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Maracanã: outras tentativas de concessão fracassaram, afirma especialista

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Confirmado pelo Secretário estadual da Casa Civil, Regis Fichner, nesta segunda-feira (22), o edital de concessão do Maracanã é tratado pelo governo do estado como fato consumado. No entanto, a história mostra que o projeto ainda não pode ser considerado definitivo. 

Esta é a mensagem que tem sido passada pelo pesquisador  do Observatório das Metrópoles Erick Omena (Ippur/UFRJ) em palestras e artigos. Estudioso da história do Maracanã e do impacto dos megaeventos na cidade do Rio de Janeiro, ele lembra que esta não é a primeira tentativa de privatização do estádio em seus 62 anos de vida. 

Segundo a pesquisa de Omena, já houve ao menos outras duas propostas nesse sentido, levadas à frente pelo poder público e noticiadas na imprensa da época: 

“Em meados da década de 1990 tivemos a primeira tentativa anunciada nos órgãos de imprensa. Planejavam a demolição do Estádio Célio de Barros e do Parque Aquático Julio Delamare para a construção de um shopping center”, afirma, lembrando de um detalhe inusitado. “Falava-se inclusive em transformar o espaço da antiga geral em um velódromo”. 

Omena relata que essa investida coincidia com “a primeira grande ofensiva neoliberal no poder”, em um “contexto de privatizações e diminuição do Estado”. O fracasso da candidatura olímpica, no entanto, fez com que a ideia fosse momentaneamente abandonada: 

“A tentativa de privatização se arrastou até 1997, mas não foi à frente. Estava bastante associada à candidatura do Rio aos Jogos Olímpicos de 2004 e inclusive fazia parte das propostas que estariam na candidatura. Com a derrota, o projeto perdeu força”, explica.   

A segunda tentativa de dar o Maracanã à iniciativa privada veio após o Pan-Americano de 2007, segundo o pesquisador, e já correspondia ao mesmo grupo político que comanda o estado do Rio atualmente:

“O então secretário Eduardo Paes, hoje prefeito reeleito do Rio, anunciou a intenção de se privatizar e remodelar o Maracanã. Esse já é um outro contexto, onde o Maracanã já tinha passado por duas grandes reformas”. 

A essa altura, o poder público já havia investido aproximadamente R$ 410 milhões dos R$ 1,279 bilhão gastos no estádio até o momento. Por conta da impopularidade da medida, o plano foi novamente abandonado até recentemente, quando o governo Sérgio Cabral trouxe a ideia de volta. Omena demonstra especial preocupação com a forma como a questão está sendo discutida: 

“Os megaeventos viraram uma forma de levar à frente projetos que estavam engavetados não ter grande popularidade. Se antes não eram implementados por falta de apoio popular, passam a ganhar mais força por estarem vinculados aos megaeventos. É um discurso que legitima tudo com base na Copa e na Olimpíada, algo que meche com o orgulho nacional”, critica. 

Mas, para Erick Omena, ainda há tempo para mudar a situação. Ele lembra que em 1997 o governo chegou a divulgar a informação de que o vencedor da licitação já havia sido escolhido, mas desistiu da ideia: 

“Já fomos muito mais longe nesse processo antes. Para barrá-lo, é preciso que a sociedade se mobilize e lute contra isso”, alerta. 

Elitização do estádio 

Em sua pesquisa, Omena também mostra que, ao longo dos últimos anos, o preço dos ingressos elitizou fortemente o público do Maracanã. Ele fez uma relação entre o valor do salário mínimo e o preço do ingresso mais barato do estádio desde sua inauguração, em 1950, até o fechamento para as obras da Copa, em 2010. Segundo ele, a relação “nunca passou de 2,3% do salário mínimo até subir abruptamente depois do Pan e chegar, em 2010, a 6%. Em determinados momentos ela chegou a ser de menos de 0,5%”, explica. 

Ele destaca que a porcentagem subiu mesmo com a grande valorização do salário mínimo durante o governo Lula. Nos valores de hoje, o ingresso teria subido de R$ 11,40 (2,3%) para R$ 60 (6%). “É clara a elitização do Maracanã e dos demais estádios do Brasil”, afirma. 

“O brasileiro é mundialmente conhecido por ser um povo muito bom no futebol e também por ter uma forma de torcer acalorada, com muita música, batucada e participação do público. O que está acontecendo é uma violência não só com a cultura futebolística local, mas também com a história construída ao longo de todas essas décadas”, conclui.