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Declarações de Papa Francisco atingem pontificados de João Paulo II e Bento XVI

Discurso sobre gays e aborto surpreende e vai de encontro às orientações anteriores da Igreja 

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As últimas declarações do Papa Francisco sobre gays e aborto atingem claramente o pontificado de João Paulo II e de Joseph Raztinger, o Bento XVI. O Pontífice afirmou, na quinta-feira (19), que a Igreja tem o direito de expressar suas opiniões, mas não pode "interferir espiritualmente" nas vidas de gays e lésbicas. Em uma extensa e inédita entrevista, o Papa afirmou que é preciso "acompanhar com misericórdia" os divorciados e homossexuais, e que a Igreja Católica não deve "insistir apenas" em temas como aborto e métodos contraceptivos.

"É necessário sempre considerar a pessoa. Assim, entramos no mistério do homem. Na vida, Deus acompanha as pessoas, e nós devemos acompanhá-las a partir da condição de cada uma: acompanhar com misericórdia", disse Francisco na entrevista, divulgada pelo jornal Civilidade Católica e em mais 16 publicações da Companhia de Jesus em todo o mundo. 

Segundo o Papa Francisco, "não podemos insistir somente em questões ligadas ao aborto, matrimônio homossexual e o uso de métodos contraceptivos. Isso não é possível. Eu não falei muito sobre essas coisas e acabei sendo cobrado por isso", contou.

"Uma pastoral missionária não deve ser obcecada pela transmissão desarticulada de várias doutrinas a serem impostas com insistência", afirmou Francisco. 

Ao defender que a Igreja deve se afastar da "obsessão" por temas como a homossexualidade e o aborto, Papa Francisco lança um discurso distante dos defendidos por João Paulo II e Bento XVI, que sempre defenderam claramente o casamento tradicional. Durante o pontificado de Bento XVI, documento eclesiástico afirmava que na união homossexual estavam totalmente ausentes os elementos biológicos e antropológicos do matrimônio e da família.

Já durante o pontificado de João Paulo II, a Carta Homosexualitatis problema afirmava: "A particular inclinação da pessoa homossexual, apesar de não ser em si mesma um pecado, constitui todavia uma tendência, mais ou menos acentuada, para um comportamento intrinsecamente mau do ponto de vista moral. Por este motivo, a própria inclinação deve ser considerada como objetivamente desordenada."

Francisco falou sobre gays na JMJ

O Papa também disse que, quando era arcebispo de Buenos Aires, recebia cartas de gays que diziam se sentir como "feridas sociais, porque a Igreja sempre os condenou". Em julho, quando voltava de sua viagem ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), Francisco defendeu que os homossexuais não devem ser julgados.

Sobre o aborto, Francisco disse que, "quando uma mulher se arrepende enorme e sinceramente" pelo que fez, as pessoas devem recebê-la com misericórdia. "O confessionário não é uma sala de tortura, mas sim, um lugar de misericórdia no qual o Senhor nos estimula a fazer o melhor que podemos. Penso inclusive na situação de uma mulher cujo casamento fracassou e que abortou. Ela, em seguida, casou-se e tive cinco filhos. O aborto pesa muito sobre ela, que é sinceramente arrependida. Ela quer seguir em frente na vida cristã. O que deve fazer o confessor?", disse o Papa. 

"Essa é a grandiosidade da confissão, a oportunidade de avaliar caso por caso, de poder discernir o que é melhor para cada pessoa que procura Deus e sua graça", defendeu.    

Francisco disse também que a Igreja precisa de mulheres "que tomem decisões importantes", mas que teme "um 'machismo de saias'". "Maria, uma mulher, é mais importante que os bispos", ressaltou. 

A entrevista do Papa foi dada na residência de Santa Marta, no Vaticano, em três ocasiões, nos dias 19, 23 e 26 de agosto. Em 29 páginas, o Pontífice também exibiu de modo inédito sua identidade, como preferências culturais e artísticas.