ASSINE
search button

Segunda sessão do mensalão terá acusação de Roberto Gurgel

Procurador-geral da República terá cinco horas para expor argumentos da acusação

Compartilhar

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, terá até cinco horas para expor os argumentos da acusação contra os 38 réus do processo do mensalão nesta sexta-feira, na segunda sessão do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). 

A sustentação de Gurgel estava prevista para esta quinta-feira, mas foi adiada em face da polêmica questão de ordem levantada, no início dos trabalhos, pelo advogado Marcio Thomaz Bastos.

O cronograma do julgamento do mensalão foi, portanto, atrasado em um dia, pois na sessão desta sexta-feira começaria a série de sustentações orais dos advogados dos réus do mensalão, a partir da defesa do réu José Dirceu, apresentado na denúncia do Ministério Público Federal como o chefe da “sofisticada organização criminosa” montada para “garantir a continuidade do projeto de poder do Partido dos Trabalhadores, mediante a compra de suporte político de outros partidos”. 

Há grande expectativa pela fala de Roberto Gurgel, pois os advogados dos 38 acusados têm sido unânimes em afirmar que a denúncia elaborada pelo Ministério Público Federal não apresenta provas. Durante seu pronunciamento, o procurador-geral da República pode expor novos elementos que sustentem a tese da acusação e que, até agora, não eram de conhecimento público.

Nove ministros mantêm todos os réus no foro do STF 

Apesar do incidente processual provocado pelo advogado Marcio Thomaz Bastos, que gerou um tenso desentendimento entre os ministros Joaquim Barbosa (relator) e Ricardo Lewandowski (revisor), nove dos 11 integrantes do Supremo Tribunal Federal formaram maioria, e rejeitaram a questão de ordem proposta pelo ex-ministro de Justiça do Governo Lula — defensor de um dos 38 réus da ação pena do mensalão do PT — a fim de que a Ação Penal 470 fosse desmembrada, com o envio dos autos à Justiça de primeira instância no que diz respeito a 35 dos 38 réus do processo. 

Apenas três deles — os deputados João Paulo Cunha, Valdemar Costa Neto e Pedro Henry — gozam de foro no STF por prerrogativa de função, e seriam os únicos a serem julgados pela Corte se prevalecesse a questão de ordem levantada pelo defensor do réu Roberto Salgado (ex-diretor do Banco Rural).

>> Consulte o quadro com os 38 réus, crimes e penas previstas    

Os ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Ayres Britto acompanharam o voto do relator Joaquim Barbosa, e manifestaram-se contra o voto do revisor, que deferira, no início do julgamento, a questão de ordem proposta por Thomaz Bastos. Marco Aurélio foi o único que aderiu ao  voto do ministro-revisor.

A maioria formada entendeu que a questão já fora superada no decorrer do inquérito e da atual ação penal, na decisão de recursos da defesa dos réus, e que o “juízo único” é constitucional, prevalecendo em face do Pacto de San José de Costa Rica, que consagra o “duplo grau de jurisdição”. Tanto Fux como Toffoli ressaltaram que a Constituição, ao estabelecer o foro privilegiado do STF por prerrogativa de função para congressistas, “constitucionalizou” o “juízo único”.

No caso do processo do mensalão, o plenário já tinha decidido, duas vezes que a ação penal era tão intrincada, tendo em vista o esquema dividido em três “núcleos”, com a inclusão do crime de formação de quadrilha, que seria impossível seccioná-lo e encaminhar à instância comum os réus sem prerrogativa de foro especial. O ministro Gilmar Mendes chegou a afirmar que se tivesse havido o desmembramento do feito, o processo “estaria espalhado por aí, e seu destino seria a prescrição” .

Marco Aurélio manteve o seu entendimento já conhecido, na linha do ministro-revisor, no sentido de que era “absoluta” a incompetência do STF de manter no foro especial do Supremo aqueles réus — no caso da AP 470 , apenas três dos 38 — que não detêm a prerrogativa de foro privilegiado por prerrogativa de função. Mas fez um apelo para que a discussão fosse mantida “no plano das ideias e não no plano pessoal”, numa referência ao áspero desentendimento entre os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski no início da sessão, que será retomada ainda neste início de noite, com a apresentação do relatório resumido do ministro-relator.  

