Crítica: 'A era do gelo 4'

Por Jefferson Almeida

O leit motiv do novo longa de animação da Fox é uma espécie de desastroso efeito borboleta: Scrat, na obstinada perseguição da sua noz fugitiva, consegue, num golpe de acaso, causar, entre outras coisas, o cataclismo que transformou a Pangéia nos continentes que, hoje, conhecemos, através do efeito da deriva continental.

A Era do Gelo 4 é, aliás, um filme à deriva. Deriva esta que tem início quando o carismático esquilo, finalmente, agarra a sua noz e a coloca no chão. De repente a montanha racha-se e começa a se abrir separando as massas de terra; Scrat é arremessado ao núcleo terrestre, ocasionando terríveis terremotos, que por sua vez acabam isolando Manny, Diego e Sid do resto do bando. Inicia-se, então, um grande épico marinho, às vias de Odisseia, na tentativa de devolver o trio à sua casta. E parece estar aí o cerne dos, agora, quatro filmes da franquia: o desenvolvimento do conceito de “bando” como sendo uma família – real ou escolhida – onde os membros se protegem, acima de qualquer diferença e/ou dificuldade.

No meio do oceano, em gozo da mais profunda dor de se ter apartado dos seus, parece que nada mais acontecerá, visto que não há muito o que fazer numa ilha flutuante de gelo que mal cabe seus obrigados habitantes. Mas, a mente inventiva da equipe de roteiristas faz sair, deste ambiente hostil o grande trunfo deste A Era do Gelo. Uma personagem que ganha, na sua estreia, contornos de criação antológica. Trata-se da avó de Sid, adormecida há décadas num troco de árvore que, por outro acaso, estava justamente, naquele pedaço de gelo. A velha preguiça é responsável não só pelo maior número de risadas como pela resolução do filme, numa tirada que não vale à pena revelar pra se ter o gosto de ver.

O problema está colocado: os amigos precisam reencontrar o seu bando, como prometido no momento do crash. E, para isso, vão enfrentar os grandes e misteriosos perigos do mar aberto. O primeiro deles é o terrível pirata Capitão Entranha e sua tripulação mais que grotesca. São, sobretudo, dos confrontos entre a corja de piratas e os três amigos (e a Vovó) as mais frenéticas cenas de ação – pensadas, talvez, para sacudir o espectador com seus óculos 3D; o próximo desafio está em mais uma citação ao retorno de Odisseu: as sereias e suas vozes e disfarces encantadores. Citações, aliás, não faltam à animação; é como assistir uma aula de História pelo prisma da mais pura imaginação.

Em meio a toda essa confusão, algumas personagens surgem para, em certa medida, sublinhar as relações construídas desde o primeiro filme da série. É o caso de Shira, a tigresa ardilosa do bando de Entranha, que entra em cena para nos lembrar que aquele, hoje, fiel Diego é, originalmente, um assassino. Nesse viés, Diogo Vilela e Tadeu Melo, por exemplo, conseguem adicionar às suas dublagens um caráter de simbiose que aproxima o espectador das diversas camadas que compõem cada personagem.

A Era do Gelo já é um clássico da animação mundial e, este que agora se apresenta, demonstra que, quando bem construídas, personagens de animação não se aprisionam nos traços da sua criação original. É possível projetar Manny, Diego e Sid nas mais diversas e curiosas aventuras. Principalmente se levarmos em consideração o surgimento de personagens especialíssimos a cada nova empreitada.

Cotação: ** (Bom)