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Eder Santos, grande nome da videoarte, ganha retrospectiva no Rio

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Taís Toti, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - Mesmo quando demonstra preocupação com a demora da colocação de um projetor ou a falta de algum objeto da instalação, Eder Santos está sempre tranquilo, falando manso. Quem está realmente ansioso com a exposição que abre depois de amanhã no Centro Cultural Banco do Brasil são os cariocas: é a primeira vez que o trabalho do artista mineiro de 49 anos, um dos mais respeitados videoartistas do mundo, ganha uma retrospectiva no Rio, após ter passado por vários países da Europa, América Latina, e até mesmo pelo MoMA, Museu de Arte Moderna de Nova York.

Serão sete obras: Maneiras de se playtear a eternidade, Enciclopédia da ignorância, Low pressure, Call waiting, Coc au vin, Distorções contidas e Obra box, que se dispõem em um percurso não cronológico, mas de imagens. Não por acaso, o nome da exposição é Roteiro amarrado.

Todo o meu trabalho vem do cinema, por isso o roteiro explica Eder Santos, numa pausa para café e bolo durante a montagem da exposição. Acredito numa narrativa pela imagem, e seu percurso junto a imagem. O caminho da imagem é um caminho que se junta. O que eu faço aqui não é só uma instalação para contemplar, tem interatividade. Acredito que esse é o cinema do futuro, um 3D físico brinca. A videoinstalação é meio que um cinema.

A retrospectiva engloba obras realizadas entre 2001 e 2010, deixando de lado os aclamados vídeos single channel (feitos com apenas uma plataforma eletrônica) para privilegiar as videoinstalações e videoesculturas.

É apenas uma parte da minha carreira. Muita gente perguntou se não teria vídeo single channel na exposição mas, como eu sempre digo, isso também é cinema. Gosto de mostrar filmes numa sala grande, confortável. Não quero essa coisa de banquinho de madeira.

As instalações da exposição são também um reflexo da obra que Eder Santos vem desenvolvendo nos últimos anos e os rumos que está tomando em sua arte.

Sempre trabalhei com a narrativa da imagem, a relação corpo e imagem. Em algumas obras faço objetos com ela. Quando saio de um canal só (no vídeo single channel) vou para o vídeo como objeto, escultura. Além da instalação, que é a construção de um ambiente, quero construir um objeto-imagem, pequenos suportes que se possa levar na mão.

Muitos associam a obra de Eder Santos à uma mineiridade o artista nasceu em Belo Horizonte, onde mora até hoje. Ele, contudo, não consegue precisar em que momento a questão geográfica se manifesta em seu trabalho.

Não sei exatamente o que seria essa mineiridade. Meu trabalho foi feito em Minas. Talvez ajoelhar para ver uma imagem (como em Humilhação, parte de Enciclopédia da ignorância) contenha algo de religiosidade, que é muito mineira. Criou-se essa geração que trabalha com imagem em Minas. Não existe uma geração de cineastas de lá, mas ficou forte essa coisa do vídeo.

Com o tempo, Eder Santos acaba percebendo mais uma ou outra referência à sua terra. A peça que recepciona o público, no saguão do CCBB, é uma bolha , como é chamada pelo artista. O planetário, junto com uma cama, uma cristaleira e uma cadeira que ficam no andar de cima, constitui a obra Maneiras de se playtear a eternidade.

Isso pode ser bem mineiro, negociar o céu é bem religioso. Ela brinca um pouco com o fato de passar pelas fases da vida, por negociações.

A cristaleira, ele explica, representa a infância, com as taças que a avó nunca deixa serem tocadas. Atrás, enquanto se vê os objetos e o próprio reflexo, algumas imagens em vídeo passam, sempre trabalhando com a memória. Na cadeira (chamada Máquina de reflexão, ou tortura de vídeo , como brinca Santos), o público vê o reflexo do próprio rosto misturado a outros, entre eles o do próprio artista.

Nesse tem a minha foto, mas não coloco muitas coisas pessoais. O trabalho é sempre uma parte da gente, mas não uma coisa documental. Acho um saco artistas que trabalham com a vida pessoal, como Sophie Calle. O que eu tenho com isso? Não sou adepto dessa fase da arte repudia Santos, citando a artista francesa que transformou um e-mail de fim de relacionamento na exposição multimídia Cuide de você.

Seu próximo projeto, o longa-metragem Deserto azul, passa longe do documental: é um roteiro de ficção científica. O cenário do filme será, curiosamente, uma exposição, com vários de seus vídeos-objeto, montados no CCBB de Brasília.