Mundo de olho em Bolsonaro

Presidente eleito do Brasil é saudado por autoridades estrangeiras, mas não escapa de críticas

Por JOHANNS ELLER*

Em sentido horário: Vladimir Putin (Rússia), Emmanuel Macron (França), Iván Duque (Colômbia) e Pedro Sánchez (Espanha) saudaram eleição

A vitória do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), após o segundo turno das eleições presidenciais no último domingo, foi recebida com cautela por autoridades europeias. O tom de defesa da democracia foi unânime entre os governos francês e espanhol, além da União Europeia (UE), e contrastou com as celebrações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e de chefes de Estado conservadores na América Latina. Elogios ao processo eleitoral e democrático, no entanto, foram praticamente unânimes nas declarações.

Para o embaixador e conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) José Alfredo Graça Lima, as declarações enfáticas em defesa do processo eleitoral refletem o esforço em manter as portas abertas para o Brasil. “Fiquei pessoalmente surpreso com manifestações de lideranças que não concordam com o ideário do presidente eleito, mas louvaram o processo eleitoral. Tudo isso cria um clima bastante favorável para essa integração, independentemente de considerações políticas”, avalia Graça Lima.

Na América Latina, o tom dos presidentes da Colômbia, Iván Duque, e do Paraguai, Mario Abdo, foi de euforia. Ambos foram eleitos esse ano favorecidos por movimentos conservadores. Já a Venezuela, cujo governo é alvo de críticas do político do PSL, parabenizou os brasileiros pela “celebração cívica”.

Entre as autoridades europeias, no entanto, houve ressalvas após um segundo turno tumultuado por declarações extremistas do presidente eleito. O presidente da França, Emmanuel Macron, felicitou a eleição de Bolsonaro, mas cobrou do futuro dirigente brasileiro o respeito às instituições. Apesar de estar na Europa, o país compartilha sua maior fronteira com o Brasil, através do território da Guiana Francesa.

“A França deseja prosseguir sua cooperação com o Brasil em um marco de respeito a estes valores, para enfrentar os grandes desafios contemporâneos de nosso planeta, tanto nos âmbitos da paz e segurança internacionais, como no marco da diplomacia do meio ambiente e do Acordo de Paris sobre o clima”, declarou o comunicado do Palácio Eliseu. Já Aurore Bergé, porta-voz do partido de Macron, A República em Marcha, posicionou-se contra a eleição de Bolsonaro. “Nenhuma democracia está livre. Os democratas e liberais têm a obrigação de reagir. Nós estamos conscientes e sentimos esse fardo porque ele nos lembra contra quem fomos eleitos”, declarou Bergé, em referência a Marine Le Pen, da Frente Nacional. A líder da extrema-direita parabenizou Bolsonaro pelas redes sociais e sentenciou que os brasileiros haviam sepultado “a corrupção generalizada e a aterrorizante criminalidade que prosperaram nos governos de extrema-esquerda”.

O primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, não parabenizou Bolsonaro e optou por se dirigir à população do país. “O povo brasileiro decidiu seu futuro para os próximos anos. Os desafios serão enormes. O Brasil contará com a Espanha para alcançar uma América Latina mais igual e mais justa”, publicou o premiê de centro-esquerda no Twitter.

Na Rússia, o Kremlin emitiu um comunicado do presidente Vladimir Putin felicitando o futuro dirigente brasileiro e expressando confiança “na promoção de todo o complexo de laços russo-brasileiros, bem como na cooperação construtiva no âmbito das Nações Unidas, do G20, dos Brics e de outras organizações multilaterais”. O Brasil presidirá o Brics em 2019 e sediará a cúpula anual do grupo.

A oportunidade de fomentar o comércio, de acordo com Graça Lima, será um dos pilares já sinalizados pelos virtuais ministros da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), e da Economia, Paulo Guedes. “A política externa deve se destacar pelo comercial, sem que isso se torne violatório de seus preceitos e da proteção do meio ambiente. O Brasil tem essa vocação universalista. Isso é integração”, opina.

Dentro da UE, no entanto, houve críticas contundentes. O comissário europeu para a Economia e Comércio, o francês Pierre Moscovici, declarou ontem que Bolsonaro “é evidentemente um populista de extrema-direita” e que, atrás dele, “vemos a sombra dos militares que estiveram por um longo tempo no poder no Brasil, constituindo uma ditadura terrível”.

Moscovici é uma das pessoas mais influentes no bloco europeu, o que levou Bruxelas a abrandar o posicionamento. Na sequência de suas declarações, feitas à TV do Senado francês, o discurso do comissário deu lugar ao da porta-voz da Comissão Europeia, Natasha Bertaud. Ela citou brevemente o clima de apreensão com o futuro governo brasileiro. “Esperamos de todo futuro presidente que trabalhe para consolidar a democracia, para o bem do povo”, disse Bertaud. O presidente do órgão, Jean-Claude Juncker, e o dirigente do Conselho Europeu, Donald Tusk, devem enviar uma carta para Bolsonaro em breve.