Crítica | Homens e deuses | Relato de um massacre
Embora com forte cunho político, Homens e deuses, de Xavier Beauvois, guarda seu foco mais agudo para um drama humano. A história é inspirada no massacre de monges católicos em Tibhirine, na Argélia, em 1996, supostamente por terroristas islâmicos, recriando o que teriam sido os últimos meses de vida dos religiosos, que prestavam socorro espiritual e médico à comunidade que existia em torno de um mosteiro.
Protagonizado por Lambert Wilson e Michael Lonsdale, o filme detalha o cotidiano dos monges e o sentimento de angústia crescente que vai tomando conta dos religiosos à medida que os extremistas e o exército argelino se enfrentam.
Alguns monges querem abandonar o monastério, mas o Prior Christian de Chergé – que foi um dos mártires do massacre – pede que eles reflitam, destacando a importância de que a decisão seja coletiva. Uma cena extraordinária, com a câmera fechada no rosto de velhos atores, faz uma alusão ao quadro A última ceia, ao som de O lago dos cisnes, de Tchaikovsky.
O produtor e roteirista Etienne Comar se valeu dos arquivos de imprensa, dos jornais escritos pelos monges e das anotações de Chergé, caracterizadas por uma sólida vocação em favor do outro, em particular os irmãos muçulmanos.
Para reunir todos os elementos da história, foi preciso construir um retrato monástico detalhado dos princípios seguidos pelos monges trapistas, inclusive a tensão pela qual estavam passando, o que pode ser percebido até nas letras das inúmeras orações que são reproduzidas no filme.
No desempenho expressivo do elenco, fica evidente que o fato de os atores se sentirem tocados pelos laços de amor entre os monges e a população muçulmana foi um dado importante para o resultado final.
O filme – que ganhou o grande prêmio do júri em Cannes e o troféu ecumênico que reconhece produções com cunho social e humanístico – busca uma atenção especial dos espectadores.
A narrativa é calma, meditativa, algumas sequências são reiterativas, mas é uma obra necessária que reflete sobre a essência dos seres humanos, da riqueza e da profundidade do relacionamento entre eles.
