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O tesouro escondido de João Gilberto

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Barcímio Amaral e Bolívar Torres, JB Online

RIO - Os pescadores de pérolas musicais vão ficar entusiasmados: há um tesouro escondido de João Gilberto em poder da cantora Miúcha, que foi casada com o cantor e violonista por quase dez anos, gravou com ele e Stan Getz o disco "Best of two worlds" (1976) e é mãe da cantora Bebel Gilberto.

São fitas caseiras, com estudos instrumentais que João pretendia desenvolver mais tarde, mas não o fez. Miúcha tem até medo de mexer nas fitas, porque elas podem estar deterioradas e precisam pelo menos de uma limpeza.

- No momento elas estão paradas. O material é sensível, e por isso não mexo toda hora. Acho importante guardar para que no futuro estudantes de música possam compreender melhor o processo de criação de João Gilberto. E também guardo para o caso de o próprio João querer aproveitá-lo em novos trabalhos. O material mostra que muitas vezes ele podia começar uma música pelo meio, não necessariamente pelo início. Às vezes, tudo parte de um solo, de uma idéia musical, que ele acaba desenvolvendo, ou não - conta a cantora.

Além do tesouro de Miúcha, há gravações completas de João Gilberto não aproveitadas nos discos que lançou. O baixista e flautista Bebeto (Adalberto Castilho), ex-Tamba Trio, participou do terceiro disco de João Gilberto, que leva apenas o nome do cantor, gravado em 1961 pela Odeon (hoje EMI). Ele garante que duas faixas gravadas não foram incluídas no disco. Falseta, de Johnny Alf, por sinal a primeira gravação do compositor e pianista, sairia num 78 rotações de 1952 - João só voltaria a gravar Johnny Alf ("Eu e a brisa") no disco "João Gilberto Prado Pereira de Oliveira" (WEA, 1980).

- Da segunda música, infelizmente, não me lembro do nome. Só que mencionava 'Papai Noel' na letra - lamenta Bebeto.

Gil Lopes, que trabalha com Carmela Forsin na Showbrás Produções Artísticas, empresa que agencia João Gilberto, acompanhou de perto as gravações dos últimos discos do cantor e garante que não.

- Não conheço nenhum caso. É muito difícil existir alguma sobra, porque, quando João chega ao estúdio, ele já sabe exatamente o que quer. Ele é a perfeição - exulta.

Na época da gravação do disco "João, voz e violão" (1999), foi divulgado que ele havia gravado, pela primeira vez, uma música de Jorge Benjor. Se o fez, não entrou no disco, cercado de divergências com o produtor Caetano Veloso sobre a inclusão ou não de arranjos de Jaques Morelenbaum para orquestra, escolha de repertório, e todas as polêmicas que sempre envolvem as gravações de João.

O já citado disco de 1961 foi iniciado com o conjunto do organista Walter Wanderley, ficou parado cinco meses e só foi terminado quando Tom Jobim - que recusara a missão, escaldado pelas confusões nos dois discos anteriores ("Chega de saudade" e "O amor, o sorriso e a flor") - aceitou assumir a direção musical. De acordo com Ruy Castro, no livro "Chega de saudade", João chegou a dizer, em alto e bom som, para que todo o estúdio ouvisse, que Tom era burro.

O arquivo da Universal, gravadora de João, voz e violão, garante que acha o registro se for necessário, mas precisa saber o nome da música. Jorge Benjor talvez conheça a história, mas está de férias no exterior.

João, como se sabe, não fala, só canta, e cada vez menos freqüentemente, aos quase 77 anos (completos em 10 de junho). Seu site registra para este ano, por exemplo, uma apresentação em Nova York marcada para 22 de junho. A anterior, de acordo com o site, foi em 2006.