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Não há guerra sem razão econômica

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Os atentados do Estado Islâmico que assombraram Paris na noite desta sexta-feira (13) estão sendo tratados internacionalmente como um problema de guerra santa e suas motivações econômicas, desencadeadas pela enorme desigualdade social do mundo, caíram em esquecimento. A fuga de refugiados sírios e libaneses, a fome, a falta de trabalho, a discriminação e o abandono de um povo explorado por seus antigos colonizadores são apenas alguns dos fatores que compõem esta equação. Até o petróleo - que atualmente vive um momento de crise, em função da queda de seus preços – encontrou seu espaço dentro desta conjuntura.

Isso porque o contrabando da commodity se tornou a principal forma de financiamento do EI. Em entrevista à revista Exame, o fundador do Instituto de Energia do Iraque, Luay Al-Khateeb, informou que em 2014 a guerrilha já controlava 60% dos ativos de petróleo da Síria. Doações de simpatizantes, saques e “pedágios” deixaram de ter tanta importância e o EI, à época, já tinha capacidade de contrabandear 30 mil barris de petróleo bruto por dia, vendendo-os a preços irrisórios.

A responsabilidade das grandes potências nos conflitos que hoje assolam o Oriente Médio fica cada vez mais evidente. Além da iminente publicação do relatório Chilcot, resultado de investigações sobre o papel do Reino Unido na Guerra do Iraque, o próprio ex-primeiro ministro britânico Tony Blair admitiu à rede CNN no último dia 27 “certa verdade” nas afirmações que atribuem a ascensão do EI à Guerra do Iraque. "Claro que não se pode dizer que nós, que afastamos Saddam, não temos responsabilidade nisso", afirmou.

"Peço desculpas pelo fato de que a inteligência que recebemos foi errada. Também peço desculpas pelos erros no planejamento e, principalmente, pela nossa incapacidade de prever o que aconteceria quando derrubássemos o regime", completou Tony Blair. Contraditório em suas afirmações, ele também opinou que o país está melhor sem Saddam Hussein.

Em sua última biografia, lançada na última terça-feira (10), o ex-presidente dos Estados Unidos George H. W. Bush também critica com contundência o ex-secretário de Estado Dick Cheney no que se refere à sua reação ao 11 de setembro. De acordo com Bush pai, ele tomou atitudes radicais em relação ao Oriente Médio. O biografado ainda lamentou que Cheney tivesse tanta autonomia durante o governo de seu filho.

O mundo certamente atravessa um momento de crise, em que as proporções da desigualdade social fazem lembrar as invasões dos godos e visigodos à Europa. Esses povos, tidos à época como “bárbaros”, faziam oposição à realidade de riqueza vivida pelo Império Romano e a eles negada. Neste sábado, François Hollande, presidente de um país com a estrutura militar da França, veio a público reconhecer sua impotência no que se refere à segurança do povo francês. Em seu discurso, pediu que as pessoas fiquem em suas casas. Trata-se, na verdade, de uma admissão de falência da autoridade. As autoridades já não conseguem dar garantias de segurança a seu povo e as classes mais pobres continuam sendo as mais prejudicadas. A elite as agride de forma colonial, não permitindo inclusive que elas possam ter voz em seus governos. 

Aqui não se defende o Estado Islâmico nem a covardia das ações que por eles estão sendo tomadas. O que se quer é uma reflexão responsável do mundo e de sua dinâmica de poder econômico. Hoje o que se vê é uma guerra econômica, uma guerra da sobrevivência. De um estado submetido a uma conjuntura de desigualdade internacional, onde crianças morrem nas ruas - seja com tiros de fuzil ou bombas, como quando o Iraque bombardeou a Palestina. O que se quer, portanto, é uma reflexão daqueles que podem e devem viabilizar as soluções do mundo. Qual a forma correta da igualdade, fraternidade e liberdade?