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Madonna: em quatro anos, a triste burocratização da rainha do pop

Show do 'MDNA Tour', ontem (2), no Rio, revela arestas a serem aparadas na atual fase da cantora

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Inegável: qualquer pessoa, seja fã ou não, que esteve presente à passagem da 'Sticky & Sweet Tour' pelo Maracanã, em 2008, e que tenha visto o show de Madonna, ontem (2), em sua 'MDNA Tour', no Parque dos Atletas, sentiu, de forma considerável, a diferença de tom entre a Madonna dos dias de hoje e aquela de quatro anos atrás. Enquanto aquela se fazia muito mais presente no palco, em uma jornada dançante e estritamente pop (valorizando, inclusive, seus maiores hits da carreira), esta é mais conceito do que música, mais projeção em telões do que voz, mais honra e glória do que a firma em ação.

Não espere aqui um passo a passo do que rolou durante os quase 120 minutos de apresentação de Madonna: a 'MDNA Tour' não é, de longe, a melhor fase da rainha do pop, que, recentemente, tem no currículo a genial turnê Confessions (um tapa na cara de qualquer saudosista dos 80's), além, claro da 'Sticky & Sweet', uma versão realmente doce e eficiente da cantora. Ontem, vimos ali, diante de 67 mil pessoas, vocais prejudicados (incluindo as bases de playback), estrutura de proporções babilônicas, teatralidade de primeira (como uma precursora deve proporcionar) e pouquíssima musicalidade. Os maiores hits da história da diva, quando não transformados em versões constrangedoras (como 'Like a Virgin'), foram limados da performance (como 'La isla bonita', 'Material girl', '4 Minutes', 'Music' e 'Ray of Light'). A exceção fica por conta de 'Express yourself' e a doce provocação a Lady Gaga, com um trecho de 'Born this way' em seguida, e 'Like a Prayer', executada com o afinco de uma rainha.

Talvez o grande resumo da preguiça em torno do show (preguiça não da plateia, mas sim da protagonista, hoje uma senhora de 54 anos que nada mais tem a provar para ninguém) possa ser descrito com o 'grand finale', embalado pela qualquer-coisa 'Celebration', em que Madonna encarna uma DJ fake. Um desfecho irrelevante para uma noite que deveria ultrapassar qualquer limite de relevância.

Mas, afinal de contas, onde reside o erro maior da 'MDNA Tour'? Sem dúvida, justamente na impressão de que Madonna ainda tenta, sobre o palco, de forma indolente, provar alguma coisa. O prestígio dado às canções do álbum mais recente em detrimento de sua história é prova desta dedicação protocolar à contemporaneidade.

E não, Madonna nada mais tem a provar. Loucos são aqueles que ainda discutem sua majestade e exercem comparações com divas recentes da música pop. O que está em questão não é uma disputa. Aliás, não há disputa. Quando Madonna entra em cena, é imprescindível jogar o foco apenas sobre ela, sem milhares de recursos secundários de cenografia, iluminação e corpo de baile dividindo (e até roubando) atenções. Mas, simultaneamente, é preciso que ela saiba o peso simbólico de uma luz exclusiva sobre si. 

Madonna deve fazer jus a ideia universal de que ela é única. Madonna precisa fugir da prisão burocrática que a levou a esta turnê ordinária. Com 'Confessions' e 'Sticky & Sweet' pudemos ver uma Madonna no século 21 sem soar como uma mortal que roda o mundo fazendo valer os centavos que ganha. O que terá acontecido de quatro anos para cá?

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