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A 'independência' da Folha de S. Paulo

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O jornal Folha de S. Paulo publicou neste domingo três matérias bastante interessantes. A primeira: "Gestão Alckmin paga R$ 1,5 milhão a João Doria Jr, pré-candidato tucano à Prefeitura da capital".

Veja a reportagem: 

"O governo do Estado de São Paulo, comandado pelo tucano Geraldo Alckmin, pagou R$ 1,5 milhão ao empresário João Doria Jr., um dos pré-candidatos do PSDB à prefeitura paulistana, por anúncios veiculados em sete revistas da Doria Editora, entre 2014 e abril deste ano.

Os pagamentos foram intermediados por duas agências publicitárias contratadas pelo governo, a Mood e a Propeg, escolhidas por licitação, e seguiram os trâmites que regulam a publicidade estatal.

Doria é presidente do Lide (Grupo de Líderes Empresariais), que organiza eventos para empresários de diversas áreas, como o Fórum de Comandatuba, na Bahia. Sua editora possui 19 títulos, que em boa parte são atrelados aos encontros que promove.

Em um dos casos, o governo pagou R$ 501 mil por um publieditorial –formato em que o anúncio é semelhante a uma reportagem– de nove páginas na revista "Caviar Lifestyle", que declara circulação de 40 mil exemplares.

Há casos em que os valores pagos pelo governo foram proporcionalmente maiores em anúncios da editora do que em revistas consolidadas, que passam por verificação independente de circulação.

No dia 5 de dezembro, o governo pagou R$ 259 mil por um anúncio de oito páginas na revista "Meeting & Negócios". Em 15 de janeiro, repassou R$ 202 mil por um anúncio de quatro páginas na revista "Líderes do Brasil".

Uma propaganda com o dobro do tamanho na "Exame", da Editora Abril, custou R$ 292 mil. Também em janeiro, por um anúncio de duas páginas na "Época", da Editora Globo, o governo pagou R$ 71 mil. Já a Editora Três cobrou R$ 479 mil do governo por 18 páginas na "IstoÉ".

Nenhuma das revistas da Doria Editora é certificado pelo IVC (Instituto Verificador de Comunicação), que audita a distribuição das principais publicações –como as outras revistas citadas.

PROXIMIDADE

Doria é filiado ao PSDB desde 2001, segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Ele foi secretário de Turismo na prefeitura de Mário Covas (1983-86), mas nunca disputou eleições. O empresário mantém relação próxima com Alckmin, a quem apoiou na campanha à reeleição no ano passado.

Durante a disputa, o grupo organizou encontros entre empresários e os três principais candidatos. Além de Alckmin, foram convidados Paulo Skaf (PMDB), presidente da Fiesp, e Alexandre Padilha (PT), hoje secretário de Saúde da Prefeitura de São Paulo.

Mesmo nos encontros organizados para os adversários falarem a empresários, Doria ressaltava ao microfone que apoiava a candidatura de Alckmin.

Três semanas antes do primeiro turno, Doria organizou um jantar em homenagem ao governador em sua casa. Além dos principais expoentes do PSDB, como o senador Aécio Neves (MG) e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, empresários foram ao evento demonstrar apoio a Alckmin.

Neste ano, em maio, Doria homenageou Alckmin em Nova York, durante encontro organizado pelo Lide em parceria com a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos. Na semana passada, o governador compareceu a dois encontros do grupo de empresários, na capital paulista.

OUTRO LADO

O governo de São Paulo não respondeu às perguntas enviadas pela Folha sobre os pagamentos de R$ 1,5 milhão que realizou à Doria Editora, do empresário João Doria Jr., um dos pré-candidatos tucanos à prefeitura paulistana.

A reportagem questionou sobre os gastos com publicidade em revistas da empresa, entre 2013 e 2015, mas não houve resposta. O jornal também perguntou sobre os critérios utilizados na escolha, também sem resposta.

Folha requisitou a mesma informação à Doria Editora que, em nota, afirmou que "não divulga valores de faturamento dos seus clientes, sejam eles públicos ou privados". O texto ressalta que "este comportamento é exatamente o mesmo de outras publicações". Segundo a editora, 86% de seu faturamento vem de empresas privadas.

Sobre os preços cobrados, a editora diz que suas "tabelas de preços são do conhecimento do mercado publicitário e praticadas em negociações com agências e anunciantes, em função do volume e frequência de mídia".

"A Doria Editora não pode sofrer qualquer condenação ou juízo de conflito de interesses por agir dentro das estritas regras do mercado publicitário", finaliza a nota.

Folha teve acesso a documentos relativos à publicidade do governo por meio da Lei de Acesso à Informação.

A reportagem pediu o relatório de mídia da gestão Alckmin, com os gastos em propaganda entre 2013 e este ano, divididos por ano, veículo, tipo de mídia e agência que intermediou, pedido idêntico a outro feito em 2012 –atendido na ocasião.

O Executivo estadual disse que as informações estão em sites, mas, no trâmite do pedido feito via Lei de Acesso à Informação, a Secretaria de Governo do Estado acolheu o argumento de que os dados pedidos não estão on-line.

