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Preso em greve de fome relata situação desesperadora em Guantánamo

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O jornal americano The New York Times publicou neste domingo o relato de um iemenita preso no Campo de Detenção da Baía de Guantánamo - prisão controlada pelos Estados Unidos em território cubano - sobre as condições que os detidos em greve de fome no local enfrentam atualmente. 

"Um homem aqui pesa apenas 35 kg. Outro, 44 kg. A última vez que soube, eu pesava 60 kg, mas isso foi há um mês", escreveu Samir Naji al Hasan Moqbel. "Eu estou em greve de fome desde o dia 10 de fevereiro e perdi bem mais de 13 kg. Eu não vou comer até que eles restaurem a minha dignidade".

Moqbel, 35 anos, afirma que está preso em Guantánamo há 11 anos sem nunca ter ido a julgamento e que sequer foram apresentadas acusações formais contra ele por qualquer crime. "Eu poderia estar em casa há anos - ninguém seriamente acha que eu sou uma ameaça -, mas eu ainda estou aqui. Há anos os militares disseram que eu era um 'guarda' de Osama bin Laden, mas isso não fazia sentido, como algo tirado de filmes americanos que eu costumava assistir". 

O iemenita disse que viajou para o Afeganistão no início dos anos 2000 após ouvir de um amigo de infância que poderia melhorar sua condição de vida no país. Ele diz que descobriu que não havia empregos apenas quando chegou ali, mas que não tinham dinheiro para voltar para casa. Quando os Estados Unidos invadiram o Afeganistão em 2001, ele conseguiu ir para o Paquistão. "Os paquistaneses me prenderam quando eu pedi para ver alguém da embaixada do Iêmen. Eu fui então enviado para Kandahar (no Paquistão), e colocado no primeiro avião para Gitmo (termo que se refere a Guantánamo)". 

O iemenita relatou que no dia 15 de março, quando se encontrava doente no hospital da prisão e ainda se recusando a se alimentar, oito homens das Forças de Reação Extrema (ERF, na sigla em inglês) entraram no local, o amarraram a uma cama e o forçaram a se alimentar através de uma sonda. "Eu passei 26 horas neste estado, amarrado a uma cama. Durante este tempo, não me permitiram ir ao banheiro. Eles inseriram um catéter, o que foi doloroso, degradante e desnecessário", descreveu o detento. "Eu não recebi permissão nem para rezar". 

O governo dos Estados Unidos reconhece que atualmente em Guantánamo há 43 prisioneiros em greve de fome, sendo que 11 estão sendo alimentados por uma sonda. No entanto,advogados dos presos e a agência pública de Cuba Granma afirmam que são ao menos 130 detentos que se recusam a se alimentar. Os detentos fazem greve desde fevereiro, quando, segundo afirmam, seus alcorões foram examinados e profanados.

Moqbel relata que é forçado a se alimentar duas vezes por dia, em horários não determinados, e que tem suas pernas e cabeça amarradas a uma cadeira para que a sonda de alimentação seja introjetada nele. "Algumas vezes eles vêm à noite, as 23h, quando eu estou dormindo". 

No relato, o homem diz que, "ainda que seja totalmente desnecessário", assinará quaisquer medidas de segurança que precisar para ser solto e que deseja retornar para o seu país para rever seus familiares e começar sua própria família. 

"A única razão para eu estar aqui é que o presidente (Barack) Obama se recusa a enviar os detentos de volta para o Iêmen. Eu sou um ser humano, não um passaporte, e mereço ser tratado como um", escreveu Moqbel. "Eu não quero morrer aqui, mas até que o presidente (Obama) e o presidente iemenita façam algo, este é o risco que eu corro todos os dias". 


Durante sua primeira campanha eleitoral à presidência dos Estados Unidos, Barack Obama prometeu rever a situação do presídio e fechá-lo, mas o local segue aberto. A prisão abriga acusados de terrorismo, inclusive os envolvidos nos ataques de 11 de setembro de 2001. O Iêmen passou por uma revolução em 2011 que culminou com a saída do poder de Ali Abdullah Saleh, aliado dos EUA na luta contra o terrorismo, no ano seguinte. 

"A situação é desesperadora agora. Todos os detidos aqui estão sofrendo profundamente. Pelo menos 40 pessoas aqui estão em greve de fome. Pessoas desmaiam de exaustão todos os dias. Eu vomitei sangue". 

"E não há fim em vista para o nosso aprisionamento. Recusar a nos alimentarmos e arriscar a morte todos os dias é a escolha que fizemos", disse. "Eu só espero que por causa da dor que estamos sofrendo, os olhos do mundo se voltaram para Guantánamo antes que seja muito tarde", concluiu o iemenita.