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'Retirar R$ 15 bi da saúde seria uma tragédia', diz Temporão

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Jaime Gonçalves Filho e Júlia Moura, Agência JB

RIO - Participante de greves quando ainda era residente, depois de formar-se em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1977, o ministro José Ramos Temporão se vê agora do outro lado do balcão, tendo de negociar com médicos grevistas do Nordeste do país.

Temporão admite que a luta dos médicos é "justa e razoável" e que os profissionais são mal remunerados, mas que gostaria de pensar, junto aos representantes da categoria, em alternativas que permitam a construção de uma mesa de negociações. O ministro, no entanto, ressalta, que a não interrupção dos serviços ajudaria nas negociações.

O Governo Federal desbloqueou R$ 2 milhões para negociar salários com os médicos em greve em vários Estados. Ainda esta semana, o ministro apresentará o projeto do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) da Saúde à ministra da Casa Civil, Dilma Roussef.

Responsável pela implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), uma das maiores políticas de inclusão social do país, Temporão assumiu o ministério, em março de 2007, com disposição para a briga. A primeira delas foi com os fumantes, ao recrudescer a campanha contra o tabagismo e, consequentemente, apoiar a proibição do fumo em locais fechados. Em seguida, polemizou com a Igreja Católica ao defender que os hospitais públicos realizassem abortos, diminuindo assim o número de mortes causadas por abortos clandestinos.

Em entrevista concedida ao JB Online, o ministro se declarou favorável à prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e ressaltou a importância para o SUS da aprovação da regulamentação da Emenda Constitucional 29, que estabelece quanto os governos federal, estaduais e municipais devem aplicar no setor de Saúde.

JB Online: Estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento tributário, no dia 29 de agosto deste ano, mostrou que em média o brasileiro tem que trabalhar sete dias por ano para pagar a CPMF. O senhor é a favor ou contra a cobrança prorrogada da CPMF? Como os recursos estão sendo usados pela Saúde?

José Gomes Temporão: É de extrema importância que o Congresso aprove a prorrogação da CPMF. Os recursos desse tributo representam uma injeção de R$ 15 bilhões anuais na saúde. Como tenho reiterado, retirar R$ 15 bilhões da saúde seria uma tragédia.

Além do nosso esforço para garantir a CPMF, estamos trabalhando junto ao Congresso Nacional para que os parlamentares aprovem a regulamentação da Emenda Constitucional 29, que estabelece quanto a União, os estados e os municípios devem aplicar no setor de Saúde. E essa emenda é importante também porque ela define o que realmente é gasto com saúde, evitando o desvio dos recursos do setor para outras áreas. Mas vamos sair um pouco dos números porque esses números de nada adiantam se não estiverem acompanhados de uma busca incessante pela melhoria da gestão do SUS. Precisamos estabelecer novos modelos de gestão que garantam os princípios do SUS, que permitam às instituições de saúde operar em base de maior eficiência e qualidade. O dinheiro é fundamental, mas devemos reconhecer que só uma gestão devidamente qualificada é capaz de reverter recursos financeiros em uma assistência digna à população do nosso país."

JB Online: O que o senhor pensa sobre a campanha de algumas entidades como a Fiesp e a Febrapan, contra a CPMF?

J. G. Temporão: Sou um ferrenho defensor da liberdade de manifestação. Mas, como ministro da Saúde, tenho a obrigação de trabalhar para garantir o financiamento do SUS, fundamental para que o nosso sistema público se consolide de acordo com os preceitos constitucionais, ou seja, prestador de uma assistência universal, equânime e integral à população.

JB Online: Sobre a greve dos médicos no Nordeste, qual é a solução a curto prazo para este problema? Quais são as medidas que o Ministério está adotando?

J. G. Temporão: O Ministério da Saúde anunciou a liberação de R$ 580 milhões em recursos extras para atender as necessidades urgentes dos estados e do Distrito Federal. A medida eleva para R$ 18,66 bilhões os recursos para alta e média complexidade. Isso significa que os novos recursos estarão disponíveis não apenas para essa situação emergencial, mas também para os próximos anos. A alta complexidade responde por procedimentos que envolvem alta tecnologia e/ou alto custo, como cardiologia, terapia renal substitutiva e oncologia. Já a média complexidade tem o objetivo de atender os principais agravos de saúde da população, com procedimentos e atendimento especializados. Assim, o gasto com esse tipo de procedimento será elevado de R$ 17,8 bilhões para R$ 18,66 bilhões. Já foram liberados R$ 50,5 milhões para Pernambuco, R$ 26 milhões para o estado de Alagoas, e R$ 45 milhões para o Ceará e R$ 12,4 milhões para a Paraíba.

JB Online: Em relação ao Planejamento Familiar, o senhor não considera um número muito alto, o país ter aproximadamente 40% das mulheres esterilizadas? Considerando isso, não seria mais saudável intensificar as campanhas sobre uso de pílulas e camisinhas do que estimular a vasectomia e a laqueadura em mulheres cada vez mais jovens?

J. G. Temporão: Como já me manifestei, sou contrário à redução da idade para a esterilização. Qualquer proposta baseada em redução da idade para esterilização voluntária sou radicalmente contra, porque isso não é planejamento familiar, é controle de natalidade. Essa é uma fase superada no Brasil. O ministério vai trabalhar para que todo e qualquer conteúdo sobre controle de natalidade seja rejeitado.

JB Online: Quais os avanços do Ministério em relação ao combate ao tabagismo?

J. G. Temporão: Em artigo publicado em maio deste ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta o Brasil como o país que mais reduziu o número de fumantes nos últimos dez anos. É um sucesso para o país, para a sociedade e para a saúde pública brasileira. Isso nos estimula a aperfeiçoar ainda nossa política antitabagista, que é uma articulação entre a proibição da propaganda de cigarro no país, a divulgação de informações sobre os malefícios do tabaco e a assistência do SUS às vítimas do cigarro.

JB Online: Reportagem feita pelo Jornal do Brasil constatou que há dificuldades das pessoas adquirirem os kits de combate ao tabagismo. O que está sendo feito para contornar este problema? O número de jovens fumantes continua diminuindo?

J. G. Temporão: O Ministério da Saúde disponibiliza materiais de apoio e medicamentos, como adesivo transdérmico de nicotina, goma de mascar de nicotina e bupropiona para municípios que tenham unidades de saúde credenciadas para abordagem e tratamento do tabagismo na rede SUS. A base do tratamento do tabagismo é a abordagem cognitivo-comportamental, individual ou em grupo de apoio, podendo ser utilizado um apoio medicamentoso em condições específicas. No momento, a distribuição dos medicamentos já foi regularizada para os municípios. O material de apoio, que consta de manuais entregues aos pacientes ao fim de cada sessão de atendimento, está em fase de reprodução pelo Ministério da Saúde. Quanto ao número de fumantes jovens, o artigo da Organização Mundial de Saúde mostra que o Brasil foi o país que mais reduziu o número de fumantes nos últimos dez anos, em todas as faixas etárias.