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Síntese da conjuntura: Novamente a Selic

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A Confederação Nacional do Comércio (CNC), em seu boletim "Síntese da  Conjuntura", elaborado pelo economista e ex-ministro da Fazenda, Ernane Galvêas, faz as análises do atual cenário econômico. Veja abaixo:

Quando a inflação é causada por um excesso de demanda proveniente do consumo e dos investimentos, uma forma clássica de coibir a alta de preços é a elevação da taxa de juros, com efeito direto sobre o volume do crédito.

O caso do Brasil é sui generis (ou sujênere como diz um amigo nosso): não existe excesso de consumo, nem de investimentos, embora haja excessiva expansão de crédito. O importante a notar, nesse caso, é que esse crédito excessivo provém de uma ação deliberada do Governo, que fornece recursos abundantes ao BNDES, à Caixa Econômica e ao Banco do Brasil. No ano passado e atualmente, a expansão dos empréstimos dos bancos públicos foi e continua sendo da ordem de 20% ao ano, enquanto a dos bancos privados mal chega a 5%. Feitas estas considerações, é fácil concluir que a absurda elevação da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central está totalmente divorciada do objetivo de combater a inflação. Por outro lado, é fácil perceber que o peso maior da alta taxa SELIC recai sobre o Tesouro Nacional e produz o efeito direto de aumentar a dívida do Governo.

Neste caso, quando as previsões indicam que o montante de juros a ser pago sobre a dívida pública vai chegar a mais de R$ 350 bilhões(!), é fácil perceber o estrago que a elevação da SELIC vai produzir sobre as atividades econômicas, em nome de uma equivocada política de combate à inflação.

POLÍTICA ECONÔMICA

Não é fácil, pelo contrário, é muito difícil, fazer economia voltada para o aumento da produtividade e do crescimento sustentável, com estabilidade monetária. Difícil, também, é praticar uma política que assegure alta competitividade aos produtos exportáveis, para concorrerem nos mercados internacionais.

Em contrapartida, é fácil, muito fácil, praticar uma política de subsídios fiscais e creditícios, subvencionar e estimular o consumo, aprovar aumentos reais de salários, congelar os preços dos alimentos, da energia, dos combustíveis e dos transportes.

As medidas do primeiro grupo, mais difíceis, são as que produzem benefícios de longo prazo, segurança jurídica, expansão econômica e altas taxas de emprego da mão de obra. As medidas fáceis do segundo grupo produzem satisfação de curto prazo, mas a prazo mais longo vão produzir inflação, baixo crescimento e desemprego.

Governos fracos, e incompetentes preferem o caminho fácil da demagogia. Governos sérios e eficientes não se iludem com as vantagens fáceis e passageiras. Aceitam os duros desafios da austeridade e garantem benefícios duradouros.

Vale a pena analisar o que tem sido praticado pelos sucessivos Governos brasileiros nas últimas décadas e o que está sendo feito nos últimos anos. As respostas estão à vista de todos.

ATIVIDADES ECONÔMICAS

As previsões metodológicas do IBGE puxaram o PIB para cima, no Governo Dilma: de 2,7% para 3,9% em 2011, de 1,0% para 1,8% em 2012 e de 2,5% para 2,7% em 2014, Mas em 2014 ficou praticamente estagnado em 0,1%, devido ao fraco resultado da indústria (-1,2%), das exportações (-7,0%) e queda dos investimentos (-4,4%). Houve queda de 3,3% na indústria de construção e de 9,5% na produção de máquinas e equipamentos. Segundo a maioria dos analistas de mercado, essa situação deverá continuar em 2016, com a retomada dos investimentos somente a partir de 2017.

No fundo de toda essa situação, perdura a questão da brutal carga tributária e da asfixiante burocracia oficial. A economia segue funcionando com o freio de mão puxado.

O consumo das famílias saiu da expansão de 2,9% em 2013 para apenas 0,9% em 2014, o menor resultado desde 2003.

O índice de confiança do consumidor, segundo o ICC da FGV, recuou 2,9% em março e atingiu o maior registro histórico pelo terceiro mês consecutivo. O volume de cheques sem fundos subiu para 2,15%, em fevereiro, ante 2,02% em janeiro e 1,95% em fevereiro/14.

O risco de racionamento de água e energia está sendo afastado, na medida em que maior volume de chuvas aumentou o nível das represas no Sudeste. O Sistema Cantareira teve o verão mais chuvoso desde 2011.

