Operação prende quadrilha na CDD sem atirar
Fernanda Malta, Jornal do Brasil
RIO DE JANEIRO - Nenhum tiro foi disparado durante a operação feita nesta quarta-feira, para desarticular o restante de uma quadrilha de traficantes da Cidade de Deus (Zona Oeste), que, mesmo desarmada, continuou atuando após a ocupação da comunidade pela Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). O secretário estadual de Segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, disse que esta operação servirá de modelo nas próximas buscas em favelas com UPPs.
Estamos subindo um degrau de cada vez, queremos conquistar a confiança da população para que eles percebam que a polícia é parceira, não é preciso ter medo. Ficou provado que a polícia só confronta com armas quando é confrontada. Foi um ato planejado, não podemos comparar com o processo de pirotecnia, que é feito com pressa explicou Beltrame.
Oito pessoas foram presas na ação da 32ª DP (Jacarepaguá), batizada de Operação Fórceps. Três menores foram apreendidos e um homem detido em flagrante com armas e drogas. Entre os presos, está Denair Martins Gonçalves da Silva, 68 anos, mãe do traficante Ederson José Gonçalves Leite, o Sam, chefe do tráfico na favela, que, mesmo preso na penitenciária Gabriel Ferreira Castilho (Bangu 3), em Gericinó, continuava no comando da venda de drogas na comunidade. Segundo a polícia, após a prisão do filho, Denair assumiu a coordenação do tráfico. De acordo com Beltrame, ela foi presidente da Associação dos Moradores local para encobrir ações da quadrilha e contava com a ajuda de Kelly Cristina da Silva, apontada como pombo-correio do bando e também presa nesta quarta-feira. Dos 38 mandados de prisão, 23 já foram cumpridos. Nove outros procurados estariam escondidos no Morro da Chatuba (Complexo do Alemão) e sete em locais ignorados.
Com os bandidos, foram encontrados três revólveres, 39 porções de maconha, dois computadores, oito celulares, 174 porções e cerca de 1,5 quilo de cocaína. Beltrame ressaltou a importância de não ter havido nenhuma morte.
À medida em que quebramos a lógica da cultura de armas, desenvolvemos o trabalho como queremos que ele seja feito. As UPPs permitem rapidez na investigação.
Para o Delegado João Luiz, tão importante quanto prender bandidos, é manter pessoas nocivas fora da comunidade:
O traficante Sam seria solto no ano que vem, provavelmente. Com essas investigações, prorrogamos sua permanência na cadeia.
Mudanças
De acordo com a Secretaria de Segurança, de novembro de 2008 a novembro de 2009, primeiros 12 meses de UPP na Cidade de Deus, os homicídios caíram de 34 para seis, as prisões subiram de 58 para 185, e as apreensões de drogas passaram de 56 para 364.
Polícia Pacificadora
As UPPs já foram instaladas no Dona Marta, Chapéu Mangueira e Babilônia, na Zona Sul; Cidade de Deus, em Jacarepaguá, e Batan, em Realengo, na Zona Oeste.
Além de terminar sem mortos nem feridos, a operação desta quarta-feira, na Cidade de Deus teve alguns lances dignos de uma daquelas comédias policiais non sense. Os cerca de 160 policiais começaram as buscas por volta das 6h, horário considerado inapropriado por alguns bandidos que gostam de dormir até tarde.
Seis horas da manhã!? Mas isso lá é hora de prender alguém!? reclamou um dos bandidos depois de ser tirado da cama em casa e ser algemado pelos policiais.
As cenas dantescas continuaram na 32ª DP, para onde bandidos foram levados e aonde alguns parentes apareceram para protestar, chamando em coro os policiais de ladrões e bandidos , fora os palavrões impublicáveis.
A imprensa também foi alvo de protestos e até de uma agressão: um fotógrafo de 21 anos levou um tapa de Denair Martins Gonçalves da Silva, a mãe do traficante preso que teria assumido os negócios do filho. Sem querer ter sua imagem divulgada na mídia de jeito nenhum, Denair chegou a se esconder debaixo de uma mesa da delegacia, provocando constrangimento e até algumas risadas de jornalistas e policiais. Entre soluços e choro, ela dizia que não era obrigada a aparecer em fotos.
Vou ficar aqui embaixo até os jornalistas irem embora. Só apareço na foto se for morta exaltou-se.
A maioria dos presos parecia conformada, mas um dos dois menores preso dentro de uma casa ensaiou um choro, no que foi prontamente advertido por seu comparsa:
Com um fuzil na mão, você não chora, né?
Na delegacia, quando outro dos presos baixou a cabeça diante dos fotógrafos, outro lhe disse:
Levanata a cara, senão vai perder a moral.
Mas também houve tristeza de verdade, quando o filho de uma das presas gritou para a mãe que partia no carro da polícia:
Mamãe, não vai embora!
