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Crítica: 'Pietá' - Festival do Rio 2012

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Kang-Do é uma espécie de cobrador de dívidas, empregado por agiotas que, para conseguir de volta o dinheiro emprestado de pessoas que não tem a mínima condição de devolvê-lo, "causa" acidentes, para que o seguro pague a dívida contraída.

Uma das primeiras coisas que me passou pela cabeça assistindo a Pietá, novo filme de Kim Ki-Duk e Leão de Ouro em Veneza esse ano, foi a semelhança, de alguma forma, com dois outros grandes filmes que surgiram esse ano: A Febre do Rato, do brasileiro Cláudio Assis, e Cosmopolis, de David Cronenberg. Um em Recife, outro em uma Nova Iorque em um futuro não tão distante. E o último, na Coréia do Sul.

Em Pietá, como nos dois outros filmes citados, a questão principal que carrega o filme parece ser a de uma revolta e impossibilidade total (e principalmente falta de desejo) de se inserir em um sistema completamente falido de um capitalismo globalizado e desumanizado, em que o destino da vida dos habitantes de nosso pequeno e flutuante planeta está nas mãos de instituições fictícias, que lidam com dinheiro fictício.

Dinheiro fictício, dívidas contraídas, impossibilidade de pagar. E, portanto, castigo. Os castigados, em Pietá, são justamente os que, em uma situação de miséria ou desespero, acreditam que através de empréstimos imediatos irão melhorar suas vidas, resolver seus problemas. Kim Ki-Duk trabalha no micro sua crítica para o macro de uma sociedade em crise, graças às suas insanas instituições financeiras.

E Kang-Do, nosso anti-herói, é o filho dessa sociedade, criatura amoral, que age sem pensar e sem sentir, até precisar se confrontar com sua história, com a chegada de uma mulher que diz ser sua mãe. A sua violência extrema parece se espalhar por cada entranha do filme, os personagens que cruzam seu caminho, a câmera tensa.

Pietá tem a força que tem justamente por ser um filme do seu tempo, um filme urgente, que emerge como se vê-lo fosse necessário.

E Kim Ki-Duk, assim como Cronenberg e Cláudio Assis, parece estar, como diz Eduardo Galeano, com um olho no microscópio e outro no telescópio. É preciso olhar para o todo, mas também para as pequenas coisas, cada uma delas. Com essa visão aguçada, o diretor coreano nos apresenta mais um grande filme.

Cotação: (****) Excelente