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Supremo manda soltar italiano Cesare Battisti

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O ex-ativista italiano Cesare Battisti, condenado em seu país por quatro homicídios cometidos na década de 70, não vai mesmo ser extraditado, e já pode contar com alvará de soltura a ser expedido, imediatamente, de acordo com decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal, na noite desta quarta-feira. Por 6 votos a 3, o STF nem entrou no mérito da decisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de não efetivar a extradição, que havia sido concedida pela Corte, em novembro de 2009, pelo placar de 5 a 4. 

Em questão preliminar levantada pelos ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, no início da longa sessão, encerrada às 21h10, prevaleceu o entendimento de que a "reclamação constitucional" do governo da Itália, ajuizada em fevereiro, não poderia nem ser julgada no mérito, por não competir a Estado estrangeiro questionar ato político do presidente da República Federativa do Brasil, no exercício da soberania do país. 

A maioria foi logo consolidada com os votos mais ou menos inesperados dos ministros Fux e Ricardo Lewandowski, que foram acompanhados por Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Ayres Britto e Ricardo Lewandowski. Este último ficara vencido - juntamente com Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Ellen Gracie - no julgamento de novembro de 2009, em que a maioria assentou que cabia ao presidente da República a "palavra final" sobre a extradição. 

O alvará de soltura de Battisti –  preso há quatro anos, à disposição do STF – foi aprovado depois de propostas nesse sentido dos ministros Cármen Lúcia e Joaquim Barbosa, já que estava em julgamento, também, petição da defesa nesse sentido. 

Indignação 

Apesar da decisão da maioria de que a reclamação do governo italiano não podia ser "conhecida" e, portanto, nem julgada no mérito, o relator Gilmar Mendes proferiu um longo voto de quase duas horas. Segundo ele, era "inegável o interesse jurídico relevante do Estado requerente, não tendo sentido a invocação de soberania, até por que os dois países têm tratado de extradição em vigor, incorporado ao direito positivo brasileiro". A certa altura exclamou, indignado: "Nunca foi assim! Sempre se cumpriu a extradição concedida pelo Supremo. Cabe à Corte exercer sua competência no sentido de que sejam cumpridas suas decisões. A se defender o livre arbítrio do Poder Executivo no cumprimento do que a Corte decidiu, o Supremo passa a ser objeto de brincadeira, um clube lítero-poético-recreativo". 

Joaquim Barbosa interrompeu a leitura do voto de Mendes, afirmando que a questão já estava encerrada; que se deveria tratar logo da situação "de uma pessoa presa há quatro anos, em regime fechado"; e que "não faz o menor sentido essa discussão, sem que deliberemos sobre a soltura do extraditando". 

Defesa de Battisti 

Os votos da maioria do plenário refletiram as sustentações orais feitas pelo advogado de Battisti, Luís Roberto Barroso, e pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que defenderam o não cabimento da reclamação do governo da Itália. Gurgel foi enfático ao defender a decisão presidencial da não efetivar a extradição de Battisti, por se tratar de questão "interna corporis" e um "ato soberano" do Executivo brasileiro. Barroso aproveitou para ressaltar que a decisão do ex-presidente Lula foi "moralmente legítima, já que 32 anos um mês e 23 dias separam o ato de que é acusado Cesare Battisti e este momento". 

E citou manifestações "inamistosas" do governo italiano contra o ato do ex-presidente como exemplos do "clima" que se criou naquele país, que caracterizariam os "fundados temores de perseguição" a que se refere a exceção prevista no tratado de extradição bilateral. 

O ministro Luiz Fux deu por lido um voto de 50 páginas, mas foi incisivo ao dizer que não concordava com o relator, e sublinhar que "o que está aqui em jogo não é o passado nem o futuro de um homem, mas a soberania nacional". Ele exaltou-se ao comentar que um ministro italiano chegou a dizer que o Brasil não é conhecido por seus juristas, mas por suas dançarinas. Ainda segundo Fux, o próprio STF já tinha resolvido que a concessão de extradição não vincula o presidente da República. 

Os demais ministros que formaram a maioria também deram por lidos os seus votos, mas fizeram algumas observações ou - como Ayres Britto - leram trechos substanciais de suas manifestações. Cármen Lúcia e Joaquim Barbosa ressaltaram logo que não estava mais em jogo o mérito do processo extraditório nem a competência do chefe do Executivo de manter Battisti no Brasil, mas se o alvará de soltura do preso seria expedido pelo próprio plenário. Nesse sentido foi também o breve "registro" de Marco Aurélio. 

Vencidos 

Os ministros Cezar Peluso e Ellen Gracie proferiram resumos de seus votos quando já estavam vencidos, juntamente com o relator Gilmar Mendes. Ambos reafirmaram que os atos do presidente da República - quaisquer que sejam - estão "sujeitos a controle jurisdicional". Não só para efeitos internos mas também em se tratando de tratados internacionais, que se incorporam ao direito interno, como se fossem leis. Segundo eles, o ex-presidente Lula descumpriu o tratado de extradição Brasil-Itália, por não existirem "razões ponderáveis" que justificassem a permanência de Battisti no Brasil, sem ser refugiado político.