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De olho na história, EUA e Cuba 'encerram' Guerra Fria

Países anunciaram retomada de relações após mais de 50 anos

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No dia 10 de dezembro de 2013, os presidentes de Cuba, Raúl Castro, e Estados Unidos, Barack Obama, se cumprimentaram com um aperto de mão durante uma cerimônia em homenagem ao recém-falecido Nelson Mandela na África do Sul. "Histórico" foi apenas uma das palavras usadas na época para definir o gesto. Mal sabia o mundo o que aconteceria um ano e sete dias depois.

    No último dia 17, em um discurso simultâneo, os dois líderes anunciaram a retomada das relações diplomáticas entre Washington e Havana, encerrando 53 anos de hostilidades e o último capítulo da Guerra Fria.

    Fazendo questão de dizer, em espanhol, que "todos somos americanos", Obama ainda confirmou a retirada de Cuba da lista de países que apoiam o terrorismo, a suavização de restrições a viagens e remessas de dinheiro e a liberação de transações financeiras e comerciais.

    "Essa decisão é muito importante. Acaba com um anacronismo de mais de meio século", diz o escritor Fernando Morais, autor de "A Ilha", livro-reportagem sobre a Cuba de Fidel Castro. As negociações duraram 18 meses e envolveram também a libertação do norte-americano Alan Gross, preso pelo regime comunista por espionagem, e de três dos cinco "heróis cubanos": Gerardo Hernández, Ramón Labaniño e Antonio Guerrero.

    O histórico acordo teve a decisiva mediação do Canadá e do papa Francisco, ambos saudados por Obama e Castro em seus discursos.

    Em novembro, o Vaticano até recebeu uma reunião entre delegações norte-americana e cubana, e o próprio Pontífice escrevera uma carta aos dois líderes pedindo o fim das hostilidades.

    Com efeitos ainda incertos sobre ambos os países, especialmente Cuba, a reconciliação certamente trará novos ares para a geopolítica regional. "Há muito tempo Cuba não representa uma ameaça aos Estados Unidos. Se analisarmos do ponto de vista continental, é muito bom baixar tensões e lograr o convívio pacífico entre dois governos militaristas que quase levaram o mundo a uma guerra nuclear", afirma o cineasta e professor cubano Antonio Molina, que vive no Brasil desde 1997.

    Contudo, embora tenha sido elogiada do norte ao sul das Américas, a reaproximação também decepcionou muitos por não tocar em um ponto fundamental na relação entre os dois países: o embargo econômico imposto pelos EUA à ilha. É bem verdade que Obama prometeu lutar no Congresso para derrubar o bloqueio até 2016, quando ele deixa a Presidência, mas é justamente aí que mora o problema.

    Após as eleições de meio de mandato, em novembro, tanto a Câmara quanto o Senado ficaram nas mãos dos republicanos, que são majoritariamente contrários à retomada das relações com Havana.

    E em 1996, o então mandatário Bill Clinton sancionou uma lei que transfere do chefe de Estado para o Parlamento o poder de encerrar o bloqueio.

    "Mas o empenho do presidente dos EUA em tirar Cuba da lista de países que estimulam o terrorismo é muito positivo. Pode se dizer que Guerra Fria acabou no dia 17, às 15h01, horário de Brasília", ressalta Morais.

    Para Molina, a ilha inteira irá se beneficiar dessa reaproximação, que é um primeiro passo para que ocorram mudanças - lentas e dolorosas - tanto para os cubanos que ficaram em sua terra natal como para os que tentaram a sorte nos Estados Unidos. Como ele diz, é uma forma de olhar para o futuro sem pensar no passado.

    "Essa aproximação servirá para estender uma ponte entre as duas margens do estreito do Caribe. Essa é, sem sombra de dúvidas, uma vitória da humanidade, que tomou partido a favor de Davi contra Golias", finaliza o cineasta. (ANSA)