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Diferentemente da Rio+20, Cúpula dos Povos supera divergências no texto final

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Assim como no documento elaborado pelos chefes de estado na Conferência sobre Desenvolvimento Sustentável, o processo de redação do texto final apresentado pela Cúpula dos Povos, também foi recheado de divergências. Lá, porém, o consenso foi mais fácil e não houve necessidade de se deixar de lado metas consideradas importantes.

O texto, uma espécie de documento final do que defendem os movimentos sociais e ONGS que participaram do evento paralelo à Rio+20, foi entregue pela manhã ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon , e  foi lido na tarde desta sexta-feira (22) pelos integrantes da Cúpula dos Povos Fátima Melo e Dacir Frigo, no Aterro do Flamengo (Zona Sul da cidade). 

Pesquisador da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", da Universidade de São Paulo (Esalq/USP), o engenheiro florestal João Dagoberto dos Santos enxergou, durante o debate, diferenças de posicionamento entre as grandes ONGs e os movimentos sociais. Segundo ele, que trabalha em contato com camponeses, as organizações internacionais de defesa do meio ambiente pensam na preservação sem levar em conta alguns postos de trabalho que, por ventura, podem depender de interferência em uma área de floresta.

“Como o documento é propositivo e reivindicatório as divergências são naturais. Os movimentos de trabalhadores rurais têm enfoque antropocêntrico, que visa o bem estar do camponês. Já os ambientalistas querem a preservação a qualquer custo”, analisou. "Felizmente, o texto final privilegiou o trabalhador. Posso dizer que 80% da redação privilegiou quem trabalha e o restante observou as demandas dos ecologistas".

Nem todos, porém, ficaram satisfeitos. Para o secretário de Políticas Sociais da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Carlos Rogério de Carvalho Nunes, o debate desagradou quando propôs a interrupção do crescimento econômico brasileiro. De acordo com o dirigente sindical, se a economia do país for freada para reduzir o impacto no meio ambiente, muitos postos de trabalho serão perdidos.

“É consenso que o consumo de combustíveis fósseis deve ser diminuído, ou até estancado. No entanto, essa proposta extinguiria milhares de empregos. O que deve haver, na nossa opinião, é a substituição gradativa por fontes renováveis de energia, como a solar e a eólica. Neste ponto, é muito difícil entrar em acordo com os ambientalistas”, afirmou ele, que lamentou a ideia de estagnação do crescimento econômico proposta pelo documento.

Diretora Nacional da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam),  Veneranda Oliveira Elias comparou a luta do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e da organização que representa. Enquanto o Conam aborda questões relativas a terrenos em áreas urbanas, o MST o faz em áreas rurais. Contudo, as diferenças não param por aí:

“O MST propõe o embate, o enfrentamento, a invasão de terras ociosas para fomentar a produção agrícola familiar. Nossa luta busca abrigar e dar teto para pessoas que não tem meios de consegui-lo. Nosso modus operandi visa a captação de recursos para proporcionar habitação e qualidade de vida. Isso significa transporte de qualidade e moradia próxima ao local de trabalho”, disse ela, que comemorou o acolhimento do diálogo em detrimento do uso da força no texto.

Segundo a coordenadora do Instituto Refloresta, Christianne Godoy, a maior dificuldade para chegar a um consenso aconteceu nas plenárias que abordavam o trabalho.

“Uns defendiam o fomento ao emprego formal, no mercado comum. Por outro lado, outros defendiam o autogestionado, baseado na economia solidária”, lembrou a ambientalista, que viu a segunda tendência preponderar.

Coordenadora-geral da Rede de ONGs da Mata Atlântica, Ivy Wiens observou demora da elaboração de um texto final que abordasse de forma consensual os bens naturais comuns e as obrigações de cada organização.

“O uso de recursos naturais foi complicado. Houve dificuldade em definir um padrão de relação das comunidades com o verde, a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD), os Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), e a parcela de responsabilidade social de cada organização. No final das contas, cada um assumiu sua parte”, relatou.