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Cientista propõe 'clarear o mundo' para melhorar o ambiente

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O superaquecimento nos centros urbanos e suas consequências para o meio-ambiente e para a vida das pessoas é um problema latente sobre o qual se precisa pensar com urgência. É o que defende Hashem Akbari, cientista e professor da faculdade de Concordia em Montreal, no Canadá. Ele coordena um programa mundial que cuida, mede e propõe soluções para o resfriamento do ambiente. Em entrevista, em São Paulo, afirmou que diminuir a temperatura nos grandes centros mundiais e beneficiar o mundo inteiro - literalmente - é muito mais simples do que se imagina. Tudo precisa começar no que está mais próximo do cidadão: a casa em que ele mora.

De acordo com Akbari, não é difícil explicar a diferença na temperatura entre grandes cidades, como São Paulo e Nova York, e regiões do interior próximas a essa cidade. "Pessoas que são ricas vão para o interior porque é mais frio que nas áreas urbanas. A razão pela qual as áreas urbanas são tipicamente mais quentes tem a ver com o fato de que elas são basicamente feitas de telhados e asfalto de cor escura, o que absorve mais energia.", explicou.

Pode parecer inusitado, mas a alta temperatura em centros urbanos, a sensação de abafamento e a má qualidade do ar têm muito a ver com o telhado e o chão das casas, estabelecimentos e escritórios. A explicação é simples. "Quando o chão é escuro, ele absorve muita energia do sol. A terra embaixo do asfalto também esquenta, assim como o ar ao redor", afirmou. O mesmo raciocínio serve para o telhado. A questão é que tais materiais não perdem o calor com a mesma velocidade em que o absorvem no tempo de um dia. Somando-se vários dias, meses ou mesmo anos, o efeito só se potencializa.

A solução encontrada por Akbari está nos chamados cool roof e cool paviments. No inglês, a palavra "cool" quer dizer, entre outras coisas, "frio". Na prática, significa o uso de cores mais claras, que, naturalmente, refletem mais luz do que as cores escuras. "Se o telhado é escuro, podemos fazê-lo com cores mais claras. Se o chão é escuro, podemos fazê-lo mais claro", projetou o cientista.

A ideia parece óbvia, mas convencer as pessoas a adotá-la tem sido o árduo trabalho do professor ao longo de várias cidades da América do Norte, em um primeiro momento, e do resto do planeta. "Se todas as pessoas em uma comunidade utilizassem os cool roofs, toda a região iria se beneficiar, mais calor iria ser refletido para o espaço. Isso aumentaria a qualidade do ar e, consequentemente, a qualidade de vida", explicou Akbari.

Além disso, há uma série de questões decorrentes desse aquecimento anormal. Superaquecido, o asfalto escuro, por exemplo - principalmente em países tropicais como o Brasil -, se torna "mole" e mais sensível ao peso dos veículos. Assim, buracos surgem mais facilmente. Sem contar que a diferença de temperatura na superfície de um asfalto escuro em comparação com um claro pode chegar a 30ºC, submetidos às mesmas condições e tempo de absorção. O cénario fica pior quando os objetos são os telhados. "A diferença entre um telhado branco e um escuro, debaixo do mesmo sol, pode chegar a 50ºC", afirma Akbari. Mas os problemas causados pelo aquecimento dos centros urbanos não terminam por aí.

A alta temperatura, em conjunto com a poluição de grandes cidades como Los Angeles e São Paulo, também aumenta a concentração de ozônio no ar atmosférico. A longa exposição ao elemento degrada o pulmão e expõe os tecidos do corpo a este componente altamente oxidante. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - Inpe -, além de modificar o equilíbrio ambiental, ele altera a bioquímica das plantas em escala significativa. De acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos - EPA -, as perdas anuais naquele país causadas pelo excesso de ozônio na atmosfera têm chegado à casa de US$ 500 milhões.

"Em Los Angeles, estima-se que o custo do ozônio no ar é de cerca de US$ 3 bilhões anualmente, no que se refere ao gasto das pessoas caso fiquem doentes para ir aos hospitais e por não poderem ir ao trabalho", exemplificou. "Se você reduzir a temperatura na casa de 2ºC a 3ºC, a quantidade de ozônio cai significativamente entre 10% a 20%", concluiu.

Para Akbari, o futuro do homem em um planeta cada vez mais "concretizado", em referência ao aumento das áreas urbanas asfaltadas e à diminuição das regiões verdes, está estritamente ligado ao comprometimento com a vida e à necessidade de se pensar localmente para chegar a um objetivo global. E, de maneira simples e direta, tudo pode e deve começar na casa de cada cidadão." Os cool roofs são a maneira mais lucrativa de fazer uma casa ficar confortável e ao mesmo tempo economizar dinheiro", concluiu.

São Paulo é bom candidato para aderir ao programa

Akbari veio ao Brasil nesta semana - onde participou da 2ª Green Building, exposição e conferência sobre práticas sustentáveis na consttrução civil - para buscar a adesão da cidade de São Paulo como um dos grandes centros urbanos do projeto. "Ter São Paulo seria ótimo pelo que ela representa. Vamos cuidar de 20 milhões de pessoas. Além disso, a energia aqui é muito cara, então economizar seria excelente", disse o professor.

O projeto de mensuração da temperatura e proposição de soluções acontece em algumas cidades no planeta, como Nova York e Chicago, nos EUA. Outros centros urbanos estão considerando neste momento entrar no programa, como Los Angeles, Atlanta, Milão e Roma, na Itália, e algumas cidades do Oriente Médio. Akbari ainda quer, além de São Paulo, Nova Déli (na Índia) , Tóquio e Osaka, no Japão, e mais algumas cidades na África.

Para isso, o professor espera o comprometimento de autoridades políticas destes países e afirma a necessidade de um planejamento para o futuro que pense no meio-ambiente e em maneiras de tornar os ambientes urbanos mais "amigos" do planeta.