Leandro Mazzini: Memória

O coração bate forte ao ver a sigla

Por Leandro Mazzini

Confesso que não dormi bem naquela noite de 2001, na véspera da publicação de minha primeira reportagem – pequena, mas com um grande esforço de apuração – no grande Jornal do Brasil. Mal o dia raiou, e desci à banca da rua de Icaraí, em Niterói, e comprei o exemplar. Estava lá na página 2, no rodapé, num box bem delineado e com charge do Liberati. Que estreia!, pensei. Comemorei muito. Eu e uma amiga. Brindamos taças de proseco. Apesar de feliz com a conquista, com a confiança dos editores, foi uma celebração, não a mim, mas uma homenagem pessoal minha ao nobre jornal. 

Creio que, desde a minha estreia em agosto de 2000, naquelas madrugadas de agosto cobrindo a Olimpíada de Sydney pelo JB Online, nada em mim mudou. Comemoro até hoje cada publicação minha – e também as grandes reportagens dos colegas, ou artigos dos mestres – como uma conquista diária e saborosa. Como se eu sentisse a cada dia aquele proseco a descer a garganta e conquistar o coração, esse que palpita a cada segundo ao ver a sigla; pelo desafio de uma pauta, pela publicação da notinha na coluna, ou da reportagem especial, pela dica dos mais velhos ou pela energia passada pelos novatos; esse coração bate a cada segundo ao publicar algo no online e no Digital e saber que a notícia ganhará milhares, talvez milhões de leitores em poucos minutos. Nada muda para um coração de um jornalista. 

Em praticamente dez anos de jornal – fiquei ausente em 2004 e 2005, embora não distante – protagonizei, em editorias variadas, principalmente em País, a função do repórter apaixonado pela notícia. Mas me lembro especialmente de duas delas. Ainda no primeiro ano de JB (ah, aquele prédio da Avenida Brasil, 500), atendi um telefonema de um homem desesperado. Era um taxista que não encontrava lugar em maternidades ou hospitais públicos para a mulher fazer o parto do filho. Mobilizei-me na apuração. Ao fim do dia, com algumas postagens no JB Online e cobranças à prefeitura, o motorista e mulher já estavam alojados e bem tratados. Dois dias depois, recebia a ligação de agradecimento do taxista. O filho nascera. O JB havia ajudado, de certa forma, no parto. Voltei feliz para casa. Muito. Outra história, fruto do acaso, foi a deste navio na foto de João Paulo Engelbrecht, menção honrosa em prêmio no Rio. Dia de batismo do navio off-shore num estaleiro da Ilha do Governador. Depois de fogos, bandinha, champanhe no casco, a carreira que faria o gigante descer à água travou. Já passava das 17h, e a maré recuava, quando um dos operários, numa atitude desesperada, tentou empurrar sozinho a embarcação de 6 mil toneladas. Todos assistiam, perplexos, ao esforço, em vão. Não se sabe como, por obra divina ou do próprio mecanismo, de tanto o homem tentar, a carreira destravou e o navio foi ao mar, para euforia do povo. E mais foguetório. 

No dia seguinte, só o JB e o Jornal do Commercio emplacaram nas primeiras páginas a foto emblemática. Titulei a matéria à altura daquele herói: Hércules dos Mares, no dia 21 de julho de 2001.

Aquele homem, sem camisa, triste, suado, sujo, sumiu esbaforido e exausto em meio à multidão. Uma pena, gostaria de conhecê-lo. Fica ao ilustre desconhecido a minha homenagem de cidadão. Ele me ensinou, de certa maneira, na função de repórter, a lutar. Independentemente do tamanho do desafio.