Indústria

A indústria brasileira vem apresentando nítida tendência de queda nos últimos dois anos, sobrecarregada pela pesada carga tributária, a asfixiante burocracia oficial e, durante longo tempo, pela valorização cambial. Atualmente, as grandes empresas convivem com sérios problemas, como é o caso da Petrobrás, da Eletrobrás, da Vale, da Embraer e outras, que fecharam o 1º semestre com a queda no faturamento.

No 1º trimestre, houve aumento de 0,7% na produção de aço bruto e de 4,4% na laminados mas em março a produção de aço caiu 7,4% em relação a marco/14. A produção do vestuário caiu 19,7% e a de produtos químicos caiu 1,87%. No quadrimestre, as vendas de automóveis caíram 19%. Em São Paulo, o INA registrou alta de 1,8% no 1º trimestre sobre o trimestre anterior, mas houve queda de 2,1% ante o mesmo trimestre de 2014.

A Vale fechou o 1º trimestre com recorde de produção (74,5 milhões de tons), alta de 4,9% sobre o 1º trimestre/14. Entretanto, com queda nos preços de venda, apresentou prejuízo de R$ 9,5 bilhões. A Petrobrás produziu em março 2,108 milhões de barris de petróleo/dia, com queda de 1,8% sobre fevereiro. Entraram em operação quatro novas plataformas, mas houve paralização temporária de outras três. Em dezembro/14, a produção atingiu 2,212 milhões b/d.

Comércio

Em fevereiro, o volume de vendas do comércio varejista caiu 3,1% em relação a fevereiro/14, o pior resultado desde 2001, com destaque para móveis, eletrodomésticos e combustíveis (-10,4%). Computados os segmentos da indústria automobilística e da construção, o varejo ampliado teve queda de 10,3%. Regionalmente, os piores resultados ficaram com Roraima (-8,0%), Amapá (-6,7%) e Goías (-2,5%).

No 1º bimestre, o varejo restrito caiu 1,2% ante o mesmo período em 2014, e no 1º trimestre, o setor atacadista registrou queda de 9,76, em termos reais, ante o mesmo período de 2014. Em Minas Gerais, houve alta de 1,58%. A taxa de ocupação no setor hoteleiro recuou 3,2% no 1º trimestre.

Segundo a CNI, o índice de confiança das empresas industriais recuou 1,0% em abril, enquanto a FGV indicou um recuo de 3,2 % no 1º trimestre.

Na contramão desses acontecimentos, o Grupo Klabin anuncia a entrada em operação da nova fábrica de celulose no Paraná (1,5 milhão de toneladas).

No setor serviços, a receita cresceu 0,8% em fevereiro ante fevereiro/14. No bimestre, ao aumento foi de 1,3%, o pior desde 2012, basicamente devido ao setor transportes.

Os estoques do varejo aumentaram em abril, na região metropolitana de São Paulo. A demanda por voos domésticos subiu 5,65 no 1º trimestre.

O percentual das famílias endividadas subiu de 59,6% em março para 61,6% em abril, com aumento das contas em atrasos (CNC), mas a inadimplência caiu 0,82% em março. A confiança do setor empresarial do comércio subiu 0,4% de março para

abril. Já o índice do consumidor avançou 3,3% (FGV).

Segundo a CNC, o índice de intenção de consumo das famílias caiu 6,9% em abril.

Agricultura Está praticamente aprovado o financiamento do Plano de Safra, com juros médios de 9% ao ano.

Mercado de Trabalho

Em janeiro, foram fechadas 81,8 mil vagas, o pior resultado desde 2009, segundo o CAGED.

Em março, a taxa de desemprego subiu e os salários sofreram redução.

O índice de desocupação passou de 5,9% de fevereiro para 6,23% em março, confirmando a tendência de alta que vem desde dezembro/14.

Paralelamente, o salario médio real, que vinha subindo ao longo de 2014, iniciou uma tendência de queda e atingiu o menor nível em março, enquanto a massa salarial recuou 8%.

Em março, foram admitidos 19,3 mil trabalhadores com carteira e demitidos 50,4 mil.

As admissões chegaram a 53,8 mil no setor de serviços e a 2,7 mil no comércio, ante demissões líquidas de 18,2 mil na construção civil e 14,7 mil na indústria. No Rio de Janeiro, o desemprego, subiu de 4,2% em fevereiro para 4,8% em março. Em São Paulo, o nível de emprego na indústria caiu 0,69%. A Mercedes Benz anunciou a demissão de 500 trabalhadores na fábrica de caminhões na ABC.

Setor Financeiro

Segundo o Banco Central, o montante das operações de crédito do sistema financeiro subiu 1,2% em março, ante fevereiro. No 1º trimestre, houve aumento de 1,4%, acumulando expansão global de 11,2% em 12 meses.

