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Povo grego está 'confuso' em relação a Alexis Tsipras

Da Grécia, especialista fala com exclusividade ao 'JB' sobre clima político e social

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Ao aceitar as propostas de reformas econômicas votadas pelo Parlamento, Alexis Tsipras "golpeou o povo grego", que agora está confuso em relação a seu chefe de governo. O primeiro-ministro da Grécia foi eleito sob "enorme legitimidade", com a promessa de que poderia acabar com a austeridade e se manter na zona do euro. O pesquisador em pensamento político Aldo Sauda concedeu entrevista ao Jornal do Brasil diretamente de Atenas e comentou a respeito do clima político e social que envolve o país. 

"Tsipras foi eleito com base em uma mentira", diz Aldo, que é pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e está na Grécia desde que o referendo foi convocado. Ele destaca que não é possível manter o país na zona do euro sem aceitar as medidas de austeridade, o que está se tornando realidade após o Parlamento grego aprovar as reformas econômicas pedidas pelos credores. 

"Tsipras construiu uma enorme legitimidade e é visto como um homem que veio do povo. As pessoas ainda não entenderam muito bem o que está acontecendo." Ele diz que a crise no país não salta aos olhos, mas que sente os problemas ao conversar com a população. 

"A Grécia ainda é um país 'europeu'. Não há níveis de pobreza sul-americanos. Lógico, há gente pedindo dinheiro nas ruas e algumas lojas fechadas, mas a crise se expressa na forma de desesperança, as pessoas se sentem perdidas".

Pesquisa divulgada pelo jornal grego "To Vima" no último dia 14, dois dias antes da votação no Parlamento, apontou que 51,5% da população do país diziam acreditar que o acordo firmado por Tsipras com os credores europeus é positivo para o país. De acordo com o levantamento, 72% dos entrevistados disseram "não ver alternativa" a não ser um acordo com os credores, enquanto 58,8% tinham uma visão positiva do chefe de governo.

Em entrevista à televisão pública ERT, após a reunião com os credores, o próprio Tsipras disse não acreditar no acordo que havia assinado, mas que o aceitou “para evitar o desastre do país”.

Aldo Sauda diz perceber que opiniões favoráveis à saída da Grécia da zona do euro aparecem mais entre os jovens e as classes trabalhadoras. Ele defende que o país deve deixar a moeda se quiser voltar a ter um crescimento econômico, mas que isto envolveria medidas como a expropriação de salários e pensões ou estatização de bancos e empresas ligadas ao setor naval, que iriam exigir de Tsipras "um nível de enfrentamento e grau de compreensão que ele não tinha".

Ainda na mesma entrevista à TV grega, Tsipras afirmou que uma nova moeda, decorrente da falência e colapso do sistema bancário, "seria drasticamente desvalorizada por não haver reservas que a suportassem", e ilustrou: "Um pensionista que recebe 800 euros passaria a ter 800 dracmas que lhe dariam apenas para três dias e não para um mês".

O acordo assinado pelo primeiro-ministro ignorou o resultado do referendo realizado no último dia 5 de julho, que teve vitória do "não" às reformas econômicas com 61,31% dos votos, opção que ele mesmo apoiou.

"Tsipras 'deu um giro' à esquerda quando convocou o referendo, mas quando quando notou o que fez, deu um giro à direita. Este 'zigue-zague' político está ligado à ideia que ele acreditava, de que era possível reformar a União Europeia (UE) e acabar com a austeridade sem romper com o euro", comenta Aldo, que também critica o bloco. "[A União Europeia se coloca] acima da política, rebaixando a democracia grega em específico, mas também a democracia em geral como algo secundário às medidas de reforma econômica."

Aldo Sauda pesquisa o pensamento político contemporâneo e acompanhou a formação do Syriza. Ele avalia que a Grécia está no início de um processo de reação a mais de 30 anos de políticas neoliberais. "O Syriza tem base em um movimento chamado 'eurocomunismo', que acredita que é possível reformar as instituições sem rupturas, e Tsipras levou essa ideia para a União Europeia." 

Produzindo conteúdo para um blog, chamado Convergência, que pode ser acessado clicando aqui, durante sua estadia na Grécia, ele deu outros detalhes sobre o que tem visto no país: "É muito difícil encontrar uma pessoa com menos de 25 anos de idade que já tenha trabalhado. Quando têm emprego, é temporário." O pesquisador também disse que há uma forte inclinação pela imigração para outros países como Alemanha, Inglaterra ou Suíça. Entretanto, o pensamento geral, de acordo com sua visão, é de que o povo grego acredita no primeiro-ministro, assim como também apontou a pesquisa publicada pelo jornal "To Vima". 

*Do programa de estágio do JB