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O Brasil está tirando a sua máscara

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Desde as jornadas de junho, e eu escrevi isso por aqui, é só buscarem os artigos da época, nós estamos percebendo uma mudança de rumo na "nau brasilis". Os ventos estão soprando de maneira diferente. Credito isso ao nosso natural amadurecimento como democracia ainda jovem.

As lufadas da primavera Árabe, do Movimento Occupy, e do Outono Brasileiro ou como é mais frequentemente nominado o movimento que levou um sem número de manifestações populares, as Jornadas de Junho, ainda estão reverberando por aqui.

Apesar da truculência e brutalidade (desculpem a redundância) vistas no trato dos cidadãos e cidadãs que foram às ruas, por parte da polícia  e a mando dos governantes e com a aquiescência de boa parte da sociedade influenciada por uma cobertura midiática cada vez mais questionável, foram expostas nossas nuances mais feias e frágeis.

Como diz a canção, "cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é", e nós   precisamos domar essa fera enjaulada e coberta com a pele da cordialidade. Não podemos achar que passaríamos incólumes ao processo de colonização desse nosso querido e amado país de mestiços. O difícil é achar a cura.

E a cura só  é possível se, como em qualquer caso grave, for exposto o problema, discutido e somarem-se esforços para encontrar a solução ou soluções. Com o início do período eleitoral vimos a culminância, ou o nível mais elevado do efeito de alguns destes males mal curados, como o racismo, preconceito com ares de xenofobia e a clara e real divisão de classes.

 Após o último domingo nossas feridas estão ainda mais expostas, sem nenhuma bandagem que as faça ocultar-se e são sim muito desagradáveis e nos causam certo asco de serem olhadas. Mas temos de cauterizá-las e a despeito disso tudo é preciso encará-las e dar início ao processo de cura. Talvez seja lento, doloroso e nos custe muito.

Não adianta culpar o Facebook ou o Twitter, ou o WhatsApp, eles só foram a lente de aumento, a caixa amplificadora, que permitiu a visibilização e  a ampliação do impacto de se ver sem filtros. 

O Brasil não está dividido como muitos tem tentado afirmar. Como o personagem do filme O Máskara, que tentava arrancar de si mesmo a máscara que o dominava e fazia surgir um Alter ego inconveniente, o Brasil está sendo desmascarado, ou melhor se autodesmascarando. 

O Alter ego, cordial , risonho e festivo, dá lugar ao que realmente nós somos, um país em franco processo de mudança e mudanças mais do que estruturais ontológicas.

Estamos avançando no processo democrático, estamos nos ambientando aos desafios propostos por esse processo e todo amadurecimento é doloroso e violento. Não somo bonzinhos, não somos cordiais, não somos dóceis como cãezinhos de circo.

Somos um povo com formação multicultural, miscigenado, com níveis vergonhosos de desigualdades. Que encarcera e mata uma parte de sua população sem nenhuma vergonha ou mal estar.

Somos uma nação que se permite ver crianças nascerem, crescerem e morrerem nas ruas.Que se permite achar normal que no norte e nordeste do país , crianças sejam sequestradas de suas famílias pelos poderes constituídos.

Que se permite uma população inteira morando em florestas, margens de rios, sob viadutos, com centenas de imóveis vazios e deteriorados por toda sua extensão territorial urbana. Que um estado inteiro fique sem água por omissão do poder público.

Que se permite ver uma criança morrer na porta de uma hospital por que um profissional de saúde, formado com o dinheiro da população se nega à atender.

Somos um povo que permite ver sem nenhuma reação o linchamento de seus compatriotas sem nenhum questionamento e depois vai à missa, ao culto e pede paz com lindas rosas brancas. Que demoniza ações afirmativas, de reparação, de assistência social, mas que aprova benesses financeiras aos abastados, como bolsas para filhos de altas autoridades.

Que coa um mosquito e engole um camelo, como disse Jesus.Não há mais como voltar atrás neste processo. Os brasileiros do Brasil real estão fazendo um caminho em direção ao centro e saindo da periferia do acordo e bagunçando o coreto da ordem estabelecida tacitamente.

Queremos avançar. O Brasil real quer o fim dos privilégios, quer um plano de habitação consistente, quer educação saúde e segurança de qualidade e pública. A  linha das Tordesilhas traçada pelas elites já não é mais reconhecida e legitimada. Está posto o machado à raiz da árvore.

P.S. O Brasil começou em Porto Seguro(Bahia) e pra quem não lembra, fica no Nordeste.

"A nossa luta é todo dia. Favela é cidade. Não à GENTRIFICAÇÃO e ao RACISMO, ao RACISMO INSTITUCIONAL, ao VOTO OBRIGATÓRIO e à REMOÇÃO!"

*Membro da Rede de Instituições do Borel, Coordenadora do Grupo Arteiras e Consultora na ONG ASPLANDE.(Twitter/@ MncaSFrancisco)