Gerações Carcará 

Por Maria Lucia Dahl

Estamos vivendo uma espécie de Geração Carcará, aquela que “pega, mata e come”. Só que acho que os jovens de hoje não entenderam bem o que Nara Leão, Maria  Bethânia e Chico Buarque queriam dizer com a letra da música Carcará, composta por João do Vale e lançada no Teatro Opinião, nos anos 60, simbolizando a vida difícil dos sertanejos mortos de fome, comparando-a à ave Carcará, que tem que matar pra sobreviver no interior do Maranhão.

Mas tudo tinha um significado ideológico na época, e o carcará, nos anos 60, era considerado um herói que matava pra comer e sustentar a família, embora fizesse qualquer coisa pra alcançar o seu objetivo.

“Carcará, pega, mata e come

Carcará num vai morrer de fome...

Carcará, mais coragem do que homem...”

Os ”carcarás”, na época, simbolizavam uma juventude que lutava pelo povo, se arriscando a ser assassinada pelas ditaduras militares.

Era um conflito intenso, uma guerra ininterrupta a favor do bem, o que infelizmente se transformou, hoje em dia, no contrário da ideologia da época que virou o mundo, tornando-se cego pra ele, e como o outro lado do carcará ideológico, ele pega mata e come por qualquer motivo egocêntrico, tal a gangue dos traficantes que mataram sete jovens  por ouvirem funk da facção rival.

Antigamente, o legal era o altruísmo, poder curtir diferentes gostos, tanto em arte como em jogos, fossem eles de futebol, tênis, enfim, jogos em geral, pois o que interessava no mundo era a troca que nos ensinava a aprender o melhor dos lados diferentes da vida.

O teatro Opinião, as passeatas dos jovens, os cantores da época de Carcará, formavam um grupo enorme que lutava pelo bem, mesmo que tivessem que ser presos, sacrificando-se pelo país e pelo mundo em geral.

Agora não tem diálogo. Se você não gosta da mesma música que eu, não torce pelo mesmo time que eu torço, pego, mato e como com o maior dos orgulhos.

O quente hoje em dia é ser um bandido famoso que mata pra virar celebridade e sair nos jornais, novos carcarás de ideologias opostas às dos anos 60, que pegam, matam e comem pra satisfazer o ego. E o resto que se vire com sua mania antiquada de fazer o bem.

Mas, graças a Deus, embora seja a minoria, ainda existe gente que pensa no próximo como o seu semelhante, e não como o próximo da fila, por exemplo, como um grupo de jovens que saiu pelas ruas abraçando as pessoas, num movimento pela paz, alem de gente que acha dinheiro na rua e o devolve ao dono, fora as instituições que só fazem o bem em vez da maldade que assola o país, achando que o negócio é o seguinte: não tem seguinte!

 Mas a nossa luta continua... E nessa constante luta entre o bem e o mal, se nos esforçarmos como quando vencemos a ditadura, quem sabe voltaremos a ser carcarás do bem que não pegam nem matam pra comer, apenas saem voando e cantando: carcará!...

“que era um bicho que avoa que nem avião.

Os burrego que nasce não pode andar

Ele puxa no umbigo inté matar

Carcará, pega, mata e come

Carcará mais coragem do que homem

Carcará é malvado, é valentão

É a águia de lá do meu sertão

Carcará

Pega, mata e come!”