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STF deve liberar programas de TV em qualquer horário, com classificação de idade

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Quatro ministros do Supremo Tribunal Federal já tinham votado, nesta quarta-feira, no sentido de que programas de televisão com “classificação indicativa” até para maiores de 14 ou 16 anos podem ser apresentados em qualquer horário, desde que mantenham o “aviso de classificação”, quando o ministro Joaquim Barbosa pediu vista dos autos.

Em julgamento, ação de inconstitucionalidade proposta pelo PTB que considera “censura prévia”, contrária ao direito de livre expressão, o dispositivo do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.609/90), que obriga as emissoras de rádio e televisão, sob pena de multas, a ter “horário autorizado” para a apresentação de espetáculos.

O ministro Joaquim Barbosa surpreendeu os que já haviam votado — Dias Toffoli (relator), Luiz Fux e Cármen Lúcia — ao pedir vista, alegando que não tinha tido tempo de estudar melhor a questão, sobretudo ao tomar conhecimento, e ficar “perplexo”, de ação civil pública do Ministério Público contra a TV Correio, da Paraíba, que apresentou, em vídeo, cenas do estupro de uma menor, ocorrido em setembro último. Logo em seguida, o ministro Ayres Britto pediu para antecipar o seu voto, na linha da maioria até então formada. 

A ação

A ação de inconstitucionalidade do PTB foi ajuizada há mais de 10 anos, e teve como relatores Sepúlveda Pertence (aposentado) e Menezes Direito (falecido). A ação passou, em outubro de 2009, à relatoria do ministro Dias Toffoli, que proferiu um voto de quase duas horas.

A ação do PTB visava, apenas, à expressão “em horário diverso do autorizado” contida no art. 254 da ECA, que prevê “infração administrativa” sujeita a multa de 20 a 100 salários mínimos, no caso de transmissão, através de rádio ou televisão, de espetáculo em horário diverso do autorizado ou sem aviso de classificação, podendo a punição ser duplicada em caso de reincidência, e até provocar a suspensão da programação da emissora por até dois dias.

Para o partido e para a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), interessada na causa, a Constituição usa o verbo “recomendar” quando fala de “regular” as diversões públicas, e não penaliza as emissoras que as transmitem, como assinalou o advogado da Abert, Gustavo Binenbojn.

Voto do relator

O ministro Toffoli começou por afirmar que própria Constituição estabeleceu “o ponto de equilíbrio” entre os axiomas da liberdade de expressão e da proteção da criança e do adolescente, nos incisos do parágrafo 3º do artigo 220, segundo os quais “compete à lei federal: regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada”; “estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas de rádio e televisão que contrariem o disposto no artigo 221”. Este artigo, por sua vez, prevê que a programação das emissoras deve atender, entre outros princípios, ao do “respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família”.

No entanto, concordou com o ponto de vista de que não cabe ao Poder Público “autorizar” a exibição de programas no rádio ou na televisão, já que o inciso 16 do artigo 21 da Carta Magna dispõe ser competência da União “exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão”.

Assim, segundo Toffoli, o Poder Público não pode submeter as emissoras a sanções administrativas. Ele fez uma pesquisa nos anais da Constituinte de 1988, para mostrar que já havia preocupação quanto à confusão entre a competência do Estado de “autorizar” ou de “orientar” as emissoras na chamada classificação indicativa.

E concluiu que a aplicação de multas prevista na lei, acaba por ser uma “restrição prévia” e, portanto, “um ato de proibição, de caráter autorizativo”. Ainda segundo Toffoli, cabe aos pais e aos responsáveis dizerem a seus filhos ou tutelados se podem ou não assistir a programas com classificação indicativa, não tendo o Estado a competência de punir as emissoras com multas ou de suspender por até dois dias a sua programação.

Toffoli considerou, então, inconstitucional a expressão “em horário diverso do autorizado”, constante do seguinte artigo 254 da ECA: “Transmitir, através de rádio ou televisão, espetáculo em horário diverso do autorizado ou sem aviso de sua classificação: Pena- multa de vinte a cem salários de referência; duplicada em caso de reincidência a autoridade judiciária poderá determinar a suspensão da programação da emissora por até dois dias”.

Assim, a prevalecer o entendimento da maioria até agora formada, a multa só é devida pelas emissoras - conforme o pedido da ação - quando o espetáculo for ao ar “sem aviso de sua classificação”.

AGU e PGR contra

Em nome da Advocacia-Geral, a secretária-geral de Contencioso, Grace Maria Mendonça, sustentou que a questão deveria ser analisada a partir do entendimento de que a liberdade de expressão não é absoluta, e em conjunto com outros direitos fundamentais, como o direito à proteção do menor e da família. A seu ver, o dispositivo do ECA “não institucionalizou a censura”, já que o Poder Público não restringe, modifica ou interfere na manifestação da liberdade de expressão.

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também fez sustentação oral, para reforçar o seu parecer. Ele propôs inicialmente que a ação nem fosse “conhecida”, já que só atacava o dispositivo do ECA referente às penas previstas às emissoras que não seguissem a “classificação indicativa”.

O advogado da Abert, Gustavo Binembojn, argumentou que a Constituição usa o verbo “recomendar” quando fala de “regular” as diversões públicas, e não penaliza as emissoras que as transmitem. E criticou a briga constante entre as emissoras e o Poder Público, em torno da propensão do Estado de ser o “tutor” das “escolhas morais”.