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Escola Brasileira de Cosmologia e Gravitação faz 40 anos

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Nesta semana de 16 a 21 de julho, o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas comemora 40 anos da escola avançada de pesquisas em cosmologia, um encontro bianual de cientistas, cuja difusão internacional lhe conferiu o nome Brazilian School of Cosmology and Gravitation (BSCG). Em 1972 ocorreu a primeira grande reunião de formação de cosmologia, organizada pelo físico francês E. Schatzman, na cidade de Cargèse, na Córsega, que se estendeu por duas semanas. Esse encontro projetou a cosmologia como uma grande aventura do pensamento humano ao expandir a ciência para além de nossa galáxia, uma maravilhosa e estimulante tentativa de envolver a humanidade em um projeto fascinante ao procurar entender como se organizou nosso universo. Assim, a BSCG foi construída aqui tendo por inspiração a escola de Cargèse.

Naquela época, nos anos 70, a cosmologia não era vista pelos físicos com bons olhos. Eles a associavam a questões pouco comuns da física e consideravam suas análises típicas de outros territórios do conhecimento, como associadas à metafísica, o que para muitos significava sua total desqualificação. 

Em verdade, a cosmologia trata de questões grandiosas que não se limitam a experiências terrestres. Ela questiona, por exemplo, os caminhos que o universo seguiu até seu estágio atual. Teve ele um início, como tudo o que é finito à nossa volta, ou o universo é singularmente eterno? E, nesse caso, o que teria provocado sua expansão atual em que o volume total do espaço aumenta com o passar do tempo cósmico? 

A BSCG conseguiu finalmente se firmar como polo de divulgação das novas ideias da cosmologia tendo, naquele momento inicial, o apoio de alguns importantes cientistas brasileiros, em particular do físico Cesar Lattes.

Houve um concerto de razões que contribuíram para o crescimento da cosmologia, a partir da década de 1980, algumas delas intrínsecas a esta ciência, outras totalmente independentes. Somente a título esclarecedor, podemos citar duas razões. Uma, interna à cosmologia, relacionada ao sucesso dos novos telescópios e sondas espaciais, que produziram um enorme conjunto de dados novos, com grande confiabilidade. Outra razão, de natureza extrínseca, foi a crise da física de partículas elementares na década de 70, que requeria para seu desenvolvimento a construção de enormes aceleradores de altas energias, extraordinariamente dispendiosos e cuja construção enfrentava impedimentos políticos na Europa e nos Estados Unidos. Isso dificultava a investigação do comportamento da matéria em situações em que a energia envolvida é extraordinariamente elevada. 

O cenário evolutivo associado à geometria descoberta pelo cientista russo A. Friedman, que descrevia um universo dinâmico, em expansão, foi então o território escolhido para substituir no imaginário dos físicos a ausência de máquinas de acelerar partículas. As causas aceitas para realizar essa substituição estavam associadas ao sucesso da cosmologia. Com efeito, o modelo padrão do universo baseia- se na existência de uma configuração que descreve seu conteúdo material como um fluido perfeito em equilíbrio termodinâmico, cuja temperatura depende do volume espacial total do universo; isto é, quanto menor o volume, maior a temperatura. Assim, nos primórdios da atual fase de expansão, quando seu volume total estava bastante reduzido, o universo passou por temperaturas fantasticamente elevadas, excitando partículas, permitindo assim examinar o comportamento da matéria em situações de altíssimas energias. E, o que era mais conveniente, quase de graça, sem grandes custos: bastava olhar os céus.

Foi nesse contexto que a Brazilian School of Cosmology and Gravitation começou a fazer sucesso nacional e internacional, envolvendo astrônomos, relativistas, cosmólogos e físicos teóricos de campos e de altas energias. Mais importante ainda, a BSCG estabeleceu como lema a sentença de que os argumentos que sustentam um modo padrão de descrever qualquer fenômeno físico não são suficientemente fortes para impedir uma análise distinta baseada em hipóteses diferentes da versão oficial. Pois é do embate de ideias que a ciência progride. Em verdade essa diversidade de pontos de vista não deve nunca estar ausente da prática científica, pois é ela que torna essa atividade significativa. 

Como seria louvável que essa dicotomia se espalhasse por toda a sociedade, permitindo a pluralidade de opiniões. É o que deveríamos ter em uma sociedade democrática. 

* Professor emérito do CBPF