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Luciana Caravello Arte Contemporânea abre o ano com duas individuais

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Luciana Caravello Arte Contemporânea recebeu, a partir desta terça-feira (21) dois artistas representativos da arte contemporânea brasileira. Nos dois primeiros andares, Pedro Varela e no terceiro, Marcia de Moraes, em parceria com a galeria Leme, de São Paulo.

Pedro Varela mostra seu universo tropical

Pedro Varela foi buscar no historiador Henry Rousso o título de sua exposição: “Un passé qui ne passe pas” – assim em francês mesmo. Rousso é um dos historiadores mais importantes da corrente que vai buscar uma história contemporânea, que investiga como o passado recente reverbera nos dias de hoje. E o mote dessa exposição – sua primeira individual na Luciana Caravello Arte Contemporânea - é a vontade de falar desse passado que continua reverberando. O seu interesse por personagens conceituais e também nessa representação da flora é justamente falar desse passado que não passa, que emerge nas nossas relações sociais, no nosso DNA, na forma como vivemos hoje.

Pedro apresenta um conjunto de obras monocromáticas em sua maioria, com personagens conceituais que surgem no meio de um emaranhado de plantas, caules e flores tropicais. Esses personagens às vezes são históricos, às vezes são ficcionais, mas sempre fazem parte do universo tropical. São recortes da história da arte, personagens anônimos e famosos, estereótipos, referências da cultura popular. Estão na mostra duas pinturas coloridas grandes de 150 x 150 cm, mais quatro monocromáticas grandes e cinco pequenas, além de alguns desenhos recortados. O texto da exposição é do curador Marcelo Campos.

No trabalho de Pedro, os personagens conceituais que emergem no meio da floresta falam sobre esse passado ainda vivo. Eles são links para diferentes épocas, que estão juntos por sua relação com os trópicos, especialmente o Brasil, criando uma paisagem/narrativa fragmentada. A questão histórica sempre esteve presente nos trabalhos de Pedro, mas nunca de forma tão direta. Isso surgiu aos poucos; a série preta e branca com personagens brotando começou em 2005. Mas a preocupação do artista não é com a história em si, com algo distante que já não faz parte das nossas vidas. “Minha ideia é abordar o que ainda está vivo, mesmo que precise recorrer aos bandeirantes, a imagens de gravuras e cartas náuticas antigas e personagens históricos. No meio desse caldo entram referências mais novas como Herzog enforcado, Brasília e Tarsila do Amaral.“

Pedro mora em Petrópolis, mas está passando uma temporada em Paris – sua mulher, Carolina Ponte, faz uma residência artística na Cité des Arts. De lá ainda irão para a Dinamarca antes voltar ao Brasil. Pedro viveu no México entre 2007 e 2009 e foi com a volta ao Brasil que surgiu seu interesse pelos trópicos. Seu trabalho já cruza fronteiras. Entre individuais e coletivas, participou de exposições no México, no Qatar, França, Genebra, Londres, Uruguai, Argentina, Lisboa. Esteve em 2016 na feira “Untitled”, em Miami.

Marcia de Moraes apresenta seus trabalhos “descabelados” 

A paulista Marcia de Moraes faz sua estreia no Rio em dose dupla na Luciana Caravello Arte Contemporânea: no dia 21, abre a exposição “Banquete” e lança o livro “Marcia de Moraes”, com um recorte de sua obra em textos de Paulo Myiada e Camila Belchior, editado pela Cobogó.

Marcia usa lápis grafite e lápis de cor em seus trabalhos, mas é no espaço branco, vazio, não preenchido pela cor, que as formas aparecem. São folhas secas, gargantas, pelos, unhas, pedras, ossos, cacos de vidro, piscinas, bolhas, entre outras coisas.  “Quando todos esses elementos estão aglomerados, o desenho se torna uma grande insinuação de um organismo vivo constituído de infinitas partes que não são a representação narrativa de objetos específicos, mas a transposição para o papel desses fragmentos visuais que tenho acumulado há anos”, explica a artista.

Na exposição da Luciana Caravello, ela apresenta sete obras. A que dá o título – Banquete – é o maior trabalho: um políptico de quatro partes que é mesmo um banquete: nele há uma série de referências figurativas como alcachofras, frutas, seios, unhas, ossos. Mas as referências não são óbvias; são transfiguradas e se tornam algo quase abstrato quando estão juntas no desenho. Tudo junto, acaba gerando um desenho que é um banquete visual, mais do que um banquete para o paladar. Mas para a artista, todos esses prazeres se misturam. Olfato, paladar, visual, tato. 

Há ainda dois desenhos e quatro colagens. Os desenhos de Marcia são feitos de aglomerados de formas e, como têm grandes dimensões, há muitos elementos desenhados em cada trabalho, mas as formas não são literais. “Estou montando um vocabulário desde que comecei a usar grafite e lápis de cor. E ele não acaba nunca; aumenta e se transforma de um trabalho para outro, pois vou descartando algumas formas antigas e inserindo outras novas. Assim, o desenvolvimento desse léxico se dá em espiral, não é linear”. 

Marcia conta que, ao fazer um desenho, vira constantemente a posição dos papéis, seja de cabeça para baixo ou de lado, para tentar ver novas formas. E ela se surpreende ao perceber imagens que não veria naturalmente. Ela acha importante fugir do vício de sempre usar certas formas no desenho. “Me interessa aquilo que eu não faria num primeiro impulso. Costumo dizer que me interesso por aquilo que está deslocado de sentido ou de lugar. Como se fosse um ato falho do cotidiano. Quero aquilo que não é fixo, é fluido e, de certa forma, descabelado, diz”.

O livro “Marcia de Moraes” é bilíngue (português e inglês) e foi realizado a partir de uma bolsa da Fundação Pollock-Krasner, em Nova York. Nele, estão reunidas imagens de cerca de 60 obras, além dos textos de Paulo Miyada e Camila Belchior e uma entrevista de Lourenço Egreja sobre o processo de trabalho da artista.