Análise do Código Penal põe em dúvida legalidade da prisão de Garotinho
A prisão do ex-governador do Rio Anthony Garotinho, acusado de compra de voto na eleição de Campos dos Goytacazes, esbarra em questionamentos jurídicos quando se analisa o que diz o Código Penal.
De acordo com o artigo 299 do Código Eleitoral - Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965, "Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:
Pena – reclusão até quatro anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa."
Contudo, o Código Penal especifica, em seu artigo 44, que as penas restritivas de direito substituem as de prisão quando estas não são superiores a quatro anos: "As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;(Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)"
E ainda:
"II – o réu não for reincidente em crime doloso; (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 1o (VETADO) (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)"
Seguindo o que diz o Código Penal, em seu artigo 43, as penas a Garotinho deveriam ser as seguintes:
"Art. 43. As penas restritivas de direitos são: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
I - prestação pecuniária; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
II - perda de bens e valores; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
III - limitação de fim de semana. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 1984)
IV - prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)
V - interdição temporária de direitos; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)
VI - limitação de fim de semana. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)"
Há ainda as condições que determinam a suspensão condicional da Pena (Sursis)
"Art. 77 - A execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I - o condenado não seja reincidente em crime doloso; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
III - Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do benefício.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2o A execução da pena privativa de liberdade, não superior a quatro anos, poderá ser suspensa, por quatro a seis anos, desde que o condenado seja maior de setenta anos de idade, ou razões de saúde justifiquem a suspensão. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
Art. 78 - Durante o prazo da suspensão, o condenado ficará sujeito à observação e ao cumprimento das condições estabelecidas pelo juiz. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - No primeiro ano do prazo, deverá o condenado prestar serviços à comunidade (art. 46) ou submeter-se à limitação de fim de semana (art. 48). (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2° Se o condenado houver reparado o dano, salvo impossibilidade de fazê-lo, e se as circunstâncias do art. 59 deste Código lhe forem inteiramente favoráveis, o juiz poderá substituir a exigência do parágrafo anterior pelas seguintes condições, aplicadas cumulativamente: (Redação dada pela Lei nº 9.268, de 1º.4.1996)
a) proibição de freqüentar determinados lugares; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
b) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do juiz; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
c) comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Art. 79 - A sentença poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Art. 80 - A suspensão não se estende às penas restritivas de direitos nem à multa. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)"
Juristas ouvidos pelo Jornal do Brasil lembram ainda que o juiz eleitoral de Campos determinou que o Garotinho fosse retirado da emergência do Hospital Souza Aguiar, à revelia dos médicos locais, para transferi-lo para o Hospital Penitenciário que não tinha condições de fazer os exames já requisitados pelos médicos do hospital público.
Os juristas destacam que dentro de um hospital, quem manda é o médico, e que não havia qualquer situação de risco ou de fuga, ou ainda impedimento para que a Polícia Federal o acompanhasse ou custodiasse.
Os juristas lembram ainda da Convenção Diplomática que resultou no Terceiro Tratado de Genebra de 1949, que entrou em vigor na ordem internacional em 1950, e no Brasil o Decreto Legislativo n.1 e 1992 e Decreto n.849 de 1993, que é claro ao tratar em seu Art.3-1,C que pessoas postas fora de combate devido a doenças ou ferimento não podem ser submetidas a tratamentos humilhantes e degradantes.
O Art.2 do mesmo tratado deixa claro que os feridos e doentes deverão ser recolhidos e tratados por organismo humanitário imparcial, como a comissão da Cruz Vermelha, dentre outros. Os juristas destacam que a convenção é clara quanto à impossibilidade de o prisioneiro renunciar aos seus direitos, pois a comunidade internacional considera a dignidade da pessoa humana como sendo o principal princípio norteador do ordenamento jurídico internacional e é tão relevante que as nações que não cumprem com o cuidado de zelar internamente pelos direitos humanos em seu país costumam ser excluídas da Organização das Nações Unidas e nem podem participar de algumas comissões.
Para os juristas, a decisão de prisão não se sustenta.
