Senado aprova indicação de Fachin para vaga no STF

Senadores rejeitaram nome de Guilherme Patriota para a OEA

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Vence a dignidade: o Plenário do Senado aprovou nesta terça-feira, por 52 votos a favor e 27 contra, o nome do jurista Luiz Edson Fachin para a vaga de Joaquim Barbosa no Supremo Tribunal Federal (STF). Para ser aprovado, Fachin necessitava, no mínimo, de 41 votos favoráveis.

Antes dessa votação, os senadores rejeitaram a indicação da presidente Dilma Rousseff de Guilherme Patriota para o cargo de representante brasileiro na OEA. Patriota recebeu 37 votos favoráveis e 38 contrários. Ele é irmão do ex-ministro das Relações Exteriores Antônio Patriota.

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A aprovação do nome de Fachin foi a vitória da dignidade. Os senadores votaram pelo país. Não houve nesta indicação a emoção política, o que ocorreu com Guilherme Patriota. Os 38 que votaram contra, se posicionaram contra os interesses do país. Os que derrotaram Patriota proporcionaram uma derrota ao governo, e os senadores da base aliada podem ter contribuído para esse placar.

Sabatina na CCJ

Antes da votação em Plenário, Fachin passou por uma sabatina de 12 horas na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, no último dia 12. O seu nome foi aprovado por 20 votos a 7. Fachin foi indicado pela presidente Dilma Rousseff para ocupar o posto de Joaquim Barbosa, que se aposentou em julho de 2014. 

A sabatina, que contou com a participação popular, foi aberta com muita discussão sobre procedimentos formais a serem adotados na audiência e com reclamações sobre o pouco tempo para apresentação de perguntas.

Na tentativa de suspender a arguição, o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) levantou uma questão de ordem, alegando que Fachin acumulou irregularmente o exercício da advocacia privada com a atuação como procurador do estado do Paraná.

A tese de Ferraço se baseou na suposta violação da Constituição paranaense, de 1989, e da Lei Complementar Estadual 51/1990. A alegação era de que ambas já proibiam o exercício da advocacia aos procuradores antes da nomeação de Fachin para o cargo. O argumento conquistou o apoio dos senadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Aloysio Nunes (PSDB-SP), Ronaldo Caiado (DEM-GO), José Agripino (DEM-RN), Antonio Anastasia (PSDB-MG) e Magno Malta (PR-ES), que votaram a favor de recurso de Ferraço pela suspensão da sabatina do indicado para o STF.

Na outra ponta, 19 membros da comissão derrubaram esse recurso e deram o sinal verde para a sabatina. Antes de se abrir às perguntas dos senadores, Fachin, num discurso de pouco mais de 20 minutos, assumiu um “compromisso garantista” com os direitos fundamentais à família, vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade listados pela Constituição. Ele relembrou a infância humilde a fez questão de destacar a importância da democracia.

"Sou defensor das instituições republicanas e da democracia. Trago posições às vezes controvertidas, mas nunca me escondi atrás das palavras que me fizeram questionar o que me parecia injusto", declarou.

Liberdade de opinião

Foi esse viés polêmico assumido pelo jurista que acabou sendo explorado por muitos críticos à sua indicação. A sabatina foi aberta com a condenação de Aloysio Nunes à acumulação da advocacia privada com a atuação como procurador do Paraná.

"A lei é clara e não comporta duas interpretações. Como pode um edital de concurso prevalecer sobre letra expressa da Constituição? Acho que [vossa senhoria] deveria reconhecer que houve um erro, mas insiste em justificar algo, no meu entender, absolutamente injustificável", ponderou Aloysio.

No entanto, a posição expressada pelo parlamentar tucano não foi unânime dentro do PSDB. Relator da indicação, o senador Alvaro Dias (PSDB-PR) agradeceu a liberdade dada pelo partido para defender uma candidatura “que reputo da maior qualificação técnica”.

"O Paraná está unido em torno do nome de Fachin. A trajetória dele é de independência", assegurou Alvaro Dias, observando que, ao mesmo tempo em que atribuíram ao indicado eventuais relações com o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), seu currículo exibe participação na Câmara Arbitral da Federação das Indústrias de São Paulo e do Paraná.

