ASSINE
search button

Medidas do governo indicam disposição em fazer ajuste fiscal, diz economista

Corte de despesas e criação de receitas depende de aprovação do Congresso

Compartilhar

O economista Mauro Rochlin, professor dos MBAs de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), destaca que o anúncio do governo de que pretende promover novas receitas mas também cortar despesas demonstra uma disposição em promover de fato o ajuste fiscal. O aumento de impostos, contudo, torna o setor privado menos competitivo, o que pode prejudicar também o mercado de trabalho, alerta o professor. 

O governo anunciou nesta segunda-feira (14) um ajuste orçamentário de cerca de R$ 64,9 bilhões, sendo R$ 26 bilhões em cortes e R$ 28,4 bilhões em novas receitas, como elevação do Imposto de Renda sobre o ganho de capital das pessoas físicas e a recriação da CPMF no valor de 0,2% para cada movimentação financeira, para um período de quatro anos. O objetivo é viabilizar superávit primário (economia para pagar os juros da dívida) de 0,7% do PIB para 2016.

>> Governo suspende concursos e adia reajuste de servidores

>> Levy anuncia volta da CPMF para cobrir rombo da Previdência

Rochlin acredita que o anúncio apresenta dois aspectos, um positivo e outro negativo. O primeiro é devido à disposição do governo de fazer um ajuste, de fato, e usar para isto não só um aumento de receitas mas também o corte de despesas obrigatórias. "O medo era de que [o ajuste] fosse feito apenas do lado da receita. A disposição de fazer do lado da despesa, mexendo com funcionalismo, inclusive, cortando na própria carne, mostra a disposição de fazer ajuste, o que é fundamental."

O aspecto negativo, explica Rochlin, é que um aumento de impostos, uma carga tributária mais pesada, torna o setor privado menos competitivo, o que, de alguma maneira, pode prejudicar também o mercado de trabalho. O professor ressalta que a teoria econômica mostra que em momentos de recessão econômica os ajustes têm que ser feitos nas despesas, pois ajustes em receitas podem comprometer o crescimento econômico.

Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, presidente do Sistema Firjan, disse em nota divulgada pela assessoria que o pacote de medidas apresenta o "pecado capital de sempre: não ataca a causa dos desequilíbrios fiscais que vêm deteriorando a confiança das empresas e das famílias do país". 

"Há anos gasta-se mais do que se arrecada, criando-se mais impostos para cobrir o buraco das contas públicas. Este é o ponto: não há mais espaço para novos aumentos da carga tributária. Aliás, elevar impostos em um momento de grave recessão como o que estamos vivendo aprofundará o problema fiscal, simplesmente porque ninguém, nem pessoas nem empresas, tem atualmente condições de pagar mais tributos", destacou Vieira.

O Sistema Firjan também se posicionou contra o corte de orçamento do Sistema S, apontando que a medida inviabiliza o Senai, o Sesi e outras instituições. "Lamentavelmente, o país perde mais uma oportunidade de retomar o rumo do crescimento, e de construir uma aliança de toda a sociedade brasileira", completou Vieira.

Alencar Burti, presidenta da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), se manifestou por meio de nota, em crítica ao aumento e recriação de imposto. "Repetir o que foi feito no passado não vai fazer o país avançar. Tivemos a experiência de criação da CPMF provisória e essa experiência não foi boa. Do ponto de vista econômico, o aumento de imposto não vai resolver a questão porque vai drenar dinheiro das empresas e dos consumidores, agravar a recessão e afetar negativamente na arrecadação. Esse não é o caminho."

A Febraban, por sua vez, destacou em nota que as medidas anunciadas refletem o  compromisso do governo em promover o equilíbrio fiscal, "condição indispensável para abrir caminho a retomada do desejado crescimento da economia do país". Para a instituição, o corte de R$ 26 bilhões deve restabelecer a confiança dos agentes econômicos e retomar investimentos. "A Febraban compreende a necessidade de complementar o corte das despesas com medidas temporárias de aumento de tributos", completou.

Aprovação no Congresso

A proposta de ajuste ainda precisa da aprovação do Congresso. O presidente do Senado, Renan Calheiros, afirmou que as medidas anunciadas contêm cortes significativos. Ele afirmou que o Congresso vai analisar todas as propostas e que pretende aperfeiçoá-las. Avisou ainda que o primeiro passo tem de ser dado pelo Executivo, que precisa cumprir os cortes na máquina pública e a economia de gastos prometidos.

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, por sua vez, disse ser “muito pouco provável” que o Congresso aprove o retorno da CPMF. “O Executivo está com base muito frágil aqui. Além de estar com uma base muito frágil, o tema por si só já é polêmico.”

No final de agosto, o Executivo entregou ao Congresso Nacional a proposta orçamentária para 2016 com previsão de déficit de R$ 30,5 bilhões. Uma semana depois, a agência de classificação de risco Standard & Poor's rebaixou a nota de crédito do Brasil de BBB- para BB+, retirando o grau de investimento do país.

A presidenta Dilma Rousseff se reuniu com ministros no final de semana para definir os cortes, e o assunto foi discutido também na reunião de coordenação política desta segunda-feira, com a presença de 14 ministros.