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Síntese da Conjuntura: perspectivas trágicas

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A Confederação Nacional do Comércio (CNC), em seu boletim “Síntese da Conjuntura”, elaborado pelo economista e ex-ministro da Fazenda, Ernane Galvêas, faz as análises do atual cenário econômico. Veja abaixo o boletim quinzenal de julho:

A situação econômico-financeira do Governo é insustentável, com um déficit fiscal permanente e uma dívida pública impagável, correspondente a 62,7% do PIB. É possível afirmar que o maior responsável por essa situação é a exótica política de juros altos.

Nessa situação, o Governo não pode continuar gastando mais do que arrecada, malgrado a sufocante carga tributária de quase 38% do PIB, que alimenta o Estado obeso e burocrata. É preciso diminuir o tamanho do Estado, digamos para 30% do PIB. Se, no momento, não for possível reduzir o número de Ministérios (39), é imperioso promover um corte correspondente nas verbas orçamentárias que os sustentam. É óbvio que vários vão morrer de inanição. O efeito é o mesmo.

O descalabro vigora em todos os setores, como parte da irresponsável cultura do desperdício. Do fundo do poço em que nos encontramos, surge o STF com a proposta de aumentar os salários do Judiciário nacional em até 78%. Na Câmara dos Deputados vem a debochada proposta de criação de um anexo imobiliário para abrigar o “Parla-Shopping”. Nas Câmaras Municipais, a criação de cargos de assistentes dos vereadores chega ao absurdo de mais de 20 por 1, como é o caso de São Paulo. Os Municípios do Rio de Janeiro gastam um bilhão de reais por ano para sustentar esses assistentes dos vereadores.

No Congresso Nacional passa o Projeto de Lei que acaba com o fator previdenciário, ameaçando arruinar o Sistema da Previdência Social. Ainda do STF vem a ameaça da implantação da Convenção 158 da OIT, que poderá abrir mais um rombo na economia nacional, desestimulando os já minguados investimentos privados e ameaçando uma trágica elevação dos níveis de desemprego. Não dá para acreditar.

É imperioso que o Congresso, o Judiciário, as classes produtoras e trabalhadores formem uma frente de apoio às propostas do Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para reduzir o tamanho do Estado e “tirar o Brasil do buraco”.

TRAGÉDIA GREGA

Pra que se possa melhor entender o affair grego, é interessante observar os dados abaixo e a comparação entre a Grécia e o Brasil, em 2014: 

Desde a crise financeira mundial de 2007/2008, a situação fiscal da Grécia piorou muito, face à manutenção dos deficitários programas sociais, obrigando o Governo a recorrer à negociação da dívida externa junto ao FMI, ao Banco Europeu e ao Mercado Comum Europeu, trocando a dívida com bancos por créditos oficiais. Por duas vezes, em 2009 e 2010, a Grécia recebeu ajuda no montante total de US$200 bilhões (!) e, em 2011, uma reestruturação da dívida, com alongamento do prazo e substancial desconto, contra a promessa de forte reajuste interno, que jamais ocorreu.

Agora, na iminência de default, volta a Grécia a novas negociações, com pedido de crédito adicional de US$53,5 bilhões – que pode chegar a €82 bilhões - e o compromisso de realizar um superávit primário de 1% do PIB neste ano, subindo até 3,5% em 2018. Na reunião de cúpula de 13 de julho, chegou-se a um acordo unânime e a Grécia terá o prazo de três anos para realizar os ajustes aprovados, sem sair da Zona do Euro. Falta, agora, a aprovação do Parlamento Grego.

O SUSTO DA CHINA

Os meios econômicos já se acomodaram à ideia de que a China não vai continuar crescendo 10% ao ano, mas apenas 7%. O que ninguém esperava é que após um longo período de alta, de 150%, a Bolsa de Xangai desabasse 30%, no mês de junho.

