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Seis meses da reforma trabalhista

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A Consolidação das Leis do Trabalho, promulgada em maio de 1943, durante anos sofreu várias alterações em seus dispositivos através de inserção de novos artigos  ou modificações daqueles existentes, pois como se sabe, a legislação que num primeiro momento  regulamenta determinada relação, não consegue acompanhar as  transformações  da sociedade, sejam econômicas ou políticas. Ainda em razão dessa defasagem entre a legislação e essas evoluções, temos a jurisprudência  dos tribunais que amoldam, por assim dizer, a interpretação legislativa com o momento de sua aplicação. 

A maior mudança na CLT ocorreu recentemente, com a Lei 13.467/2017, a chamada reforma trabalhista, que passou a vigorar em 11 de novembro de 2017, em que, nessa norma inúmeros artigos da CLT, sejam no campo das relações e contratos de  trabalho, sejam no âmbito do Processo do Trabalho, sofreram profundas alterações  com consequências imediatas e outras ainda por virem. 

Tal reforma trabalhista teve como mote o fundamento no seu processo legislativo, a necessidade da “modernização” das relações de trabalho, com a conferência de maior autonomia na pactuação dos contratos de trabalho, com ênfase do negociado sobre o legislado e também no argumento de que a defasagem da CLT e a pouca liberdade negocial ali prevista obstava a criação de novos postos de trabalho, em razão do engessamento legislativo então vigente. 

Entre as várias mudanças constantes na reforma trabalhista, podemos apontar a possibilidade do trabalho em tempo parcial, criação e regulamentação do teletrabalho, fracionamento de férias, limitação dos danos extrapatrimoniais, trabalho de empregadas gestantes e lactantes em ambiente insalubre, contratação do autônomo – exclusão da qualidade de empregado, cláusula  de arbitragem, trabalho intermitente, criação e regulamentação da extinção do contrato de trabalho por acordo entre as partes e do processo de jurisdição voluntária, possibilidade do termo anual de quitação de obrigações trabalhistas, além de outras alterações substanciais no que pertine ao Processo do Trabalho. 

Diante da vigência dessa nova legislação, inúmeras dúvidas e questionamentos surgiram acerca do momento de  sua aplicação, se já abrangeria os contratos antigos ou somente os novos, celebrados a partir da reforma, quais as regras para o trabalho da gestante em ambiente insalubre, discussões sobe o parâmetro para fixação do dano extrapatrimonial e também regulamentação sobre o trabalho interminte, figura essa que representou maiores discussões no âmbito dessa reforma. 

Para  que se tentasse disciplinar tais dúvidas, foi editada pelo Executivo a  Medida Provisória 308 em 14 de novembro de 2017, cuja validade termina no dia 23 de abril de 2018, justamente para que fossem procedidos ajustes naqueles pontos mais controvertidos da reforma trabalhista. 

Na MP, basicamente, ficou estabelecido que o empregado somente pode ser dispensado e novamente admitido de forma intermitente depois de  quarentena de 18 meses, regulamenta questões previdenciárias, além de extinguir a multa de 50%  imposta ao empregado quando não atender à convocação, esclarece que a reforma se aplica aos contratos de trabalho vigentes à época de sua publicação, prevê que o valor da indenização terá como balizador o teto do INSS, sendo que essa indenização poderá ser de três a cinquenta vezes o teto, vedou  a contratação por autônomo de forma exclusiva, além de limitar a jornada 12 x 36 para os empregados para saúde mediante acordo individual, indicando que para os demais somente mediante  acordo coletivo. 

Com a perda da vigência dessa MP, o texto da reforma trabalhista voltará a gerar as dúvidas originárias sobre a interpretação de tais questões, que passam a não ter mais uma regulamentação legislativa, acarretando enorme insegurança jurídica tanto para os empregadores  como para os empregados. 

Deve-se observar que, após seis meses da vigência da chamada reforma trabalhista, os efeitos ali pretendidos não se perfizeram até o momento, a nova lei não gerou novos empregos ou postos de trabalho, não só pelo curto tempo de existência como diante da total incerteza jurídica acerca da aplicabilidade de tal reforma. 

A realidade é que, diante da nova onerosidade do processo do trabalho, onde possibilidade da concessão da gratuidade da Justiça ao empregado passou a ser mais rigorosa, com a efetiva possiblidade de pagamento de custas processuais por este, além de honorários sucumbenciais, o número de reclamações trabalhistas no país, nesses seis meses, teve uma drástica redução, também pela dúvida dos advogados sobre a interpretação dessa reforma pelo Judiciário  trabalhista. 

Ainda é prematuro adiantar qual impacto da reforma nas relações de trabalho e nos novos contratos de trabalho. O próprio TST ainda não se pronunciou sobre a interpretação dos aspectos polêmicos da reforma, sem contar que existem várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade em face da reforma. Porém, com o fim da MP 308/2017 em 23 de abril de 2018, tais incertezas somente se avolumarão com estagnação ainda maior do mercado de trabalho, que continuará na expectativa de como proceder diante de tão profundas mudanças nas relações entre capital e trabalho.

* Juiz do Trabalho, titular da 33ª Vara do Trabalho-RJ