Início tenso

O julgamento da ação penal do mensalão do PT começou agitado logo na abertura dos trabalhos, às 14h30 desta quinta-feira, quando o advogado Marcio Thomaz Bastos — antes da leitura do relatório do ministro Joaquim Barbosa — levantou polêmica questão de ordem para solicitar o desmembramento do processo, com o envio dos autos à Justiça de primeira instância no que diz respeito à grande maioria dos réus, que não é formada por parlamentares. Thomaz Bastos afirmou que o ministro-relator Joaquim Barbosa havia recusado — sem pronunciamento definitivo do plenário quanto ao aspecto constitucional — questão de ordem anterior e um agravo sobre “a incompetência do Supremo de julgar réus que não têm direito a foro privilegiado por prerrogativa de função”.

Thomaz Bastos provocou indignada reação de Barbosa, sobretudo quando o seu colega Ricardo Lewandowski, revisor da ação, apoiou a questão levantada pelo ex-ministro da Justiça do governo Lula, que é advogado do réu Roberto Salgado, ex-diretor do Banco Rural. Joaquim Barbosa acusou o ministro-revisor de “deslealdade”, já que estava fazendo a revisão do processo há mais de seis meses, e não adiantara a ele, relator, o seu ponto de vista.Lewandowski reagiu: “Estou absolutamente à vontade para encaminhar um voto com todo o respeito no sentido contrário ao relator. Digo que estou absolutamente à vontade por que, nos últimos seis meses, examinei de forma vertical os autos. Tenho um alentado voto que posso proferir a qualquer momento. Por ocasião do recebimento da denúncia, me manifestei pelo desmembramento. Ainda ontem decidi, a pedido do Procurador-Geral da República, remeter ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) o inquérito do ex-senador Demóstenes torres, cassado pelo Senado”.

E passou a ler o longo voto que preparou sobre o assunto, propondo uma revisão do processo com  relação aos réus (a maioria), ficando no STF apenas os que têm mandato no Congresso.

A questão de ordem 

Bastos pediu a palavra, pela ordem, para dizer que, em 31 de agosto do ano passado, ao ingressar como advogado no feito, apresentou petição ao relator a fim de que levasse ao plenário questão de ordem “averbando a incompetência constitucional do STF para julgar réus que não tivessem a prerrogativa de foro”. A questão foi rejeitada, apesar dos recursos que interpôs.

Para Bastos, a matéria não foi decidida pelo plenário sob o enfoque constitucional, mas apenas “à luz da legislação infraconstitucional”. E fez a seguinte exposição: “Nunca, em nenhum momento, foi enfrentada por esta Corte, em termos constitucionais, a impossibilidade da extensão das competências a réus que não tenham o foro de prerrogativa. Todas as vezes em que isso foi discutido foi em termos de utilidade ou não. Não se venha dizer se trata de expediente para adiar o julgamento. Se a questão de ordem for concedida, o processo vai pronto para um juiz natural dar a sentença; é possível que a sentença seja dada antes do final desse julgamento plenário. O fato é que o eminente relator trocou o efeito pela causa. A causa de pedir foi a incompetência da corte para julgar quem não tivesse prerrogativa de foro. E o efeito é o desmembramento do feito. É a primeira vez que a causa é colocada aqui. Olhando a jurisprudência da Corte, examinando a jurisprudência em outros casos, vemos que oito ministros já disseram que a Constituição quer que as pessoas que não tenham foro sejam julgadas pelo juiz natural, e que seja assegurado o duplo grau de jurisdição”.

Bastos acrescentou que “o ministro Marco Aurélio tem toda razão quando diz que artigo 102, número 1, letras b e c da Carta somente pode ser entendido estritamente. Só pode ser estendido para os que não tem prerrogativa de foro por”. Ou seja, deve haver “respeito ao princípio do juiz natural”.  

Relatório

A sessão inicial do julgamento do mensalão foi reiniciada no início da noite, com a leitura, pelo ministro-relator, Joaquim Barbosa, de um resumo de cerca de 50 páginas de seu relatório de 122 folhas que já tinha sido enviado aos seus colegas e divulgado na imprensa em dezembro do ano passado. Por volta das 19h30, os três ministros que atuam também no Tribunal Superior Eleitoral — Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Dias Toffoli — deixaram o plenário, já que tinham sessão extraordinária naquela Corte.

Pouco depois, Barbosa encerrou a leitura do relatório — ao qual nada acrescentou — ficando para esta sexta-feira, a partir das 14 horas, a sustentação oral do procurador-geral da República. O ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, aprovou o relatório do relator, sem comentários.