Usando rigorosas medidas heterodoxas de regulação, o Governo conseguiu estancar a fuga de investidores e as cotações voltaram a ter altas espetaculares. No fundo, não é tranquila a situação da China que, ao que tudo indica, chegou ao limite dos investimentos em transportes rodoviários, ferrovias e aeroportos, assim como em programas institucionais. Essa retração trouxe uma queda na demanda do aço e outros produtos siderúrgicos, acarretando a queda de preços das commodities metálicas, assim como de outras matérias primas. A cotação do minério de ferro que chegou a US$150 por tonelada, fechou na última semana a US$42.

A repercussão maior no Brasil da evolução econômica da China pode ser vista na queda de 28% das exportações brasileiras, no período janeiro/maio.

COMÉRCIO INTERNACIONAL

A conjuntura mundial de baixo crescimento tem tido forte reflexo negativo na balança comercial do Brasil. De janeiro a maio deste ano, em comparação com o mesmo período de 2014, as exportações brasileiras caíram 17,1% e as importações 18,9%. A queda nas exportações foi mais acentuada para a China (-28%), Estados Unidos (-7,6%), Argentina (-16,0%) e Holanda (-29,7%).

Respondem pela queda os menores valores nas exportações de soja (-30,4%), minério de ferro (-49,3%), petróleo (-8,2%) e outros.

O ritmo de crescimento econômico da China, nos últimos três anos, caiu de 10% para 7%, com forte repercussão no Brasil, principalmente sobre nossas exportações e particularmente sobre a VALE.

A China é, hoje, o maior parceiro comercial do Brasil, com exportações nossas, de janeiro a maio, de US$13,7 bilhões e importações de US$14,4 bilhões. Em segundo lugar vêm os Estados Unidos, com US$9,7 bilhões de exportações e US$11,8 bilhões de importações. 

ATIVIDADES ECONÔMICAS

Os indicadores da atividade econômica, no segundo trimestre, caminham para seu pior desempenho em 2015. Segundo a FGV, o PIB nacional encolheu 1,1% no período março/maio, em relação aos três meses anteriores. Em 12 meses, até maio, a queda é de 1,2%. Também o FMI prevê um encolhimento de 1,5% em 2015.

Alguns analistas do mercado antecipam um crescimento nulo, em 2016, caso a taxa de juros SELIC continue subindo. Em boa parte, a retração econômica se deve ao fato de ter chegado ao limite o endividamento das famílias, que já alcançou 62,0%; os que estão em atraso chegam a 21,3% e a 7,9% os que não têm condições de pagar.

Indústria

Segundo o IBGE, a produção industrial cresceu 0,6% em maio sobre abril, mas de janeiro a maio acumulou queda de 6,9%, com destaques negativos para Amazonas (-17,3%), Ceará (-9,4%), Bahia (-10,9%), Minas Gerais (-7,4%), Rio de Janeiro (-4,6 %), São Paulo (-8,6%), Paraná (-8,8%), Santa Catarina (-7,4%) e Rio Grande do Sul (-11,5%).

A crise chegou à indústria siderúrgica e, segundo o IABr, nos últimos 12 meses foram demitidos 11.188 empregados, mais 1.387 suspensos em lay-off. Estima-se que até o final do ano a produção tenha queda de 3,4%.

No contexto de queda da indústria automobilística, a produção de motocicletas teve redução de 9,5% no primeiro semestre, o menor nível nos últimos 10 anos. As vendas do setor de higiene pessoal e cosméticos caíram 1%, a primeira queda em 23 anos.

A retração da indústria siderúrgica, inclusive a menor demanda da China, levou a VALE a cortar a produção de minério de ferro em 25 milhões de toneladas, embora mantendo a produção de 340 milhões de toneladas em 2015.

Em maio, o consumo de gás caiu 5,3% ante abril e 5,4% ante maio/15 (Abegás).

