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'NYT': Os vários outros desastres econômicos da Europa, por Paul Krugman

'Há que se temer mais um 'sim' no plebiscito grego, porque já sabemos que trará mais austeridade'

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O jornal americano The New York Times publicou neste domingo (05/07), dia do plebiscito que decidirá os novos rumos da Grécia, um artigo do economista Paul Krugman 

"É deprimente pensar na Grécia hoje em dia, então vamos falar de outra coisa, ok? Vamos falar, para começar, sobre a Finlândia, que não poderia ser mais diferente daquele país corrupto e irresponsável ao sul. A Finlândia é um cidadão europeu modelo; tem um governo honesto, finanças sólidas e uma robusta classificação de crédito, que lhe permite captar empréstimos com taxas incrivelmente baixas", escreve Krugman, que ganhou o prêmio Nobel de Economia em 2001.

"Também está no oitavo ano de uma recessão que cortou o PIB per capita real em 10% e não dá sinais de terminar. Na verdade, se não fosse pelo pesadelo no sul da Europa, os problemas que a economia finlandesa enfrenta poderiam ser considerados um desastre épico.

E a Finlândia não é a única. Faz parte de um arco de declínio econômico que se estende pelo norte da Europa, passando pela Dinamarca - que não está no euro, mas administra seu dinheiro como se estivesse - e a Holanda. Todos esses países estão, aliás, se saindo muito pior que a França, cuja economia provoca péssimas reportagens de jornalistas que odeiam sua forte rede de seguridade social, mas na verdade se manteve melhor do que quase todos os outros países europeus, com exceção da Alemanha.

E o que dizer do sul da Europa fora a Grécia? As autoridades europeias vêm elogiando a recuperação da Espanha, que fez tudo o que se esperava e cuja economia finalmente começou a crescer de novo e até a gerar empregos. Mas sucesso no estilo europeu significa uma taxa de desemprego que ainda é de quase 23% e uma renda per capita real que ainda está 7% abaixo de seu nível anterior à crise. Portugal também foi obediente e implementou a rígida austeridade - e está 6% mais pobre do que era.

Por que há tantos desastres econômicos na Europa? Na verdade, o que é notável neste ponto é o quanto diferem as histórias da origem das crises na Europa. Sim, o governo grego tomou empréstimos demais. Mas o governo espanhol não - a história da Espanha é totalmente de empréstimos privados e bolha da habitação. E a história da Finlândia não envolve qualquer dívida. Ela tem a ver com a baixa demanda por produtos florestais, ainda uma importante exportação nacional, e os tropeços da manufatura finlandesa, em particular de seu antigo campeão nacional, Nokia.

O que todas essas economias têm em comum, porém, é que ao aderir à zona do euro elas se colocaram em uma camisa de força econômica. A Finlândia teve uma crise econômica muito severa no final dos anos 1980 - muito pior, no início, do que a que ela atravessa agora. Mas conseguiu engendrar uma recuperação razoavelmente rápida, em grande parte ao desvalorizar acentuadamente sua moeda, tornando suas exportações mais competitivas. Desta vez, infelizmente, não tinha moeda para desvalorizar. E o mesmo vale para outros pontos problemáticos da Europa.

Quer dizer que foi um erro criar o euro? Bem, sim. Mas não é a mesma coisa que dizer que ele deva ser eliminado, agora que existe. O urgente agora é afrouxar a camisa de força. Isto envolveria ações em diversas frentes, desde um sistema unificado de garantias bancárias até uma disposição a oferecer alívio da dívida aos países onde ela é o problema. Também envolveria criar um ambiente geral mais favorável para os países que tentam se adaptar à má sorte renunciando à austeridade excessiva e fazendo o possível para elevar a taxa de inflação subjacente da Europa - hoje abaixo de 1% - pelo menos de volta à meta oficial de 2%.

Mas há muitas autoridades e políticos europeus que se opõem a qualquer coisa e a tudo o que poderia tornar o euro funcional, que ainda acreditam que tudo ficaria bem se todo mundo demonstrasse disciplina suficiente. E é por isso que há ainda mais em jogo no referendo de domingo na Grécia do que a maioria dos observadores percebe.

Um dos grandes riscos de a população grega votar sim - isto é, aceitar as exigências dos credores, e portanto repudiar a posição do governo grego e provavelmente derrubá-lo - é que dará poder e incentivo aos arquitetos do fracasso europeu. Os credores terão demonstrado sua força, sua capacidade de humilhar qualquer um que conteste as exigências de austeridade infinita. E eles continuarão afirmando que impor o desemprego em massa é a única linha de ação responsável.

E se a Grécia votar não? Isso levará a um terreno desconhecido e assustador. A Grécia poderia deixar o euro, o que seria extremamente perturbador em curto prazo. Mas também ofereceria à Grécia uma oportunidade de recuperação real. E serviria como um choque salutar na complacência das elites europeias.

Ou, para colocar de modo um pouco diferente, é razoável temer as consequências de um voto no "não", porque ninguém sabe o que poderá vir depois. Mas deveríamos ter ainda mais medo das consequências do "sim", porque nesse caso sabemos o que virá - mais austeridade, mais desastres e eventualmente uma crise muito pior que tudo o que vimos até agora".