tanto que, nas eleições de 2004, não formou alianças municipais com o partido do governo federal para a eleição de prefeitos de capitais — a não ser um “acordo” acertado em Campo Grande (MS).

O relator, em seu voto, acolheu, assim, a acusação do procurador-geral da República de que, no período 2003-2004, os então deputados federais José Janene, Pedro Corrêa e Pedro Henry, auxiliados por João Cláudio Genú (assessor de Janene), receberam cerca de R$ 4 milhões oferecidos por José Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares para votarem a favor de matérias do interesse do governo federal.

Ele destacou que o próprio João Cláudio Genú admitiu as operações, que foram confirmadas por Simone Vasconcelos (ex-diretora-financeira da SMP&B). Ela confirmou que chegou a ser utilizado um carro-forte para a proteção de RS 1 milhão, em espécie, entregues ao assessor do PP.

PL, PTB e PMDB

A partir de quarta-feira, o ministro-relator vai tratar do repasse de dinheiro pelos dirigentes do PT ao Partido Liberal (PL) — hoje PR — feito ao deputado Valdemar Costa Neto (hoje no exercício do sexto mandato), que se valeu da intermediação do assessor Jacinto Lamas para o recebimento das quantias em espécie. Conforme os autos da ação, Costa Neto recebeu, nos anos 2003-2004, mais de R$ 8,885 milhões.

A denúncia descreve: “Sempre auxiliado por Jacinto Lamas, com o objetivo de dissimular a origem dos recursos, seu destino e sua natureza, Valdemar Costa Neto valeu-se de dois sistemas distintos para o recebimento da vantagem indevida(...) O primeiro foi a utilização da empresa Garanhuns Empreendimento, especializada em lavagem de dinheiro”. A empresa foi indicada por Costa Neto a Marcos Valério, e os repasses foram feitos por meio de cheques emitidos pela SMP&B em favor da Garanhuns. Em depoimento citado pelo procurador, o deputado federal informou que Jacinto Lamas recebia de Simone Vasconcelos os cheques que, posteriormente, eram trocados por dinheiro.

O segundo sistema de que teria se valido Costa Neto foi a utilização do esquema de lavagem de dinheiro disponibilizado pelo Banco Rural, tendo como intermediário Jacinto Lamas. Recibos informais apreendidos no curso da execução dos mandados de busca e apreensão no Banco Rural comprovaram — conforme o MPF — que Lamas recebeu, em nome de Valdemar Costa Neto, R$ 1 milhão.

O outro réu do PL é o ex-deputado federal Bispo Rodrigues (RJ). De acordo com as provas colhidas, ele recebeu dinheiro “do esquema comandado por José Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares”, valendo-se da intermediação de Célio Marcos Siqueira, motorista do deputado Vanderval Lima dos Santos (PL-SP). Quanto a políticos do PTB, a denúncia — confirmada pela sustentação oral do chefe do MPF — sustenta que José Carlos Martinez (já falecido), Roberto Jefferson (RJ) e Romeu Queiroz (MG) receberam as seguintes quantias, respectivamente: R$ 1,050 milhão; R$ 4,545 milhões; R$ 102,812 mil. Com a morte de Martinez, em outubro de 2003, Roberto Jefferson — que denunciou o mensalão — assumiu a presidência do PTB. E logo procurou dar continuidade ao esquema, cabendo a Queiroz, então deputado federal, “implementar” os contatos necessários para viabilizar a retomada dos pagamentos, o que foi feito com a intermediação do então ministro dos Transportes Anderson Adauto (PL), atual prefeito de Uberaba (MG), eleito pelo PMDB.

Este último é citado na denúncia como tendo recebido, no período 2003-2004, quando exercia o cargo de ministro, R$950 mil do “esquema financeiro” de Marcos Valério.

Na parte da denúncia referente aos políticos do PMDB, Roberto Gurgel afirmou ter ficado comprovado que, em 2003, José Borba recebeu R$ 200 mil para integrar a base de apoio do Governo. O recebimento do dinheiro ocorreu na agência do Banco Rural, situada no Brasília Shopping, por intermédio de Simone Vasconcelos, que procedeu ao saque, entregando a quantia em seguida ao então deputado federal. Isto por que, ao ser informado por um funcionário do banco de que deveria assinar um recibo, Borba recusou-se a fazê-lo, o que obrigou Simone Vasconcelos a retirar ela mesma o numerário.