Questões controversas

Fachin se confrontou com outras questões controversas durante a sabatina, muitas associadas a manifestações já feitas ao longo de sua carreira. Um exemplo teria sido a defesa dos direitos da amante (poligamia) ao prefaciar um trabalho jurídico de pós-graduação publicado em livro.

"A fidelidade é um projeto de vida e de estrutura da família. A Constituição é o nosso limite", afirmou sobre o assunto.

Limites constitucionais também foram invocados para responder a perguntas sobre o direito de propriedade e a desapropriação de terras improdutivas.

"O sistema a que devemos obediência é o que prevê a propriedade como direito fundamental e ressalva a propriedade produtiva", sustentou Fachin, reconhecendo, entretanto, controvérsia doutrinária sobre a função social da propriedade, elemento que norteia os processos de desapropriação.

O senador Ronaldo Caiado (DEM) questionou o jurista Luiz Edson Fachin sobre sua posição em relação ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). No final do ano passado, Caiado enviou uma denúncia à Procuradoria-Geral da República pedindo investigação sobre os acordos entre o MST e o governo da Venezuela. Na ocasião, Caiado dirigiu pesadas críticas ao movimento, afirmando que esses acordos, nas áreas de treinamento e desenvolvimento da comunidade, tinham o objetivo "precípuo de alavancar uma revolução socialista no Brasil".

Veja  vídeo de 2014 no qual Caiado ataca MST:

O jurista, considerado próximo de movimentos sociais, negou ser filiado a qualquer partido político e disse que é contra qualquer tipo de violência por parte de alguns movimentos sociais. De acordo com o advogado, no momento em que os movimentos sociais se deturpam, deve ocorrer a intervenção do Estado por meio do Judiciário.

“Em hipótese alguma, ainda que as pessoas entendam que suas reivindicações são legítimas [defendo o uso da violência]. Ao ultrapassar o limite da violência, aí precisa comparecer o Estado […] Portanto, não subscrevo nenhum tipo dessa violência, muito menos crimes contra as pessoas. E esses movimentos sociais que se deturparam obviamente são movimentos sociais que merecem o rechaço da ordem jurídica”, enfatizou, sem citar o MST.

O jurista disse ainda que está firme em suas convicções democráticas e na defesa das instituições. "Ciente dos desafios que emergem do fato para o direito, cumpre a ordem jurídica controlar todos os poderes, inclusive a autocontenção do judiciário. Paixões e ideologias cederam ao respeito às regras do jogo", disse Fachin.

Ele citou ainda o cientista político italiano Norberto Bobbio para dizer que é preciso respeitar as regras do jogo na democracia. Suas citações e referências foram amplas, incluindo ainda o papa Francisco, o sociólogo Max Weber, os físicos Albert Einstein e Isaac Newton, e os matemáticos antigos Arquimedes e Pitágoras.

Fachin se considera um progressista

Em relação às declarações políticas, Luiz Fachin disse que é alinhado com as pessoas que querem o progresso do país. Nesse sentido, afirmou que se considera um progressista, mas preservando direitos, interesses privados e as liberdades individuais.

“Não tenho nenhuma dificuldade e nenhum comprometimento, caso eventualmente venha vestir a toga do STF, em apreciar e julgar qualquer um dos partidos políticos da Federação, sejam eles de quaisquer aspectos ideológicos ou programáticos", disse.

Fachin: voto em Dilma não compromete julgamento de políticos

O advogado Luiz Edson Fachin disse ainda que o fato de ter pedido votos publicamente para a presidente Dilma Rousseff não afetaria sua isenção para julgar questões de interesse de qualquer partido. A pergunta foi direcionada pelo líder do PT no Senado, Humberto Costa (CE), que está na lista de investigados da Operação Lava Jato.

“Gostaria de salientar que não tenho nenhuma dificuldade, nenhum comprometimento, caso venha a vestir a toga, a julgar qualquer um dos partidos, e digo isso com a franqueza da alma”, disse Fachin, aos senadores. Em 2010, o advogado assinou um manifesto de juristas em apoio a Dilma e foi convidado para ser o porta-voz do grupo em um evento.

Para sustentar sua posição, o indicado usou o exemplo do ex-ministro Joaquim Barbosa, que abriu seu voto em entrevistas à imprensa e isso não prejudicou sua atuação no Supremo. O relator do mensalão disse ter votado em Lula e Dilma, e votou pela condenação de petistas no julgamento do mensalão.

