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Governo consegue reduzir capital especulativo, dizem economistas

Segundo os especialistas os investimentos externos na produção tendem a continuar

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O objetivo do governo de reduzir a entrada de capital externo no Brasil está sendo alcançado, como mostram os dados do Banco Central, que apontam queda de 40% nas compras de ações e títulos de renda fixa na bolsa de valores. Estes investimentos estão atrelados as variações do dólar e os juros e são considerados especulativos, não contribuindo para a cadeia produtiva nacional. É o que apontam especialistas ouvidos pelo Jornal do Brasil

O recuo é consequência das ações de desvalorização do real e da redução dos juros - atualmente no patamar histórico de 8% -  promovidos pelo governo. Porém, o número levou a uma reação "negativa e exagerada" do mercado financeiro, acostumado a ganhos de curto prazo, afirma o economista Fernando Sarti, diretor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de São Paulo (Unicamp).

"Esta queda é exatamente o que o governo vem buscando com as medidas de redução de juros e na depreciação do real. Durante décadas a especulação prevaleceu no Brasil. Apesar da reação da mídia, que colocou estes dados como se fossem notícias ruins, este capital é o que o governo quer e deve combater", analisa. 

Depois do recuo de US$ 4,9 bilhões no primeiro semestre deste ano, um relatório divulgado na última semana pelo banco americano Morgan Stanley classificou o Brasil como um país "lento e sem medalhas" na atração de capital externo. 

O professor Pedro Paulo Bastos, também da Unicamp, afirma, no entanto, que estes capitais estão muito atrelados à Bolsa de Valores e não chegam a cadeia de produção. "Estas análises não conseguem fazer uma perspectiva das questões macroeconômicas, pois estão associadas a disfunções pontuais. Com a queda dos juros e a desvalorização do real, aliados com outras políticas de incentivo à indústria, por exemplo, a ideia é de que a economia volte a acelerar, gerando produção. Assim, o capital externo, talvez menos especulativo, será atraído novamente".  

O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), José Miranda, explica como são feitos estes investimentos especulativos, que ganham a partir da diferença da taxas de juros de diversos países. "Existe uma operação carry-trade: japoneses, por exemplo, que tem juros de 0,25%, tomam dinheiro emprestado, fazem uma operação de yene–dólar para aplicar no Brasil em títulos de renda fixa e ganham no diferencial de taxa de juros, que aqui é de 8,5%".  

Mesmo com as quedas destes investimentos, o Brasil ainda é um dos países que mais receberam capital estrangeiro no mundo, lembra o economista Bastos. Segundo eles as análises do mercado superestimam as variações da Bovespa, que tem liquidez muito baixa e acaba refletindo muito mais o ciclo da economia mundial do que as perspectivas reais a médio e longo prazo para a economia brasileira, analisa. 

"A bolsa brasileira é muito concentrada em ramos cíclicos, por exemplo, em minérios, petróleo e siderurgia e as outras exportações de commodities. Como a demanda externa tem diminuído, os ganhos da bolsa vão acabar caindo também", explica.  

Investimentos Estrangeiros Diretos

Enquanto os investimentos em ações e em títulos de renda fixa apresentam grande recuo, os Investimentos Estrangeiros Diretos (IED), destinados à cadeia produtiva, seguem com fluxo muito acima da média dos anos pré-crise (2005–2007): atingiram US$1,5 trilhão, com um crescimento de 16,4% em 2011 em relação a 2010, segundo dados do World Investment Report (WIR).

Miranda atribui este crescimento em meio a crise internacional à demanda chinesa por energia, suprimentos e matérias primas. "A China se tornou um pólo dinâmico da economia mundial e tem demandas muito específicas, que normalmente são preenchidas pelas economias em desenvolvimento", analisa. Estes países são fortes no setor primário e assim, conseguem atender a demanda do asiático. Este tipo de entrada de capital, que vai diretamente para as indústrias e serviços brasileiros, gerando produção, renda e consumo, é visto com bons olhos pelos economistas.

Em entrevista para o Jornal do Brasil no último mês, o economista Mariano Francisco Laplane, presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), contou que existem três aspectos positivos neste investimento direto, além do óbvio aumento da capacidade das indústrias que recebem este capital.

"É um forma de financiar problema crônicos de escassez de divisas, déficit em conta corrente. Outra coisa positiva deste investimento é que normalmente trazem tecnologia, know how, conhecimentos que não necessariamente estão disponíveis, como na forma de equipamentos, nas novas formas de produção e ainda geram a qualificação de mão de obra. Além disso, estas empresas estão atreladas a uma rede de subsidiárias e mercados internacionais, o que contribui para as exportações", afirma.

Interesse

Bastos acredita que exista um "certo interesse" do mercado e da mídia para diminuir a atuação do governo na economia. "Este capital está muito associado à bolsa e acaba perdendo com estas intervenções, pois seus ganhos vem exatamente de onde o governo procura combater", opina. 

Segundo Fernando Sarti, há uma reação desmensurada não só do mercado, mas também da mídia, que ignora as questões macroeconômicas associadas aos "números frios e muitas vezes incompletos" dos analistas. Para ele, estas análises são influenciadas por interesses de ganhos imediatos, que ficam distante das questões macroeconômica.

A intensificação das exonerações fiscais e as iniciativas de depreciação cambial levarão a uma reação da economia, afirma. "Com esta queda pontual, o mercado fica nervoso, mas isso é passageiro, e não deve ser levado tão a sério", conclui Bastos.