Comércio

As vendas do comércio varejista tiveram queda de 0,9% em maio. É o primeiro resultado negativo nos últimos 11 anos, segundo a PMC/IBGE. Houve queda de -0,4% nas vendas dos supermercados nos últimos 12 meses e de 18,5% (!) no setor móveis e eletrodomésticos em maio, ante maio/14. A taxa de operação nos hotéis caiu 9,9%, acumulando no ano queda de 5,9%.

O número de consumidores inadimplentes aumentou 4,52% em junho dobre junho/14, chegando a 56,5 milhões com nomes inscritos no SPC. Segundo a Serasa, as vendas do comércio varejista subiram 2,6% no 1º semestre, o pior desempenho desde 2003. Entretanto, o índice de confiança do empresariado do comércio (Icec), calculado pela CNC, registrou alta de 0,6% em junho, depois de oito quedas sucessivas. Mas a CNC projeta queda de -1,1% nas vendas do comércio em 2015.

Agricultura

De acordo com a previsão da CONAB, a safra de grãos 2014/15 deverá chegar a 206,3 milhões de toneladas, com alta de 6,6% sobre a safra anterior. Destaques: +11,7% na produção de soja, +2,2% em milho e +17,4% em trigo. 

Após cinco meses estagnados, as exportações de carne de frango tiveram forte recuperação em junho, com alta de 6%. Os preços subiram 9,6%. 

Mercado de Trabalho 

Segundo o IBGE, a taxa de desemprego vem subindo desde o início do ano e chegou a 8,1% em maio contra 7% em maio/14. Em 12 meses, desde maio/14, foram cortados 708 mil empregos com carteira assinada e a renda média do trabalhador passou da alta de 2,6% para queda de 0,4%.

Em maio, as demissões chegaram a 115,6 mil, com destaques para a indústria de transformação (-61%), serviços (-32,6%), construção civil (-29,8%), comércio (-19,4%) e extração mineral (-1,1%). Houve alta de 28,4% na agricultura.

Setor Financeiro

O volume de crédito do sistema financeiro vem tendo ligeiro crescimento em 2015. No ano, cresceu 1,4% até abril e 2,1% até maio, com grande disparidade entre bancos privados com recursos livres (+0,4%) e bancos públicos com recursos direcionados (+3,9%).

Para surpresa geral, inclusive dos bancos, o Governo ampliou o limite do crédito consignado de 30% para 35%, desde que o acréscimo de 5% seja destinado a quitar dívida com cartão de crédito.

Inflação

A inflação IPCA média de 7,5% nos meses abril/junho ficou bem abaixo da média janeiro/março com 1,26%, o que parecia indicar uma menor pressão de alta, chegando a 6,17% no 1º semestre. Em junho, a maior queda foi registrada no IPC/FIPE, com 0,47%, enquanto a maior alta ficou com o ICV/DIEESE, com 0,81. O quadro da inflação ainda está indefinido, com pressão dos serviços (+7,9%) superior à que vem atualmente do reajuste das tarifas, mas as maiores pressões vieram da habitação, alimentação e transportes.

A menor demanda mundial está puxando para baixo o preço do minério de ferro, assim como dos metais: alumínio, níquel, zinco e cobre.

Setor Público

Afinal, o Governo abriu as portas para deslanchar as concessões no setor rodoviário, definindo em 9,2% a taxa de retorno que será usada como referência nos próximos leilões.

Também na área portuária, foram abertas as licitações para exploração de seis terminais privados nos portos públicos de Santos, Suape, São Francisco do Sul e Rio de Janeiro.

Irresponsavelmente, estão sendo fortemente aumentadas as despesas públicas ou reduzida a arrecadação, como resultado das medidas que concedem isenção de PIS/COFINS para óleo diesel (R$13,8 bilhões), reajuste dos servidores do Judiciário (R$25,7 bilhões), reajuste das pensões e aposentadorias pelo índice do salário mínimo (R$3,4 bilhões) e outras. Em contrapartida, há proposta do Governo para adotar ajuste progressivo da fórmula 85/95 das contribuições para o INSS.