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Bahia: Kret, travesti e agora vereador, não abre mão das saias

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Jornal do Brasil

SALVADOR - A partir de fevereiro de 2009, a Câmara de Vereadores de Salvador se tornará palco de uma situação polêmica e inédita. O travesti Leo Kret, 24 anos, vereador eleito na capital baiana com a quarta votação 12.861 votos anunciou que vai usar trajes femininos. Em tese, medida não fere o Regimento Interno da Casa, mas provoca polêmica.

O regimento determina, em seu artigo 14°, que o vereador deve comparecer decentemente trajado às sessões, sem especificar se pessoas do sexo masculino têm que vestir terno e gravata nas sessões. Tradicionalmente, todos os vereadores comparecem com este figurino, numa espécie de lei não escrita.

Se Leo Kret se elegesse deputado federal, os problemas seriam ainda maiores. No início da atual legislatura, o presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), proibiu o deputado Mão Branca (PV-BA) de comparecer ao plenário com um espalhafatoso chapéu de boiadeiro, sua marca registrada. O mesmo se aplicou ao deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), que tomou posse usando bombachas, traje típico de seu Estado. Se os dois insistissem em manter o figurino, corriam, até, o risco de perder o mandato, por quebra de decoro parlamentar.

Consulta prévia

Para se prevenir de algum constrangimento, a assessoria jurídica de Leo Kret que se chama Alecsandro de Souza Santos encaminhou ofício para a Presidência da Câmara se posicionar, mas ainda não teve resposta.

As pessoas perceberam que estamos em uma nova realidade disse Leo, que exige ser tratado como vereadora . Vou me vestir da forma como sempre me vesti. Não acredito que haverá problemas. O brasileiro já entendeu que o lugar de gay também é na política.

Para o presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT ), Toni Reis, não há conflito algum na escolha dos trajes do travesti.

A nossa orientação é para que a pessoa siga a sua identidade de gênero explica. Se a pessoa se sente mulher, deve usar roupas femininas. Não existe terceiro sexo.

Outras cidades

A situação de Leo Kret, que integra a banda de pagode Saiddy Bamba, pode se repetir em outras cidades. Os travestis Moacyr Sélia (PR), conhecida como Moa, e Isaías Martins de Oliveira (PV) vão tomar posse nas câmaras de Nova Venécia (ES) e Patos de Minas (MG), respectivamente. Mas ainda não anunciaram como vão se vestir. Nas eleições do início do mês, também foram eleitos como vereadores, os declaradamente gays José Itaparandi (PT), em Paço do Lumiar (MA), e Sander Simaglio (PV), em Alfenas (MG).

Ao todo, entre os 349.391 candidatos que tentaram se eleger vereador no início do mês, 80 declararam aos eleitores a sua homossexualidade. Foram 46 gays, 14 lésbicas e 20 transexuais. Outros 141 candidatos, de acordo com números da ABGLT, se declararam aliados, como Eduardo Paes (PMDB) e Fernando Gabeira (PV), que disputam a Prefeitura do Rio.

Pelo levantamento da ABGLT, o maior número de candidatos gays ou simpatizantes à causa homossexual foi registrado em São Paulo, com 35. Entre eles a petista Marta Suplicy e o prefeito Gilberto Kassab. O segundo colocado no ranking foi Salvador, com 11 candidatos. Chama atenção a mobilização soteropolitana, uma vez que a cidade é líder no número de assassinatos de homossexuais. Só neste ano, até o início do mês foram 15 mortes.

Para o presidente da ABGLT, o desempenho dos candidatos homessexuais é positivo.

- Tivemos um grande avanço - pondera Reis. - Em 1996, eram apenas 94 candidatos GLBT ou simpatizantes.

O presidente da associação reconhece que ainda é tímida a participação dos candidatos, mas considera que o país está passando por uma reformulação cultural, que inclui a aceitação na política de todos os segmentos. Ele lembra que o primeiro homossexual assumido a ser eleito deputado federal foi o estilista e apresentador de TV, Clodovil Hernandes. Eleito em 2006, Clodovil, que é conhecido pelo teor polêmico de suas declarações, chegou ao Legislativo sem uma plataforma em defesa dos direitos dos homossexuais.

Leo Kret, por sua vez, garante ao eleitorado: quando tomar posse pretende abraçar como sua bandeira a inclusão do parceiro homossexual entre os beneficiários da Previdência Social.