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Crítica: "O voo"

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O novo filme do diretor Robert Zemeckis (De Volta para o Futuro e Forest Gump), definitivamente, não pode ser assistido no avião. O voo não é um daqueles thrillers de sequestro nos ares ou viagem espacial apocalíptica, mas apenas a sequência inicial do longa poderia garantir ataques de pânico violentos nos passageiros mais sensíveis.

A trama conta a história de Whip Whitaker, um habilidoso piloto que, num dia como outro qualquer, é confrontado com a pior situação possível para sua profissão: uma falha técnica que provoca a queda da aeronave. Entretanto, a destreza na profissão o permite salvar, quase na totalidade, os passageiros desse voo que estava fadado a não ter sobreviventes.

O que se segue à queda, como protocolo, é uma investigação da organização de segurança aérea americana. Entre outras coisas, é comprovado elevado teor de álcool no sangue do comandante. Elevado o suficiente para condená-lo à prisão perpétua pelo homicídio daqueles que não conseguiu salvar. Portanto, assim que sai do hospital ele passa a receber a assessoria de um advogado que não mede esforços para ganhar uma causa.

O que é interessante de reparar aqui é que uma vez destruída a imagem de herói apresentada no início do filme, nasce lentamente aos olhos do espectador um alcoólatra irresponsável e prepotente. O roteiro de John Gatins (Coach Carter e Gigantes de Aço), extremamente intenso e provocante, explicita como um homem pode, após ter sido derrotado pelo vício, ter nele a força para se manter em pé. É o vício que o faz funcionar, pois sem a bebida, não haveria piloto herói.

O grande sucesso de Zemeckis é conseguir conduzir a narrativa para que o espectador não saiba mais o que é certo ou errado. Por uma via um tanto torta, essa figura meio herói, meio anti-herói clama ao público por um julgamento que o isente da irresponsabilidade de pilotar embriagado, justificando isso com o simples fato (ou nem tão simples assim) de ter salvado 99% dos passageiros a bordo de seu avião. E ser o único piloto capaz de fazer isso.

O trabalho de Denzel Washington é primoroso. Através de uma construção rústica que não foge à delicadeza, ele presenteia o espectador com um desempenho arrebatador, talvez um dos melhores de sua carreira. Vê-se na tela um homem sem o horizonte que, em um processo de lenta decadência, tenta vencer os hábitos que o fizeram perder família, fé e credibilidade. Um homem que se vê obrigado a escolher entre a culpa e o vício e a ética.

O voo não é um filme sobre aviação. Tampouco sobre bebida. É um filme sobre reabilitação de vida. Sem mais.

Cotação: **** (Excelente)