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Crítica: 'Menos que nada'

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No novo filme de Carlos Gerbase, a imaginação é o principal personagem. Inspirado no texto O diário de Redegonda, de Arthur Schnitzler, Menos que Nada refaz os passos de um paciente esquizofrênico até a sua entrada no hospital. Dante, cujo caso é dado como perdido para o sistema psiquiátrico obsoleto, é o objeto de estudo e o passaporte de uma jovem residente para um mundo desconhecido.

 Tentando quebrar o silêncio e o status de incurável de seu paciente, Paula, que é interpretada por Branca Messina, busca respostas para um passado mal resolvido através das lembranças de quatro personagens chave: Gregório (Roberto Oliveira), o pai; Berenice (Maria Manoella), a amiga de infância; Laura (Carla Cassapo), a professora universitária, e René (Rosanne Mulholland), uma renomada arqueóloga. Aos poucos, as peças compõem um quebra-cabeça que em diversos momentos lembra Spellbound, de Hitchcock, só que no lugar de sonhos, os enigmas surgem nos depoimentos.

Entre fatos reais e imaginários, o espectador é conduzido a questionar a veracidade dos depoimentos, explorando o quê detetive do filme. Porém, a realidade criada por Dante só se torna dúbia no final. Teria uma desilusão amorosa dado início ao transtorno ou teria sido grande parte um delírio? Tal recurso, apesar de ser bem pontuado pela trilha sonora, poderia ser melhor explorado para que o universo do paciente fosse sentido e vivido em sua totalidade esquizofrênica, tudo então seria dúbio, como é o caso de A Ilha do Medo, de Scorsese.

O filme também pode remeter ao grande clássico do cinema, Cidadão Kane, em uma das mais belas cenas do filme: quando criança, Dante é forçado pela mãe repressora a terminar sua amizade com Berenice, que, como lembrança, o presenteia com o seu chapéu. Dante perde a mãe logo em seguida e enterra o presente no cemitério, como símbolo das duas perdas. Já no hospital, sua escavação constante em busca de um objeto desconhecido fica poeticamente clara: Rosebud floresce.

Mas como nem tudo é um mar de rosas, o filme peca pela obviedade e pela pífia realização da cena com os homens pré-históricos. Dispensável. Defeitos especiais à parte, a atuação de Felipe Kannenberg apaga da memória qualquer mal entendido real ou imaginário.

Cotação: ** (Bom)