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Um personagem da Segunda Guerra Mundial 

Conde Ciano, o poderoso e influente genro de Benito Mussolini

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Bom livro para este fim de inverno, O Conde Ciano, sombra de Mussolini, de Ray Moseley, (Globo Livros, R$ 49,90) traz de volta o conde Galeazzo Ciano (1903-1944), genro e ministro do Exterior de Benito Mussolini.

Diplomata de carreira, seu primeiro posto foi no Rio de Janeiro, de onde seguiu para Buenos Aires e de lá para a China, retornando em 1929 à Itália.

Seria uma carreira normal se não conhecesse Edda, a filha mais velha do Duce. Apaixonaram-se e casaram-se em 1930, quando o sogro já governava a Itália havia oito anos. O casal partiu para posto no consulado de Shanghai.

É claro que entrar para a família do ditador fascista fez bem à carreira de Ciano. Aos 30 anos tornou-se secretário de Imprensa e Propagada, função que equivalia à de Joseph Goebbels no III Reich.

Quando Hitler assumiu o poder na Alemanha, Ciano demonstrou entusiasmo com o governo nacional-socialista, mas foi mudando de opinião ao perceber no chanceler alemão o objetivo de “guerra e vingança.” O sogro cuidou da carreira do genro, nomeado ministro do Exterior em 1936. Ciano começou, então, a escrever um diário, considerado um dos mais importantes documentos históricos da Segunda Guerra e o melhor relato sobre o caráter de Mussolini, mesmo com momentos de bajulação ao sogro: “O Duce tem sempre razão. Sua visão é sempre clara.” Os conceitos sobre os outros e sobre si próprio no Diário expõem os bastidores do governo fascista e a relação conflituosa com os alemães. Ciano anota mesmo em seu diário: “O Führer é falso e traiçoeiro.”   

Em resposta às conquistas de Hitler na Europa, Mussolini invadiu a pobre Albânia, em abril de 1939e planejou construir uma grande mesquita em Roma para os seis milhões de albaneses mulçumanos. Ciano foi contra a exótica ideia.

A vida boêmia de Ciano levou Edda a pedir a separação do casal. Mussolini foi contra. No começo de 1939, Hitler decidiu invadir a Polônia e convidou a Itália para participar da aventura. Ciano achou precipitada a ação, ele sabia que a Itália não estava preparada para a guerra. Mesmo assim convenceu a Duce a assinar uma aliança com Hitler. Os desentendimentos com os alemães se intensificaram, a ponto de Ciano ouvir de seu colega alemão, Ribbentrop: “Não precisamos de vocês.”

Pontos de vista diferentes em relação aos alemães começaram a atritar a relação entre o Duce e seu genro. Quando Ciano, com autorização de Mussolini, declarou que a Itália optaria pela neutralidade em relação guerra, causando espanto no Reich, Mussolini mandou uma carta a Hitler tentando amenizar o pronunciamento de Ciano.

Em 26 de maio, Mussolini decidiu participar da guerra do lado alemão e comunicou ao chefes militares a sua decisão. Ciano não escondeu sua decepção e anotou em seu diário: “Mussolini está completamente louco. Ao saber do “diário”, Hitler não se conteve: “...o ministro do Exterior não quer a guerra e tem um diário onde escreve coisas sórdidas e injuriosas sobre o nazismo e seus líderes.”

Apesar de contrário a guerra, Ciano combateu a França e países do norte da África como piloto de bombardeiros. A guerra tornou-se desastrosa para os italianos. O ódio do povo recaiu sobre Ciano. As sucessivas derrotas o desgastavam mais que a seu sogro.

Quando a Itália, em maio de 1941, perdeu a Abissínia, Ciano enviou mensagem a Washington insinuando a deposição do Rei e de Mussolini. Buscava aliados que poderiam salvá-lo do inevitável: as punições aos que levaram a Itália àquele desastre. Sabia ser isso apenas questão de tempo.

Os desentendimentos aumentaram. Em fevereiro de 1943 Ciano é demitido e nomeado embaixador junto ao Vaticano. Prevendo o futuro trágico que aguardava o fascismo, gostou de deixar um governo que desmoronava.

A invasão dos aliados na Sicília sem reação das tropas italianas precipitou a queda do Duce. O órgão máximo do fascismo, o Gran Consiglio, propôs ao Rei destituir o ditador em julho de 1943.  Ciano votou contra Mussolini.

Destituído de sua embaixada junto à Santa Sé e incluído na relação dos criminosos de guerra, Ciano fugiu para a Alemanha, mas, depois passar alguns meses como hospede-prisioneiro de Hitler, pediu para retornar à Itália. Levado a Verona, foi preso por ordem de um governo que Mussolini exercia no norte italiano sob o patrocínio dos alemães. Ciano foi condenado à morte e fuzilado em 11 de janeiro de 1944.

Edda fugiu para a Suiça levando o “Diário.” Trechos foram publicados na imprensa italiana e espanhola antes do fim da guerra. O Chicago Daily News comprou seus direito autorais e o publicou na íntegra nos EUA, em 1945.

O livro de Ray Moseley baseado no “Diário” é obra essencial para  compreender os bastidores da Segunda Guerra e prende o leitor como se lesse um emocionante livro de suspense. 

*José Carlos Mello, historiador de Brasília, é autor de Os tempos de Getúlio Vargas, Topbooks, Rio 2012.