ASSINE
search button

Entre o imprevisível e o calculável: EUA decidem entre Trump e Hillary

Cerca de 120 milhões de norte-americanos vão às urnas nesta terça-feira

Compartilhar

Os Estados Unidos se preparam para a eleição indireta do novo presidente nesta terça-feira (8), com os candidatos do Partido Republicano e do Democrata na vantagem da disputa. De um lado, o homem do imponderável -- em relação as suas escolhas e aos efeitos que pode causar na política interna e externa --, que pode surpreender nas urnas, principalmente devido aos efeitos nefastos da desindustrialização do país. Do outro, Hillary Clinton, "queridinha da América", nem por isto menos temida em relação às políticas que deve adotar. 

A atriz Susan Sarandon, em entrevista à BBC nesta quarta-feira (2), ajudou a resumir o embate. Anunciou que votará na candidata do Partido Verde, Jill Stein. “O medo de Donald Trump não é suficiente para que apoie Clinton com seu histórico de corrupção”, disse a atriz, que apoiou o democrata rival de Clinton nas primárias, Bernie Sanders. Para ela, escolher entre Hillary e Trump é "votar no menor dos males".

Stein e o candidato do partido Libertário, Gary Johnson, contudo, registram menos que 5% das intenções de voto em pesquisas. Já Trump e Hillary disputam poucos pontos de diferença. Pesquisa da ABC News e do jornal Washington Post divulgada neste domingo (6) mostrava a democrata com cinco pontos de vantagem, 48% contra 43%.

>> Eleições nos Estados Unidos ocorrem por meio de delegados; entenda

O cientista político João Feres, em conversa com o JB por telefone, lembra que o "poderosíssimo" establishment dos EUA impede que tanto Trump quanto Hillary signifiquem, de fato, mudanças efetivas ao status quo. "As conexões com o poder são gigantes, não mudam radicalmente com a troca de um presidente."

Feres destaca, entretanto, que o candidato republicano é uma figura "mais específica", que poderia ser comparada, talvez, com o deputado brasileiro Jair Bolsonaro, e que conseguiu, inclusive, afastar parte do próprio partido e do eleitorado evangélico norte-americano. 

"De maneira tradicional, [durante a campanha eleitoral] os partidos todos tendem a se mover em direção ao centro. Se você fica à direita ou à esquerda, você perde a eleição. O Trump optou por radicalizar", explica Feres. "O Bernie Sanders é menos radical de esquerda do que o Trump de direita."

O cientista política acredita que Hillary trava uma campanha contra ela mesma, e classifica o desempenho de Trump como "pífio". "Eu acho que ela vai ganhar. O escândalo dos e-mails não tem conteúdo algum". Mas "sempre existe o imprevisível", pondera.

Reginaldo de Moraes, professor de Ciência Política da Unicamp, acredita que esta eleição se coloca um pouco fora do padrão das últimas, quando havia um enfrentamento mais claro entre o partido Democrata e o Republicano, este como uma facção de ultradireita muitas vezes identificada com o Tea Party, que assediou muito de perto, mais recentemente, Barack Obama. Trump aparece como um "ponto fora da curva", que não nasceu no Tea Party, embora guarde algumas semelhanças, enquanto Hillary surge como afirmação da linha mais conservadora do partido Democrata, principalmente em relação à política externa. 

"O observador latino-americano poderia perguntar o seguinte, 'o que eu ganho e o que eu perco com cada um deles?', nós estamos aí, 'entre Belzebu e Satanás, o inferno ganha sempre'", brinca o professor. "De fato, a tradição na política quando democrata ganha é de melhora para os pobres e mais liberdades, mas isto no plano doméstico. Em compensação, vem agressão no plano externo", completa. 

"Agora, eu acho que o quadro é um pouco mais complexo. O Trump é um personagem absolutamente imprevisível, que encontra pela frente alguém absolutamente previsível, que já mostrou muitas vezes qual é a política para o exterior, é uma guerreira da Guerra Fria ressuscitada", esclarece Moraes. "Hillary e Obama derrubaram mais governos que o Bush com todo o aparato dele."

Na América Latina, acredita Moraes, o que poderíamos esperar da candidata democrata é "muita ofensiva". "Estão tentando desagregar a integração da América do Sul, para o fazer de novo quintal dos Estados Unidos."

Trump, contudo, também poderia ser um "risco". "Ninguém pode saber o que sai daquela cabeça, a não ser o topete. O presidente dos Estados Unidos tem um botão vermelho, um maluco com um botão vermelho... Só que Hillary não é nada melhor, talvez para os imigrantes, para quem Trump é uma ameaça terrível."

Moraes destaca que apenas o fato de Trump comentar sobre aceitar ou não o resultado das urnas já mobilizou integrantes de milícias armadas, que existem em centenas nos EUA. "Se ele ganha, sabe-se lá o que acontece dentro dos Estados Unidos. Se Hillary ganha, sabemos o que vem", diz o professor. "Ela é uma 'falconesa' absolutamente sanguinária."

Para o professor, é impossível prever o resultado desta eleição norte-americana. A escolha mais conservadora dos norte-americanos seria Hillary. A desagregação provocada pela desindustrialização, contudo, com a parcela de trabalhadores destruídos pela migração de empresas, pode render votos a Trump, que discursa para este público, em um fenômeno talvez parecido com o resultado do Brexit. Moraes aposta, contudo, que os eleitores devem ser conservadores e escolher "mais do mesmo". 

>> Hillary aparece 5 pontos percentuais à frente de Trump, diz pesquisa