“Para a vaga a qual estou indicado, tivemos o ilustre ministro Joaquim Barbosa que chegou a dizer que votou em esse ou aquele candidato e não preciso lembrar da sua convicção do que é fruto da sua percepção”, lembrou.

Direito à propriedade

Fachin respondeu também sobre a questão do direito à propriedade e o entendimento do uso social. Ele recorreu mais uma vez ao entendimento constitucional, que estabelece critérios quanto à produção da terra para definir qual seu perfil de uso e os casos em que cabe a desapropriação para fins de reforma agrária. Fachin reconhece no direito à propriedade um direito constitucional fundamental e considera a produtividade e a função social como ressalvas a este direito. "A reforma agrária atua nas ressalvas e mediante prévia e justa indenização".

Mensalão

Ao responder outra pergunta do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) sobre o mensalão, Luiz Fachin disse que o Supremo deu uma resposta à sociedade brasileira, visto que os ministros aplicaram a lei no caso concreto, e as decisões se deram por maioria dos integrantes do tribunal. Fachin ponderou não ter conhecimento dos autos e provas sobre o esquema de compra de apoio político deflagrado no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O Supremo Tribunal Federal, ao julgar como julgou, deu uma resposta à sociedade brasileira”, disse o advogado e professor de Direito Civil da Universidade Federal do Paraná. “Os ministros do Supremo, cada um, à luz de suas convicções, procuraram fazer o raciocínio lógico dedutivo e aplicar a lei ao caso concreto nas decisões que foram por maioria”.

Financiamento de campanha

Questionado sobre o financiamento privado de campanhas eleitorais, tema de ação de inconstitucionalidade a ser analisada pelo STF, Fachin disse que em alguns momentos a Corte “desborda” de suas funções.

“Vou dizer isso com o devido respeito à Corte Suprema do Brasil, há certas circunstâncias que o Supremo não deve atravessar a rua”, afirmou, ponderando que fala “em tese” e de maneira genérica.

O jurista disse que “provavelmente” não participará, se aprovado para a vaga, da discussão do tema, uma vez que o ministro Joaquim Barbosa já se posicionou sobre o assunto.

Fachin defende aprofundamento do debate sobre redução da maioridade penal

O jurista Luiz Fachin defendeu também o aprofundamento da discussão sobre redução da maioridade penal com a sociedade. Segundo ele, o Congresso Nacional tem a primazia no debate. Mesmo sem posicionamento a favor ou contra a redução da maioridade de 18 para 16 anos, Fachin informou que considera essa cláusula como pétrea na Constituição, ou seja, que não pode ser alterada.

Ainda sobre redução da maioridade penal, ele apontou aspectos que devem ser analisados, como a ressocialização dos jovens pelo sistema prisional. "Talvez uma saída seja discutir as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente", explicou Fachin.

Relacionamento fiel

O advogado também esclareceu outra polêmica. Em relação às acusações de que teria pregado a poligamia em artigo acadêmico, afirmou que tem como um de seus "princípios fundamentais" a estrutura de família. "Os valores familiares têm base e assento na Constituição Federal", acrescentou.

"O que se disse a partir de trabalho acadêmico coloca em questão a distorção que pode levar alguns princípios da família. Eu defendo a estrutura de família com todos os seus princípios fundamentais”, destacou.

“A Constituição é nosso limite. Dentro desse limite, ela prevê as possibilidades e, portanto, o relacionamento fiel. A fidelidade é um projeto de vida e é da estrutura da família. Essa é a dimensão monogâmica, que é um princípio estruturante da família. Acredito que meu comportamento é de família, a família que se tem. Talvez a prova do que estou dizendo seja o alto dos bons 37 anos de casamento, dos quais só me arrependo por terem sido só 37 até agora”, concluiu.

Aborto

A senadora Ana Amélia (PP-RS) questionou Fachin sobre aborto. "O senhor entende que o direito à vida, assegurado pela Constituição, admite algum tipo de relativização frente as práticas de aborto, eutanásia e destruição de embriões?", perguntou a senadora.

"Eu já tive a oportunidade de me manifestar e responder de maneira clara e objetiva: defendo a vida em sua dignidade e sou contra qualquer forma de interrupção que venha ocasionar um atentado à vida, seja no início ou no fim dela", respondeu Fachin à senadora.

Técio Lins e Silva elogia desempenho de Fachin na sabatina