A Casa Civil respondeu que a Folha poderia consultar os documentos, mas não deu os dados organizados, apesar de tê-los. Cerca de 70 mil páginas foram postas à consulta.

Questionado sobre o tema, o governo reiterou que "não cabe repetir o procedimento de 2012 porque os pagamentos efetivos estão disponíveis em endereço eletrônico". 

Se por alguma circunstância João Doria ganhar a eleição, com certeza Alckmin terá problema, como vem acontecendo com as empresas que financiaram Lula e Dilma. Só que, desta vez, é o próprio governo que financia o candidato dele.

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A segunda matéria da Folha de S. Paulo refere-se ao crescimento das classes menos favorecidas e da queda dos endinheirados. O jornal destaca o filme "Que horas ela volta?" para analisar a evolução das classes socioeconômicas no Brasil.

>> VEJA A MATÉRIA

Destaque para o gráfico publicado pelo jornal, mostrando que a classe média intermediária passou a ser o grupo mais numeroso do país. Outro dado importante é que os jovens de 16 a 24 anos com ensino superior passaram de 8%, em 2005, para 17% em 2015.

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Na terceira matéria, com o título "Réus ficaram meses sob pressão até acordo", o jornal mostra que os 11 principais colaboradores da Lava Jato permaneceram, em média, três meses na cadeia até virarem delatores. Fernando Baiano é o delator que mais tempo ficou preso até decidir pelo acordo: foram 9 meses e 22 dias.

>> CONFIRA A REPORTAGEM

O ex-juiz e advogado Pedro Castelo Branco considera que a prisão dos delatores não seja algo direcionado a pressionar os envolvidos na Lava-Jato por depoimentos. “Já existiam processos contra eles. Vários já haviam sofrido condenação. É uma forma legítima encontrada para desfazer quadrilhas”, afirmou. 


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A independência do jornal é tão grande que ainda lhe coube o direito de, num editorial na primeira página, pedir o impeachment de Dilma caso o Brasil não resgate o investment grade. Isso só pode acontecer, com a receita que o jornal indica, fazendo arrocho na Saúde e na Educação, e criando os impostos que são necessários.

Confira o editorial:

Última chance

Às voltas com uma gravíssima crise político-econômica, que ajudou a criar e a que tem respondido de forma errática e descoordenada; vivendo a corrosão vertiginosa de seu apoio popular e parlamentar, a que se soma o desmantelamento ético do PT e dos partidos que lhe prestaram apoio, a administração Dilma Rousseff está por um fio.

A presidente abusou do direito de errar. Em menos de dez meses de segundo mandato, perdeu a credibilidade e esgotou as reservas de paciência que a sociedade lhe tinha a conferir. Precisa, agora, demonstrar que ainda tem capacidade política de apresentar rumos para o país no tempo que lhe resta de governo.

Trata-se de reconhecer as alarmantes dimensões da atual crise e, sem hesitação, responder às emergências produzidas acima de tudo pela irresponsabilidade generalizada que se verificou nos últimos anos.

Medidas extremas precisam ser tomadas. Impõe-se que a presidente as leve quanto antes ao Congresso –e a este, que abandone a provocação e a chantagem em prol da estabilidade econômica e social.

Também dos parlamentares depende o fim desta aflição; deputados e senadores não podem se eximir de suas responsabilidades, muito menos imaginar que serão preservados caso o país sucumba.

É imprescindível conter o aumento da dívida pública e a degradação econômica. Cortes nos gastos terão de ser feitos com radicalidade sem precedentes, sob pena de que se tornem realidade pesadelos ainda piores, como o fantasma da inflação descontrolada.

A contenção de despesas deve se concentrar em benefícios perdulários da Previdência, cujas regras estão em descompasso não só com a conjuntura mas também com a evolução demográfica nacional. Deve mirar ainda subsídios a setores específicos da economia e desembolsos para parte dos programas sociais.

As circunstâncias dramáticas também demandam uma desobrigação parcial e temporária de gastos compulsórios em saúde e educação, que se acompanharia de criteriosa revisão desses dispêndios no futuro.

Além de adotar iniciativas de fácil legibilidade, como a simbólica redução de ministérios e dos cargos comissionados, devem-se providenciar mecanismos legais que resultem em efetivo controle das despesas –incluindo salários para o funcionalismo–, condicionando sua expansão ao crescimento do PIB.

Embora drásticas, tais medidas serão insuficientes para tapar o rombo orçamentário cavado pela inépcia presidencial. Uma vez implementadas, porém, darão ao governo crédito para demandar outro sacrífico –a saber, alguma elevação da já obscena carga tributária, um fardo a ser repartido do modo mais justo possível entre as diversas camadas da população.

Não há, infelizmente, como fugir de um aumento de impostos, recorrendo-se a novas alíquotas sobre a renda dos mais privilegiados e à ampliação emergencial de taxas sobre combustíveis, por exemplo.

Serão imensas, escusado dizer, as resistências da sociedade a iniciativas desse tipo. O país, contudo, não tem escolha. A presidente Dilma Rousseff tampouco: não lhe restará, caso se dobre sob o peso da crise, senão abandonar suas responsabilidades presidenciais e, eventualmente, o cargo que ocupa.