Crítica | Natimorto | Faz jus ao título

Por Paulo Marcio Vaz

Fazendo jus ao título, Natimorto é um filme denso e nada fácil para o espectador em geral, por diversos motivos. Um deles é o ritmo lento, para não dizer arrastado, da trama, baseada no livro Natimorto, um musical silencioso, de Lourenço Mutarelli. E é justamente o escritor o responsável pelo segundo motivo da dificuldade:  é ele quem encarna um dos personagens principais, um suposto caça-talentos que passa praticamente todo o tempo da trama sem sair de um quarto de hotel, onde vive um curto período com uma suposta cantora descoberta por ele. Um papel talvez difícil demais para um ator em seu primeiro filme.

Numa linguagem que beira o experimentalismo, o diretor Paulo Machline corta um dobrado para fazer de Natimorto um filme interessante em alguns momentos. Para isso, conta com a ajuda da atriz Simone Spoladore, que, mais experiente que seu colega de protagonismo, capta bem o espírito da coisa e deixa transparecer boas doses de talento.

Na trama, o caça-talentos traz a jovem cantora a São Paulo para apresentá-la a um maestro, capaz de fazer a carreira da moça deslanchar. Enquanto não chega o dia do teste, ela é levada até um hotel, onde seu descobridor revela a intenção de permanecer hospedado com ela. O detalhe é que ele faz questão de nunca sair do quarto, nem para uma voltinha no corredor, dando início a um modo de vida sui generis, mas aceito, em parte, por sua parceira. Cerca de 80% do filme se passa no quarto, com o personagem vivido por Mutarelli passando os dias praticamente à base de café e cigarros, e dividindo seu tempo entre a solidão e a presença de sua diva, que, ao contrário dele, não deixa de sair à rua

Outra peculiaridade do personagem de Mutarelli é sua obsessão por tentar adivinhar o destino dele e de sua parceira por meio das deprimentes fotos contidas nos maços de cigarro – que ambos fumam o tempo inteiro – numa inteligente analogia entre as imagens dos maços e as cartas do tarô.

Apesar de estranho, Natimorto tem lá seus momentos interessantes. Mas não são muitos.