Dom Orani João Tempesta, O. Cist.: Beata Irmã Dulce

Por Dom Orani João Tempesta

Neste domingo, 5º da Páscoa, a Igreja no Brasil terá a alegria de ver subir às honras dos altares, como Beata ou Bem-Aventurada, aquela que já em vida foi cognominada o “Anjo bom da Bahia” – a Irmã Dulce – amiga e companheira dos pobres e desvalidos. Seu itinerário de santidade, no qual a Igreja reconhece as suas virtudes heroicas, é um caminho marcado humana e naturalmente por incompreensões, mas que, sobrenaturalmente, tocou os corações endurecidos, para que na meiguice de quem pedia não se deixasse faltar o essencial aos mais pobres, ensinando a todos a partilhar, mesmo o pouco que tinham. A data coincide com a Memória de Santa Rita que, como cai no domingo, neste ano não é celebrada, mas nos mostra outra mulher forte que em outra época viveu a fé e é sinal até hoje da providência de Deus em sua vida. 

Em nossa mudança cultural, a mídia utilizou o termo “beata” de uma maneira imprópria e, em nosso linguajar comum, acabamos acolhendo esse tipo de interpretação que, inclusive, está em nossos dicionários. Cabe a nós restaurarmos o verdadeiro uso da palavra e valorizá-la. Muitos vocábulos importantes já foram deturpados em nossa língua. Que a Beata Irmã Dulce interceda por nós para que consigamos anunciar o Evangelho e levar as pessoas a fazer da nossa cultura uma cultura de valores humanos e cristãos que ajudem a transformar esta situação de violência, corrupção, medo, destruição e divisão que ora ocorre.

O Beato João Paulo II, quando em sua visita ao Brasil, disse que o Brasil precisava de Santos. Eles existem, não é a Igreja que os “fabrica”, apenas constata com um processo minucioso a vida e as virtudes daqueles e daquelas que o povo já tem em conta de “santos”. E vai muito mais além, para a beatificação e canonização supõe também um milagre por intercessão e da invocação do nome de quem pedimos a Deus. Milagre esse comprovado por médicos e cientistas, demonstrando que não tem outra explicação que não seja uma intervenção especial.  

Irmã Dulce fez, de modo extraordinário, aquilo que cada cristão deve fazer ordinariamente, ou seja, no dia a dia: exercer a caridade, fazer-se oferta pelo outro, ver no outro a presença do Cristo Ressuscitado, sobretudo daqueles que mais sofrem e que estão à margem, dando-lhes a certeza de que possuem sua dignidade e que Deus lhes manifestará com predileção o seu amor, pois vem em socorro dos pobres e oprimidos.

Tirar o pobre da mais profunda miséria dos bens materiais, da fome, foi aquilo que fez o “Anjo bom do Brasil”, sem que tivesse, entretanto, bens materiais, nunca deixou de acreditar na Providência Divina, que jamais lhe faltou, pois nela confiava, e, quando a ela rogava, tudo lhe chegava, nunca acumulando, mas partilhando e fazendo multiplicar para evitar a fome de tantos.

Preocupar-se com os que estão à margem e comprometer-se com a necessidade de mudança, pois, em país como o nosso, com tantas dádivas de Deus, não poderíamos ter pessoas que passam fome se houvesse justiça mais distributiva, que nasce da capacidade de por em comum bens que a todos pertencem. Se uma pobre como a Irmã Dulce pôde fazer tanto para tantos, como não poderia ser diferente o nosso país se todos tivessem a mesma disponibilidade de pensar no seu irmão com responsabilidade, e assim multiplicar dons que Deus nos concede.

Sabemos que a ação social para as pessoas necessitadas precisa resolver com urgência a fome, e por isso parece como se fosse apenas assistencialista, mas sabemos que esse primeiro passo leva à formação e questiona a transformação social, econômica e política. 

A Igreja do Rio de Janeiro se une à Igreja Mãe de São Salvador da Bahia na ação de graças pela beatificação da mulher que cuidou dos mais pobres. Cumprimento o arcebispo Dom Murilo Sebastião Ramos Krieger, e o Legado Pontifício,  Geraldo Majela, Cardeal da Santa Igreja Romana, Agnelo, pela alegria eclesial que proporcionam ao povo da Bahia e do Brasil pela santidade da fidelidade e do serviço da religiosa elevada às glórias dos altares. 

Que interceda por nós o “Anjo bom do Brasil”, a bem-aventurada Irmã Dulce, para que todos, desde os mais simples até os mais importantes, que em verdade deveriam estar à testa para servir, sejam capazes de aprender a partilhar, a fazer de modo extraordinário, o ordinário de repartir o pão com os necessitados.  Beata Irmã Dulce, interceda por nós!