“O passado sempre tem razão”. Nelson Rodrigues já sabia. É no resgate histórico que conseguimos traduzir o estado de coisas do Brasil. O documentário “O desmonte do Monte”, de Sinai Sganzerla, aborda o Morro do Castelo de São Sebastião, marco da fundação do Rio de Janeiro, sob a mão de ferro de jesuítas e colonizadores portugueses. Como as razões do passado nem sempre importam no Brasil, o Morro e suas estruturas arquitetônicas foram destruídos para reformas urbanísticas que tinham como questão de fundo a especulação imobiliária. Herdeira do grande Rogério Sganzerla, Sinai utiliza trechos do curta de autoria do pai “Viagem e descrição do Rio Guanabara por ocasião da França Antártica” (1976) em citação inspirada da narrativa histórica. A mãe, a atriz e diretora Helena Ignez, é a narradora.
No primeiro ato, o filme recorre ao didatismo limitando-se a iconografias e pinturas. O segundo ato ganha força com a exploração eficiente de arquivos de filmes dos festejos do centenário da Independência em 1922, além de depoimentos dos homens e mulheres que viveram no morro antes do desmonte. O extermínio indígena, a ganância de colonizadores e Igreja, o horror da escravidão e a política a serviço de empresários passam pelo início e fim do Castelo. Um tesouro perdido, que teria sido armazenado nas galerias subterrâneas do morro no período colonial, reforça a lenda em torno do marco histórico.
Há escolhas estranhas na trilha sonora. “The Magnificent seven”, do Clash, e as composições de Bernard Herrmann para “Um corpo que cai”, não se encaixam na narrativa. No entanto, crônicas de Lima Barreto, que descrevem a época da destruição e suas consequências, reforçam o olhar crítico sobre a perda de identidade de uma cidade com a destruição de suas raízes.
*Jornalista e membro da Associação de Críticos do Rio de Janeiro (ACCRJ)
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O DESMONTE DO MONTE: ** (Regular)
Cotações: o Péssimo; * Ruim; ** Regular; *** Bom; **** Muito Bom
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