A posição do Governo é de reduzir o crédito, para frear a inflação. De janeiro a março, os financiamentos imobiliários da Caixa Econômica cresceram apenas 0,3%. A CEF vai financiar somente metade do valor dos imóveis usados, tendo em vista a redução dos depósitos de poupança. O Plano de Financiamento às exportações continuam travados.

Segundo a ADECIP, o volume de credito imobiliário encolheu 4,6% no 1º trimestre, acumulando queda de 2% em 12 meses. A inadimplência das empresas cresceu 12,1% (SERASA). No BNDES, subiu de 0,6% em fevereiro para 2% em março.

O lucro dos grandes bancos cresceu 19,8% no 1º trimestre, mas a inadimplência das empresas aumentou 7,9%.

A grande expectativa no mercado financeiro vem do anunciado financiamento de R$ 19 bilhões à Petrobras, que seria proporcionado pela CEF, Banco do Brasil e Bradesco. Não se sabe de onde virão o recursos.

Inflação

O IGP-M/FGV subiu de 0,98% em março para 1,17% em abril, indicando dos reajustes nos preços dos serviços públicos e dos alimentos no atacado. No ano, o índice acumulou alta de 3,22% e em 12 meses 3,55%.

No mercado das commodities, o preço da soja caiu 22% em um ano, enquanto subiu 8% o preço do açúcar e 5,9% o do minério de ferro. O juro do cheque especial subiu para 220% ao ano.

Alegando necessidade de controlar a inflação (!), o Banco Central aumentou a taxa SELIC de 12,75 para 13,75%, o maior nível desde a crise de 2008.

Setor Público

O desempenho das contas públicas continua decepcionante em 2015. Em março, a economia para pagar juros (superávit primário) foi de apenas R$ 0,24 bilhão, acumulando no trimestre R$ 19 bilhões, (R$ 25,6 bilhões no ano passado) para pagar R$ 143,9 bilhões de juros (!?). O desafio enfrentado pelo Ministro Joaquim Levy, no comando da nova política econômica de reajustes e austeridade, é muito maior do que se imaginava.

A arrecadação de tributos federais, em março, registrou aumento real de 0,48%, mas no acumulado do 1º trimestre houve queda real de 2,03%. O corte de despesas de R$ 18 bilhões para 2015, nos programas sociais, foi reduzidos para R$ 7,7 bilhões, após negociações com o Congresso.

As vendas dos títulos federais, pelo Tesouro Direto, alcançaram R$ 1 bilhão. Continua de pé a programação fiscal que prevê o corte de 22,0% nas verbas do Orçamento da União 2015.

De acordo com o Decreto presidencial de 1º de abril, as alíquotas que foram zeradas em 2014 passarão para 0,65% no caso do PIS e 4% na COFINS, a partir de 1º de julho, com arrecadação prevista de R$ 2,7 bilhões.

A realização dos novos grandes projetos nas áreas de infra estrutura continua entravada pela regra de fixação de uma arbitrária taxa de retorno. O recém realizado leilão para geração de energia até 2020 (1,146 MW) corresponde o investimento total de R$ 67,4 bilhões. Os projetos de infraestrutura já aprovados pelo Governo, para emissões futuras de debêntures, somam R$ 172 bilhões.

Setor Externo

Em abril, a balança comercial registrou superávit de US$ 491 mil, acumulando no quadrimestre saldo negativo de US$ 5,066 bilhões, resultado de US$ 57,931 bilhões de exportações (-6,4%) e US$ 62,997 bilhões de importações (- 5,9 %).

As reservas cambiais subiram, de US$ 369,3 bilhões em meados de março para US$ 373,7 bilhões, no final de abril.

As exportações para a China, no 1º trimestre, tiveram queda de 35,4%, com destaque para soja (-47,0%) e minério de ferro (-57,4%).

No cenário internacional, até meados de abril, registrou-se redução das atividades econômicas nos Estados Unidos, castigado pelo forte inverno. Houve queda na produção industrial de 0,6%, em março. O PIB americano desacelerou e cresceu apenas 0,2% no 1º trimestre. Os gastos dos consumidores desaceleram de 4,4% no 4º trimestre de 2014 para 1,9% no 1º trimestre.

A Europa convive com as incertezas da Grécia e político-econômicas da Rússia/Ucrânia. O BCE segue comprando € 60 bilhões de títulos por mês.

Na Ásia, tudo bem, com a China crescendo 7% no 1º trimestre e o Japão com perspectiva de expansão econômica de 1,3%, convivendo com o peso da dívida pública de 244% do PIB (!).