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Nova Legião Urbana? Conheça a jovem banda Selvagens à Procura de Lei

Coluna conversa com o grupo cearense que carrega críticas políticas em seu recém-lançado CD

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Em poucas horas, o Brasil disputará a final da Copa das Confederações contra a Espanha, no Maracanã, e, há algumas horas, manifestantes se reúnem em vários pontos do Rio de Janeiro em mais um protesto da onda de insatisfação que toma conta do país e culminou com a série de manifestações que começou há cerca de um mês. Na noite de ontem (29), um show em homenagem a Renato Russo e ao Legião Urbana levou 45 mil pessoas ao estádio Mané Garrincha, em Brasília, tendo como ponto alto da noite uma performance em holograma do ídolo da geração dos anos 80, que ansiava por mudanças no país. Com frequência, as músicas de Renato são usadas para impulsionar o movimento atual – mas, provavelmente, só enquanto esta juventude não conhecer as canções da banda pernambucana Selvagens à Procura de Lei.

O nome do quarteto nascido há quatro anos em Fortaleza é sugestivo e o single ‘Brasileiro’, o primeiro do CD de estreia batizado com o nome da banda, recém-lançado pela Universal Music, não poderia se encaixar melhor com o momento e esbraveja no refrão: “Porque eu sou brasileiro/ Meu ano só começa quando passa fevereiro/ Pobre ou rico ou classe média/ Levante a mão de quem já sentiu puxar a sua rédea”. “Realmente parece obra de algo superior, ao qual devemos agradecer por nossa música se encaixar tão bem com este momento do país. O que a gente tenta passar é o que a galera nova, de 20 e poucos anos, quer falar”, nos conta Nicholas Magalhães, baterista do Selvagens (que ainda é formado pelo guitarristas e vocalistas Rafael Martins e Gabriel Aragão e pelo baixista Caio Evangelista), em um papo com a coluna.

Dizer que eles são ‘o novo Legião Urbana’ não seria errado, a banda, inclusive, é uma das maiores influências do grupo, que também se apoia na música brasileira dos anos 70 - ironicamente, décadas marcantes nas quais nenhum deles era nascido ainda.

E, sim, eles foram às ruas, atravessaram a Avenida Paulista com mais 65 mil vozes e se sentiram abraçados por São Paulo, novo lar dos meninos desde abril deste ano.

Heloisa Tolipan: Para começar, por que o nome Selvagens à Procura de Lei?

Nicholas Magalhães: O Gabriel sempre curtiu muito Renato Russo, Cazuza e Paralamas do Sucesso. Ele adora ‘Tempo perdido’, do Legião Urbana, especialmente a parte em que o Renato grita “Selvaaaaageeem” e também o CD ‘Selvagem’, do Paralamas. De cara, pensamos em batizar a banda de Selvagens, mas descobrimos que já havia um grupo dos anos 80 com esse nome.

Um dia ele estava em uma aula de filosofia na faculdade e o professor disse que, apesar da evolução da humanidade, da tecnologia e globalização, os homens ainda são selvagens à procura de algo maior, algum tipo de lei. Na hora ele teve esse estalo. É legal porque o nome da banda tem uma abrangência muito grande, não se limita a um significado.

HT: Vocês são muito comparados à geração musical dos anos 80, quando alguns de vocês nem eram nascidos ainda...

Nicholas: Eu nasci em 1991 (risos). Somos muito comparados aos anos 80 e nós adoramos a música dessa época, mas acho que o Selvagens vai um pouco além disso. Os anos 70 também são muito fortes em nós. As influências da música brasileira chegaram com força depois do nosso primeiro disco, que lançamos de forma independente em 2010. O nosso som soava indie, por mais que nós não quiséssemos. A música brasileira caiu como uma luva para nos ajudar a mudar isso. Nós nos juntávamos para ouvir música no meu carro, CDs de Tim Maia, Novos Baianos, Clube da Esquina, Belchior, Zé Ramalho, Gilberto Gil, Caetano Veloso, além de Beatles Led Zeppelin, Pink Floyd... Música é música. O que é bom a gente escuta. Agora, por exemplo, estamos ouvindo muito o novo CD do Daft Punk, ‘Random Acces Memories’.

HT: Nas letras das músicas, vocês criticam a inércia política dos brasileiros, nos moldes do Legião Urbana. Vocês acham que,agora, entre tantas manifestações e mudanças geradas a partir delas, o ‘gigante’ realmente acordou?

Nicholas: O ‘gigante’ acordou mesmo. Ficamos felizes com o que o destino está nos proporcionando, aliás. A música ‘Brasileiro’, nosso primeiro single desse CD, foi escrita como um desabafo e caiu como uma luva neste momento em que o nosso disco está sendo lançado, nesta nova fase política do país, apesar de ter sido gravada há um ano. O Brasil está vivendo esse momento de mudança, de aumento do esclarecimento do povo e não podemos deixar a peteca cair.

A escrita das músicas dos anos 80 nos influencia muito, eles tinham que mexer com uma geração, ser a boca daquele povo. Lançar ‘Brasileiro’ agora e ser uma banda jovem que está surgindo, todos na casa dos 20 e poucos anos, nos dá a consciência do que está acontecendo. Realmente parece obra de algo superior, ao qual devemos agradecer por nossa música se encaixar tão bem com este momento do país.

HT: Vocês foram a alguma manifestação?

Nicholas: Fomos no dia 17 de junho, em São Paulo. Foi demais. Divulgaram que foram 65 mil pessoas e a gente enxergava muito mais do que isso. Era uma energia absurda, uma megalópole inteira unida nas ruas, a cidade parando. A gente voltou para casa de metrô com as pessoas cantando o hino. É incrível ver o país se movimentando por algo maior, sem se preocupar se o cara ao seu lado vai roubar seu celular, porque todo mundo ali estava com a mesma energia, o mesmo foco.

HT: Quais são as causas que os levaram à rua?

Nicholas: Este momento é muito complicado. O Brasil precisa lutar pela saúde, educação, infraestrutura, segurança e gasta milhões montando estádios de futebol, mesmo enquanto o país está vivendo tudo isso. O futebol do Brasil é o melhor do mundo, mas os políticos não cumpriram o que deveriam ter cumprido com a sociedade. A classe política em si, que deveria cuidar do país, não está trabalhando para isso. Na verdade, está atrapalhando a vida do povo.

HT: E qual música de vocês pode ser a trilha sonora deste movimento?

Nicholas: ‘Brasileiro’, com certeza. Nosso disco é muito voltado para a juventude. O que a gente tenta passar é o que a galera nova, de 20 e poucos anos, quer falar. 

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*Em colaboração para a Coluna Heloisa Tolipan