O que está por trás da cultura de ódio nas campanhas eleitorais? 

Por Walmyr Junior *

Em um dos seus discursos durante a jornada Mundial da Juventude (JMJ), em que se encontrou com os voluntários no Riocentro, o Papa Francisco proferiu as seguintes palavras:

“Na cultura do provisório, muitos pregam que o importante é curtir o momento, que não vale a pena comprometer-se por toda a vida, uma vez que não se sabe o que reserva o amanhã. Peço que vocês sejam revolucionários, que vão contra a corrente. Sim, nisto peço que se rebelem, que se rebelem contra a cultura do provisório. Eu tenho confiança em vocês, jovens, tenham a coragem de ir contra a corrente, tenham a coragem de ser felizes”.

Inspirado por essa motivação do Papa, consultei diversos amigos pelas redes sociais e pude pegar um pouco daquilo que pensam sobre o desejo de fazer revolução contra essa cultura do poder e do ódio que vem permeando os debates pré-eleitorais. 

Artur Lagos, que é psicólogo, se surpreende ao ver um “movimento antidemocrático no ar meio latente e subjacente ao senso comum que a mídia coloca quando se vê os debates e os discursos, são sempre em prol de atacar o poder ao invés de analisar e propor constituições. Nessa eleição isso ficou claro daria a frase de ato falho de marina que virou slogan: o poder pelo poder." 

Já o assessor de comunicação da Diocese de Duque de Caxias Adielson Argrelos percebe um certo tipo de incoerência nesse processo eleitoral. Para ele é fácil ver “jovens que dizem que votarão em candidatos como Tarcísio Motta do PSOL e ao mesmo tempo votarão em Aécio Neves do PSDB. Ou seja, não há mais uma linha ideológica, mas o individualismo típico das mídias digitais. Porém o mais complexo de tudo é a desinformação, ou melhor, a negação pela busca de informações”.

Desesperança. Essa é a palavra que define esse processo eleitoral para a designer Anna Carol Bayer. Segundo ela “uma eleição onde você não vê propostas concretas, mas sim ataques por todos os lados, não nos permite ver uma perspectiva de futuro construtiva. Como votar com o ideal de votar num menos pior? No nível nacional, o quadro é mais claro. Tem os pró-Dilma e os contra-Dilma. Não importa quem é o outro candidato. No nível estadual é votar num voto perdido sabendo que o segundo turno pode ser Pezão e Garotinho. Parafraseando o ilustre candidato Tiririca em suas ultimas eleições ‘Pior que tá fica sim’.”

A cientista social Alessandra Nzinga não encontra perspectivas para essa eleição. “Não há sob meu ver, nenhuma novidade, nenhum candidato apresentou nada de novo, nem os do Psol. O debate só serviu para mostrar que é uma lavagem de roupa suja, quem tem a boca maior engole o outro. Os candidatos ao governo do Estado pareciam estar combinados para atacar determinados candidatos. A maioria encaminhava a pergunta para o adversário com o intuito deste bater no candidato alvo. Isso abriu brecha para que Tarcísio, bom politico que é, no meu entendimento, batesse em todo mundo. Pareceu estar fora do acordão. As vésperas das eleições não sei em quem votar e os debates não me ajudaram, não vejo, neste contexto, que haverá uma nova alternativa."

Cleiton Ramos, estudante de Comunicação, vê com muita naturalidade o clima tenso entre os debates. Para ele a tensão é normal “afinal, estamos para decidir sobre quem governará nosso país pelos próximos anos. Essa tensão está dentro dos limites de uma democracia. Sinceramente, não vejo reprodução de ódio. Acho que discursos inflamados e falaciosos de alguns candidatos acabam elevando os picos emocionais, mas nada que prejudique a democracia. Existem pronunciamentos que abrem margem a livre interpretação e isso é perigoso. Vemos a Luciana Genro, por exemplo, proferir um discurso de apoio às minorias e dizer que os discordantes deveriam ser presos. Discurso leviano, que inflama eleitores fanáticos e ignorantes. Acredito no respeito mútuo e na liberdade de expressão. Confio que o Brasil será um país melhor depois dessas eleições”.

João Hertal, estudante de Direito, analisando o processo eleitoral, não tem algo especificamente que possa falar, mas garante ver uma clara uma polarização de concepções de gestão e de governo. Para João, “a Dilma representa o projeto que sustenta o desenvolvimento do Brasil, com inclusão social, geração de empregos, valorização do salário mínimo fortalecimento da soberania, e Aécio e Marina representam o projeto anterior a esse ciclo de transformações do país, o projeto privatizante que ataca os direitos trabalhistas, o emprego e a renda do trabalhador.”

Adrielle Saldanha é Conselheira Nacional do Conjuve (Conselho Nacional de juventude) e se coloca totalmente contrária a onda de ataques aos partidos “seja ele PT ou de outro. Sou totalmente contra essa onda de ódio. Acredito que cada um pode ter sua opinião sobre a política que temos no país, mas não vejo a necessidade de emanar opiniões que incitem a violência ou coisa do tipo. Os partidos existem porque a democracia é livre. Quem não está de acordo com a política que temos no país deve nessas eleições e no dia a dia tentar mudar a realidade que veem. A juventude reproduz aquilo que encontram na sociedade e não podemos incitar a violência como estamos vivenciando nos últimos tempos”

"Vejo nessa disputa eleitoral um grupo de políticos desvencilhando-se das políticas sociais petistas de inserção do pobre na sociedade, e aproximando-se de um projeto neo-liberal que tem o intuito de minimizar a presença do Estado no desenvolvimento das potencialidades individuais. Alguns candidatos presidenciáveis vêm reproduzindo um protecionismo aos projetos sociais do governo federal, como o ‘Bolsa família’ e o ‘Minha casa minha vida’, com a intenção de instrumentalizar esses projetos em favorecimento dos interesses privados de poucas famílias que ainda detém o monopólio econômico do país." 

Na contramão das decisões patrimoniais de pequenos grupos surgem ondas de resistências sociais no espaço público que clamam pela radicalização da democracia.  Esse grito de liberdade quer romper com os financiamentos privados de campanha, quer romper com os favorecimentos pessoais e as ofertas de cargos políticos, quer romper com o capital especulativo que impede os mais pobres de terem direito à cidade, que não se sentem confortáveis com as precarizações de alguns serviços públicos. Esse pobre que precisa de mais educação e quer a valorização da sua cultura. Esse pobre precisa de mais saneamento e mais moradia. Esse pobre quer ter direito à sua cidade e ter mobilidade sobre ela. Esse pobre precisa de um governo que vai mudar mais, e não de um governo que vai governar apenas para uma elite econômica. Essa elite que quer governar o país olha para a pobreza e enxerga um exército de mão de obra desqualificada, que será explorada pelas suas empresas e que não merece ter os mesmos privilégios/direitos/qualidade de vida que os seus pares. 

* Walmyr Júnior é professor. Representante do Coletivo Enegrecer no Conselheiro Nacional de Juventude - CONJUVE. Integra Pastoral da Juventude e a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ.